Martinho Júnior, Luanda
A norte da linha do Equador, os Estados Unidos, via AFRICOM, comandam em África um conjunto alargado de acções que visam instalar seu domínio neo colonial com a integração de seus estados vassalos da Europa e de outros nas quatro regiões Norte, Leste, Central e Oeste do continente.
1 ) Na África do Norte, os Estados Unidos estão na origem da criação da “União para o Mediterrâneo” em 2008, de acordo com proposta de Sarkozy e tendo como “correia de transmissão” a NATO, que teve sua “pedra de toque” na ingerência na Líbia em 2011, a coberto do Conselho de Segurança da ONU, o que conduziu à instalação dum regime dócil pondo fim à Jamayria (“La Unión para el Mediterrâneo, herramienta del soft power para la globalización de la OTAN” – http://www.mondialisation.ca/index.php?context=va&aid=30503; http://www.nato.int/docu/update/2004/01-january/f0110b.htm.
A NATO, ao atrair à sua esfera de influência os países do Norte de África (Mauritânia, Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Egipto), tem garantido a partir deles, um adicional provimento para as manipulações e ingerências na África do Leste, Central e do Oeste, levando em consideração a desestabilização da transversal do Sahara/Sahel.
2 ) Na África do Leste são dois os alvos mais relevantes: a Somália e o Sudão.
- Na Somália a instalação dum governo afim, recorrendo à intervenção militar sobretudo da Etiópia e Uganda, está na ordem do dia, implicando enormes sacrifícios para as já extremamente sacrificadas comunidades somalis, cuja economia está destruída e só garantem sobrevivência por via da completa dependência.
A sociedade somali está exausta e há uma catástrofe humanitária em curso.
O facto dos somalis terem restrições (a pretexto da pirataria) na imensa área costeira onde a pesca é das poucas actividades viáveis, faz aumentar a crise alimentar (“Pescadores denunciam ataques aéreos contra piratas” – http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/africa/2012/4/20/Pescadores-denunciam-ataques-aereos-contra-piratas,1ca90ced-c816-42d6-90c9-bcd7924f08a7.html).
- No Sudão com a fragmentação do espaço nacional original: após a independência do Sudão do Sul, estimulada por Israel e pelos “lobbies” mais conservadores dos Estados Unidos, com o apoio de peões como o Uganda, a desestabilização continua no Nilo Azul a sudeste, Kordofan do Sul e Darfur a sudoeste, para além dos combates pela posse da exploração de petróleo na fronteira Sudão – Sudão do Sul (“Border battles threaten the new Sudans” – http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-15728191).
Está também em curso outra catástrofe humanitária, sendo imprevisível o fim dos conflitos que se interligam num terrível “efeito dominó”.
A desestabilização é de tal ordem que a China está a optar pelo apoio militar a ambos os lados, inaugurando esse apoio ao Sudão do Sul, onde estão os principais poços da China National Petroleum Corporation (no Sudão encontra-se o único “pipeline” de escoamento de petróleo até Porto Sudão).
Os peões principais dos Estados Unidos são a Etiópia e o Quénia e o único estado resistente às políticas do capitalismo neo liberal é a Eritreia, que prefere o isolamento à abertura de suas fronteiras aos interesses da globalização, dando sequência à longa luta de libertação contra o domínio, primeiro da Itália, depois da Etiópia.
3 ) Na África Central, os peões principais dos Estados Unidos são o Uganda e o Ruanda, bem no coração do continente, que apoiam acções na direcção do Sudão do Sul, Somália, República Centro Africana e Kivus, a leste da RDC (região geo estratégica dos Grandes Lagos e curso inicial do rio Congo).
O AFRICOM tem mesmo assessores militares no Uganda, a pretexto da luta contra o Lord Resistence Army, resíduo útil com ligação ao Sudão (“U.S. Military Advisers to Support African Fight Against LRA” – http://www.africom.mil/getArticle.asp?art=7494&lang=0).
O Uganda e o Ruanda continuam a exercer atracção em relação a governos instáveis, como o de Kinshasa, de forma a alargar a influência sobre a bacia do grande Congo de valor geo estratégico para seus próprios interesses e para todo o continente, conforme por exemplo o que continua a acontecer em relação às explorações de “coltan”.
Na RDC, continuam a haver situações de crise, agora em mais baixa intensidade que antes, no âmbito da “Pax Americana” (“Situation sécuritaire toujours très préoccupante à Masisi, Rutshuru et Walikale dans la province du Nord-Kivu” – http://www.digitalcongo.net/article/83925).
4 ) Na África do Oeste, a situação é instável, com o alargamento do espectro da fome no Sahara/Sahel, afectando frágeis estados interiores como o Níger e o Mali (“Sahel : l'ONU lance un appel contre l'indifférence générale" – http://www.lemonde.fr/afrique/article/2012/04/10/sahel-l-onu-lance-un-appel-contre-l-indifference-generale_1683202_3212.html).
A região, na sequência das ingerências na Líbia, assiste ao aumento de intensidade dos fluxos de desestabilização, quer com o alargamento das potencialidades do redesenhar dos mapas (no Mali), quer com golpes de estado (no Mali e na Guiné Bissau), quer com o aumento da presença de fundamentalistas islâmicos que actuam até à Nigéria, quer ainda por via do tráfico de droga na costa Atlântica.
É de prever que os países que compõem a União para o Mediterrâneo comecem a lançar acções para dentro da terra de ninguém que constitui grande parte do Sahara/Sahel.
Nos países tocados pelos golpes de estado militares, a CEDEAO, por via das tónicas do “Françafrique” e do “super peão” que constitui a Nigéria, começa a fazer-se sentir de forma a constituir o principal esteio dos impactos da globalização neo liberal e do neo colonialismo das opções (“Conselho de Segurança da ONU deixa orfão o Povo da Guine Bissau...” – http://ditaduradoconsenso.blogspot.com/2012/05/conselho-de-seguranca-da-onu-deixa.html).
As políticas da “Françafrique” persistirão mesmo com a ascensão do novo Presidente Francês François Hollande.
5 ) A única região onde persiste a “Pax Americana”, às custas do capitalismo neo liberal e dos mais diversos impactos da globalização ao sabor da aristocracia financeira mundial, é a da África Austral, onde se ergue a emergência Sul Africana e agora as de Angola e Moçambique.
A emergência sul africana deu azo à extensão das elites nacionais a sectores da população que, durante o “apartheid” sofreram a discriminação.
As novas elites nacionais após a queda do “apartheid”, têm as mais diversas origens, acomodando-se à multicolor “democracia representativa” recentemente instalada.
No entanto o capitalismo neo liberal promove um outro tipo de “apartheid” que se nutre das assimetrias regionais dentro da própria África do Sul, tal como das desigualdades com graus de oportunidade distintos.
A África do Sul beneficia no entanto de sua privilegiada localização, com aberturas para o Índico Sul, a Antárctida e o Atlântico Sul, constituindo-se num dos elos entre o Brasil e a Índia.
Essa influência constitui-se na direcção das interdependências e do multipolarismo que foi instituído no âmbito dos BRICS.
O estado de graça das emergências de Angola e de Moçambique duram há cerca de dez anos, mas as experiências recentes aconselham a que os estados nacionais privilegiem primeiro os processos internos, depois a integração e interligação com os outros parceiros da África Austral, abandonando alguns devaneios em regiões como a África do Oeste e no Sudão do Sul no caso de Angola (“Angola ajudará o jovem Sudão do Sul – http://www.portugues.rfi.fr/africa/20120328-angola-ajudara-o-jovem-sudao-do-sul).
Nessa via, se bem que a prioridade esteja a ser dada para a recuperação de infra estruturas, estruturas e as explorações de petróleo, gás e mineiras, é imperioso que se conceda a prioridade ao homem, de forma a gerar sustentabilidade nas políticas de desenvolvimento e não um crescimento que promova crescimento feito de perigosas assimetrias e desequilíbrios, que podem colocar em perigo até a frágil identidade nacional.
Nesse sentido a RDC é crucial para todo o continente africano, uma vez que é geo estratégico pela sua geografia, pela razão da água, pelas suas riquezas naturais e pelo homem que é imperioso arrancar ao subdesenvolvimento (“Le Vice président du Conseil d’Etat de Cuba reçu en audience par le Chef de l’Etat salue l’excellence des relations entre Kinshasa et La Havane” – http://www.digitalcongo.net/article/83910).
A África Austral para dar continuidade ao movimento de libertação, tem de perseguir políticas com sentido de vida, que são muito mais exigentes que aquelas que respondem á abertura das sociedades de acordo com o capitalismo neo liberal, em voga com este “modelo” de globalização elitista!
6 ) É visível no âmbito da União Africana que a África Austral tem apesar de tudo uma outra perspectiva em relação aos problemas de África, se tivermos em conta as opções de outras regiões como a África do Norte, a África do Leste, a Central e a do Oeste, cada uma de per si e no seu conjunto.
A influência directa e exponencial das potências ocidentais é forte na África Austral, mas também estão presentes outras opções e alternativas, fazendo alguns estados, como Angola, esforços para que haja maior harmonia, se bem que por vezes de forma pouco consequente.
A África Austral está a crescer, mas a harmonia implica luta contra o subdesenvolvimento, contra as tendências para as assimetrias e contra as desigualdades e injustiças sociais.
Essa luta implica muita atenção sobre o que os Estados Unidos, sob a voz do seu Presidente Barack Hussein Obama, se propõe realizar no âmbito da sustentabilidade alimentar; os Estados Unidos devem explicar imediatamente se a “ajuda a África” é para injectar transgénicos com que irão aumentar ainda mais a dependência e a submissão! (“Obama anuncia programa de combate à pobreza em países emergentes” – http://www.emtemporeal.com.br/index.asp?area=2&dia=18&mes=05&ano=2012&idnoticia=117018).
As outras regiões, mesmo a África do Norte, assumem-se numa esfera com carácter mais acentuadamente neo colonial, agravando-se no Leste e Oeste a situação de instabilidade e do subdesenvolvimento crónico.
Os conflitos de baixa intensidade, os golpes de estado, os cenários de subdesenvolvimento extremo, são frequentes agora na África do Leste, na África Central e na África do Oeste, o que implica que o neo colonialismo norte americano, com seus múltiplos instrumentos (entre eles o AFRICOM), tenham um terreno fértil de actuação.
No Norte a influência da NATO é peremptória, no Leste a influência norte americana e no Oeste a norte americana, a do Reino Unido e a da “Françafrique”!
Conforme dizia em síntese Agostinho Neto: “a África é um corpo inerte onde cada abutre vem depenicar o seu pedaço”!
Isso está ainda a acontecer, mesmo que a harmonia tenha espaço para se ir assumindo de forma emergente, em maior ou menor grau na África Austral!
Mapa: A “arrumação” dos “jogos africanos” das políticas neo coloniais dos Estados Unidos em África, em cinco regiões, conforme o AFRICOM.
Referências:
- Angola precisa reencontrar-se – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/04/martinho-juniorluanda-1-atraccao.html
- Angola em busca da verdade – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/04/angola-em-busca-da-verdade.html
- Precisamos integrar nos relacionamentos conceitos alternativos de novo tipo – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/04/precisamos-integrar-nos-relacionamentos.html
A não perder:
- Negro Canada – saqueo, corrupción y criminalidade en África – http://www.rebelion.org/docs/149755.pdf
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