Martinho Júnior, Luanda
O desaparecimento tanto da URSS, como do bloco socialista do leste europeu, implicou em sérias alterações para o potencial do movimento de libertação em África, em resultado do domínio avassalador de políticas de cariz capitalista neo liberal que se desencadearam desde então e causaram impactos de toda a ordem em todo o mundo e por tabela no continente berço da humanidade.
A hegemonia uni-polar estimulada pelo complexo financeiro, militar e energético anglo-saxão, introduziu enormes esforços de domínio levados a cabo por sucessivas administrações norte americanas e governos britânicos, atraindo cada vez mais para a sua causa aliados da NATO, do ANZUS e outros, no rescaldo dos êxitos obtidos com o fim da Guerra Fria.
Angola, que foi uma pedra fulcral na luta contra o “apartheid” no quadro dos Países da Linha da Frente tornou-se um alvo desses impactos, que exploraram como nunca as possibilidades dos grandes interesses em sectores vitais para o estado angolano, como o do petróleo e o dos diamantes (a economia angolana estava e está ainda hoje completamente dependente deles).
Interesses ligados aos dois “lobbies” principais que também mexem no continente africano, o do petróleo (que nos Estados Unidos é inspirador das políticas do Partido Republicano) e o dos minerais (que por seu turno “alimenta” as políticas do Partido Democrata naquela potência), tornaram-se decisivos para reger as contradições entre o estado angolano e a rebelião de Savimbi antes estimulada pelo “apartheid”, para depois ser estimulada pelo regime de Mobutu a partir do Zaire.
Enquanto o estado angolano se “barricou” no sector do petróleo, Savimbi esgrimiu com o sector dos diamantes, constituindo essa contradição sangrenta uma parte das sequelas que se seguiram à luta contra o colonialismo e o “apartheid”, de acordo com um processo de transição controlado pelos interesses intimamente associados ao poder da aristocracia financeira mundial.
Ele soube tirar partido do facto daqueles que na Segurança do Estado de Angola que combatiam o tráfico terem sido julgados e condenados por um Tribunal ad hoc que foi inaugurado em 1986.
Ao julgar e condenar os oficiais que velaram pelos interesses do estado na área dos diamantes, as “facilidades” que por tabela beneficiaram aqueles que sem escrúpulos já nessa altura alimentavam o gérmen do capitalismo, acabaram por inteiro por facilitar os projectos de Savimbi, sobretudo nos vales do Cuango e do Cuanza (“O vale do Cuango” – http://pagina--um.blogspot.com/2011/01/o-vale-do-cuango.html).
O estado angolano ao se livrar em 1986 daqueles que se haviam mantido fieis aos compromissos no quadro do movimento de libertação de acordo com a linha socialista com que a independência havia sido inaugurada, antecipou as alterações que acabou por ir implementando à medida que se sucediam as negociações (Bicesse, Gbadolite, Lusaka, por fim Luena).
Nesse âmbito, primeiro foi minguando a Segurança do Estado angolano, em termos de peso nos mecanismos de decisão, depois foram as próprias FAPLA, as gloriosas FAPLA, uma das forças armadas vencedoras do “apartheid” em conformidade com o rescaldo da grande batalha do Cuito Cuanavale, que sob o rótulo da implantação duma “democracia representativa”, acabaram por ser sacrificadas.
O volte face ficou consumado e era apenas uma questão de tempo para os senhores da globalização moldarem Angola a seu bel-prazer, de acordo com seus particulares interesses!
Os “observadores” que estiveram presentes sobretudo em Bicesse e Lusaka, estavam de acordo em praticamente tudo o que havia a fazer: os Estados Unidos como monitor garante da persuasão que moldava por via do arrastar das “negociações” o embrião das novas elites angolanas, a Rússia de Boris Yeltsin como aliada dos expedientes de globalização, aquela globalização de portas escancaradas (em curso então na própria Rússia) e Portugal, afeiçoado ao elitismo que comprometia desde 1988 o “consenso tácito” criado pelos 3 partidos que não mais haveriam de abandonar o poder, o CDS, o PSD e o PS.
O processo angolano ficava desde então cada vez mais associado à evolução promovida pacientemente em Portugal desde os tempos de Frank Charles Carlucci, uma evolução que para muitos investigadores dos grupos elitistas globais, era decidida por interesses ligados a fóruns como o Trilateral, o Council on Foreign Relations, o Bilderberg…
Conhecer os meandros da influência desses grupos em Portugal é hoje mais importante que nunca para portugueses e angolanos, inclusive para poderem melhor avaliar as modalidades das ingerências e manipulações que ambos os povos e as forças progressistas existentes nas sociedades dos dois países, têm vindo a sofrer.
Interligar a crise que se vive em Portugal ao expediente da relativa “emergência” em Angola e em menor expressão noutros países africanos, é hoje uma das traves mestras dos processos que se reflectem em África, nos termos duma globalização capitalista, neo liberal e disposta a todo o tipo de choques.
Há 6 anos foi publicado um artigo no “Notícias da Amadora”, que resumia os impactos do Bilderberg em Portugal entre 1988 e 2005, um período crucial para a evolução da situação em Angola.
Hoje esse artigo, “Conferências Bilderberg e a frequência portuguesas desde 1988”, está até à data desta publicação, sob a forma de scrib, em http://pt.scribd.com/doc/23164608/Conferencias-Bilderberg-e-a-frequencia-portuguesa-desde-1988.
Recomendo a sua atenta leitura e se possível a sua publicação completa, para melhor se entenderem muitos aspectos ligados à moldagem sob os auspícios dos interesses da aristocracia financeira mundial ligados aos processos da globalização neo liberal não só em Portugal, mas também em Angola, por tabela.
Para além dos aspectos políticos de influência, a pista econômica é merecedora de abordagem, pois alguns banqueiros portugueses estiveram presentes em algumas das reuniões anuais do Bilderberg, entre eles Ricardo Espírito Santo Salgado, o único que foi referenciado em duas delas: a de 1997, em Atlanta (Estados Unidos) e a de 1999, em Sintra (Portugal).
... “Ricardo Espírito Santo Salgado foi convidado duas vezes por Francisco Pinto Balsemão.
A sua primeira participação ocorreu em 1997, no encontro realizado em Atlanta, nos Estados Unidos da América.
Além do banqueiro, a comitiva portuguesa integrou José Manuel Galvão Teles e António Borges.
Este último também foi convidado uma segunda vez.
Quanto a José Manuel Galvão Teles, encontra-se com Pinto Balsemão sempre que se reúne o Conselho de Estado.
Entre os 20 membros deste órgão de consulta da Presidência da República, seis já foram conferencistas de Bilderberg (Jorge Sampaio, José Sócrates, José Manuel Galvão Teles, Vítor Constâncio, João Cravinho e Francisco Pinto Balsemão).
Ricardo Espírito Santo Salgado é presidente do grupo financeiro Espírito Santo, o qual está presente em 17 países de todos os continentes.
O grupo detém nove bancos no segmento da banca comercial e outras cinco instituições financeiras na banca de investimento.
Detém sociedades e opera ainda na área de crédito especializado, gestão de activos e seguros.
A Caisse Nationale du Credit Agricole, a Europ Assistance Holding, o Bradesco, a Caixa Geral de Depósitos e a Portugal Telecom têm participações financeiras em empresas do grupo”...
... “O encontro de Bilderberg de 1999 realizou-se em casa.
A elite mundial veio reunir-se em Sintra e a comitiva portuguesa era constituída por dez pessoas, entre elas o Presidente da República, Jorge Sampaio.
Nesse ano António Guterres governava o país e realizaram-se eleições para o Parlamento Europeu (Junho) e Assembleia da República (Outubro).
Ricardo Espírito Santo Salgado participou pela segunda vez no conclave de Bilderberg.
Além do grupo Espírito Santo, o grupo Mello e o grupo BPI (Banco Português de Investimento) estiveram representados, respectivamente por Vasco de Mello e Artur Santos Silva.
Nicolau Santos, editor do «Expresso», também participou no conclave, assim como os ministros Eduardo Marçal Grilo e João Cravinho, o presidente da Portugal Telecom Francisco Murteira Nabo, e o deputado do PSD Joaquim Ferreira do Amaral.
Vasco de Mello era à data vice-presidente do grupo José de Mello, mas desde 2003 assumiu a presidência da sociedade gestora de participações sociais, após o processo de alteração conduzido pelo próprio pai, José Manuel de Mello.
Reestruturação que se tinha iniciado em 1999, com a integração do Banco Mello e da seguradora Império no BCP.
O grupo Mello torna-se accionista de referência do grupo bancário de Jardim Gonçalves.
Este está, de resto, com Vasco de Mello nos órgãos sociais da Brisa.
O grupo Mello acrescentou novas áreas de negócio às suas áreas tradicionais, o sector químico (CUF) e a saúde (hospital CUF).
Entrou na Brisa e na Efacec no ano 2000, desenvolveu o sector da saúde (José de Mello Saúde, que gere o Hospital Fernando Fonseca), novas tecnologias (TMG), transportes marítimos, residências e serviços para idosos e, entre outros, o vinícola.
O banqueiro Artur Santos Silva teve uma breve experiência governativa, como secretário de Estado do Tesouro, no Governo provisório de Pinheiro de Azevedo (1975-1976).
Foi vice-governador do Banco de Portugal entre 1977e 1978.
A partir de 1981 ascendeu à presidência do grupo BPI.
A estrutura accionista do BPI integra os grupos Itaú, La Caixa, Allianz, Banco Santander Central Hispano, BCP, Chase Manhattan Bank, Arsopi, Violas, Goldman Sachs e Espírito Santo, entre outros.
Mais de 30 por cento do capital está nas mãos de estrangeiros”...
Os banqueiros portugueses tinham uma enorme vantagem em relação aos políticos e até aos fazedores de opinião como o “reitor” Francisco Pinto Balsemão: poderiam estender os interesses a que se encontravam ligados a projetos de influência geo estratégica, pelo que Ricardo Espírito Santo Salgado não se fez rogado.
É essa uma das pistas (outras podem ser seguidas, entre elas a do Grupo Carlyle) que nos interessa para perceber um pouco de quem e como penetraram interesses conotados ao elitismo do Bilderberg nas “veias abertas” de África, por tabela de Angola.
* Foto tirada a 15 de Fevereiro de 2012 e nessa altura faltavam 8 meses, 12 dias e 10 horas para a inauguração:
Edifício sede do BESA em construção, muito próximo do Parlamento da República de Angola e do Palácio Presidencial da “cidade Alta” e mesmo ao lado da torre dourada de outro grupo financeiro típico dos fenómenos da globalização, o “China International Fund”.
O BESA é um dos “braços” do BES de Ricardo Espírito Santo Salgado em Angola; o outro é o ESCOM!...
O empreiteiro é a portuguesa Soares da Costa.
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* Ver todos os artigos de Martinho Júnior – ligação também em autorias na barra lateral
1 comentário:
Ver documentário "DONOS DE PORTUGAL" - http://www.donosdeportugal.net/p/grande-familia.html
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