sábado, 11 de fevereiro de 2012

PORTUGAL VISTO DA ALEMANHA




João Marcelino – Diário de Notícias, opinião

1. Aquilo que a União Europeia mais precisa neste momento de crise é de solidariedade e espírito europeu. O caminho do federalismo parece ser a via que resta para aglutinar este mosaico de culturas e nacionalismos, financeiramente falido a Sul, que nunca olhou devidamente para a imigração e para as suas consequências, nomeadamente ao nível das crenças religiosas, e que se debate com um modelo de assistência social tão extraordinário quanto parece ser cada vez mais inviável.

A Europa, no seu todo, para além da pujança económica alemã e das contas em dia dos povos cumpridores do Norte, está a beira do colapso, pressionada pelo crescimento das economias que não respeitam direitos, que não são amigas do ambiente e que não tratam por igual todos os seus cidadãos.

As vantagens decorrentes desta original forma de dirigir países em pleno século XXI está por detrás de muito investimento internacional e da compra de colossais quantidades de dívida soberana.

A quem não gasta na promoção da igualdade, na justa retribuição do trabalho, no controlo da qualidade ou na garantia de direitos considerados fundamentais a Ocidente é natural que sobre dinheiro para compras.

2. A União Europeia, colocada perante esta nova realidade, deveria cerrar fileiras e estimular a coesão interna. E em vez disso, no entanto, como um doente terminal que parece não ter cura, é capaz de momentos tão incoerentes como os protagonizados pelas declarações de Angela Merkel, sobre a Madeira ou de Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu, sobre os negócios de Portugal com Angola.

Estas duas inadmissíveis tiradas alemãs funcionam como exemplar prova de falta de respeito da grande economia por um país pequeno e necessitado. Parecem carregar um complexo de superioridade inadmissível, perigoso e do qual podemos desconfiar, que de todo é prejudicial a uma União plena, sem temores nacionais.

É neste momentos que fica claro que Portugal pode e deve ter uma estratégia própria, para além da aposta no projeto europeu. Deve estreitar os laços económicos com o mundo de língua portuguesa - com Angola, pois claro! -, e com todas as economias emergentes, sem nunca esquecer que os nossos maiores aliados sempre estiveram do outro lado do Atlântico - e, por cá, nas ilhas britânicas.

Não há retificações e pedidos de desculpa que nos devam fazer esquecer aquilo que importa lembrar: só seremos de facto independentes, amanhã como ontem, se nos relacionarmos em rede no mundo global. A curto prazo, apostar nesta Europa de olhos fechados poderia ser trágico.

Um país deve ter sempre um plano B.

Devemos agradecer a Angela Merkel e ao sr. Schulz por no-lo recordarem neste momento de aflição.

O diálogo entre Wolfgang Schäuble, ministro alemão das Finanças, e Ví-tor Gaspar permite uma nova reflexão sobre jornalismo ou pode abrir a discussão sobre a necessidade real de um calendário de ajustamento orçamental tão intenso como o imposto à Grécia, Portugal e Irlanda. Mas o mais interessante, ou assustador?, é constatarmos que o mundo gira, os séculos passam, mas os homens continuam a gerir os seus destinos com a casualidade e a descontração de sempre. O sofrimento de um país, de milhões de pessoas, pode estar dependente de uma conversa de circunstância. Será que pode mesmo?

Sem comentários:

Mais lidas da semana