domingo, 4 de novembro de 2012

República Checa: O REGRESSO DA VELHA GUARDA MARXISTA

 

Respekt, Praga – Presseurop, com foto
 
Foi a primeira vez, desde 1989: no dia 13 de outubro, o Partido Comunista Checo ganhou as eleições em duas regiões. Prepara-se agora para as legislativas de 2014, com o objetivo de aumentar a sua influência. No entanto, em Karlovy Vary, o semanário Respekt constata que nada mudou para eles, desde os saudosos tempos do partido único.
 
 
O ar de professor jovial que exibe Jaroslav Borka não engana. Começou a carreira no ensino primário. Pouco depois, trocou a escola pela política. Parece que para sempre. Cabeça de lista do Partido Comunista em Karlovy Vary [zona oeste do país], ganhou as eleições regionais. Conta assumir o controlo da maioria do Conselho Regional e preparar o caminho para novas vitórias comunistas. E não apenas em Karlovy Vary [o partido também ficou em primeiro lugar na região vizinha de Usti nad Labem]. "Para nós, abre-se uma nova era de responsabilidades e de poder de influência", afirma.
 
Se não fosse pelos cartazes de campanha dos comunistas e a maqueta de gesso da Praça Vermelha, ninguém imaginaria estar perante um dos gigantes do partido das cerejas vermelhas [emblema do KSCM, o Partido Comunista da Boémia e Morávia]. Há quatro anos que ocupa o cargo de assessor no Serviço dos Assuntos Agrários da Região de Karlovy Vary. "A relação que estabeleci com Moscovo e a Rússia data da minha juventude", conta Jaroslav Borka, de 60 anos. "Há certos laços que ficam para toda a vida."
 
Uma vitória “histórica”
 
Era ainda adolescente quando tentou abnegadamente aderir ao partido, nos anos 1970. Nunca se arrependeu dessa decisão. Para ele, o Partido Comunista é hoje uma "esquerda moderna" e está convencido de que a era atual, marcada pela incerteza económica, lhe vai dar cada vez mais razão. "Vamos ganhar com um argumento sólido e não pela força", diz Borka. "Pretender assustar as pessoas, alegando que somos autoritários, é um absurdo! Não tenho palas nos olhos. No Conselho, debato os assuntos com todos os políticos. O que importa, para mim, é que, antes de mais, sejam honestos." Foi precisamente isso que lhe permitiu subir tão alto na política.
 
O seu opositor, Jiri Kotek, concorda: "Há comunistas que estão há anos na Comissão de Supervisão ou no Conselho Regional, mas conseguem dar a sensação de nunca se terem imiscuído em qualquer caso questionável." Também candidato às eleições regionais, Kotek ficou conhecido por publicar o vídeo de um famoso "sorteio". Nele, veem-se os políticos de Karlovy Vary, conluiados com uma oficial de justiça, envolvidos num processo de seleção, obviamente manipulado, para atribuição de um concurso de milhares de milhões de coroas [mil milhões de coroas checas equivalem a cerca de €39 milhões]. O seu movimento Alternativa, obteve 10% dos votos. Apelou a que todos os partidos eleitos se recusem a trabalhar com o KSCM, colocando-o onde, na sua opinião, é o lugar do partido comunista: marginal em relação à política.
 
Independentemente disso, Jiri Kotek considera que não se deve sobrestimar a "vitória eleitoral histórica dos comunistas", em Karlovy Vary. Foram 16 500 os eleitores que lhes deram os seus votos. O que os catapultou, literalmente, para o topo foi sobretudo a baixa participação eleitoral (cerca de 36%). Embora, há quatro anos, um número semelhante de votos lhes tenha proporcionado 17% dos votos e oito lugares no Conselho Regional, este ano obtiveram 23% dos votos e 14 das 45 vereações.
 
"Quatro décadas de prosperidade"
 
No escritório de Josef Murco, o chefe da secção do KSCM em Karlovy Vary, de 60 anos, um busto de bronze de Karl Marx perscruta o visitante. E ao entrar na sala de reuniões, uma impressionante escultura de dois metros de altura representa os soldados do Exército Vermelho, de metralhadoras em punho.
 
"Entrei [para o partido] durante o serviço militar, em 1972", explica este antigo professor do ensino profissional. Segundo ele, ninguém o conseguirá persuadir do caráter nocivo das nacionalizações e das coletivizações forçadas. A seu ver, eram ideias excelentes. "Eu próprio vivi isso. Os agricultores envelhecem. E quem vai dar continuidade às explorações? Eles ficavam agradecidos por haver cooperativas agrícolas", argumenta.
 
Para ele, o regime anterior a novembro de 1989 foi uma "época sem problemas", que deu ao país "quatro décadas de prosperidade". E se houve alguns erros, não há certamente qualquer risco de, hoje, se repetirem. "Mas de um ponto de vista puramente filosófico”, acrescenta imediatamente, “quem pode afirmar hoje com segurança que o sistema atual é o único válido?”
 
É óbvio que Borka, "o professor jovial", partilha da mesma forma de pensar. "Tenciona restaurar os desfiles obrigatórios do 1º de maio e repor o arame farpado na fronteira alemã?", perguntou-lhe um leitor do portal de Internet iDNES.cz. "Não", respondeu. “Mas, sinceramente, muitos cidadãos guardam uma memória agradável desses desfiles. E a permeabilidade das fronteiras poderá, no futuro, favorecer a criminalidade e tornar-se muito problemática."
 
Permanece em aberto a questão do papel que os novos dirigentes da região tencionam atribuir à crítica. "A crítica é naturalmente uma coisa positiva", afirma Josef Murco. "Mas tem de ser construtiva. Se apenas a animarem más intenções, devemos opor-nos a ela. É contra a liberdade de expressão, o que estou a dizer? Há muito que essa liberdade não existe. Tentem fazer críticas no interior de uma empresa capitalista... É despedimento imediato." Borka também já declarou que a solução para o problema do desemprego pode estar em colocar algumas empresas privadas locais sob o controlo da Região.
 

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