segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Associação de Macau considera perigoso obrigar jornal a retirar comentário online

 

FV - PMC - Lusa
 
Macau, China, 17 dez (Lusa) - O presidente da Associação dos Advogados de Macau considerou "perigosa e sem fundamento legal" a atuação do Ministério Público ao exigir a retirada de um comentário alegadamente difamatório da página de internet do diário português local Hoje Macau.
 
O caso envolve um comentário de um leitor do jornal Hoje Macau a uma entrevista à antiga presidente do conselho de administração da Sociedade para o Desenvolvimento do Parque Industrial da Concórdia, na ilha de Coloane, Paulina Alves dos Santos, na sequência da sua exoneração recente pelo Executivo.
 
A 03 de dezembro, a Polícia Judiciária de Macau deslocou-se ao Hoje Macau com uma ordem do Ministério Público para exigir a retirada do comentário da página de internet, numa decisão acatada pelo jornal.
 
Em declarações à agência Lusa e Rádio Macau, o presidente das Associação dos Advogados de Macau, Jorge Neto Valente, disse não haver base legal para a atuação do Ministério Público, a quem compete determinar a abertura do inquérito e superintender a investigação.
 
"Apenas fico surpreendido se o diretor do jornal, que penso que é o responsável pelo site, executar aquela determinação, que a meu ver não tem base nenhuma legal", disse.
 
O presidente da Associação dos Advogados de Macau recordou que, de acordo com a Lei Básica da Região, o sistema instituído "significa que o Ministério Público propõe as sanções e o juiz as aplica".
 
"É contra a Lei Básica, e contra a letra e o espírito do sistema, o Ministério Público aplicar diretamente as medidas que acha que deviam ser aplicadas. É por isso que no nosso sistema há uma entidade que propõe as medidas e o juiz de instrução criminal as sanciona ou não", sublinhou Jorge Neto Valente.
 
O presidente da Associação dos Advogados mostrou-se também preocupado com as repercussões do caso.
 
"Claro que considero que é perigoso e é por isso que me assustam certas ideias que há aí de transformar isto não sei em quê. Isto é o caminho do desmantelamento do sistema jurídico de Macau", afirmou.
 
Nesse sentido aconselhou "a resistir civicamente e legalmente, a ir para os tribunais, e não deixar que haja atropelos como se perspetivam".
 
Ouvido pela Lusa, o diretor do Hoje Macau, Carlos Morais José, disse tratar-se de um "procedimento gravíssimo".
 
"Fomos intimidados de alguma maneira a retirar o comentário do site. Confiámos na palavra da polícia, que só trazia um documento em chinês. Partimos do princípio que tinha sido assinado por um juiz", afirmou.
 
Carlos Morais José explicou que teve de esperar um dia pela tradução, quando finalmente percebeu que a ordem do Ministério Público para retirar o comentário na edição online do jornal "estava assinada pelo procurador adjunto e não por um juiz".
 
O jornalista lamentou ainda a situação gerada por um comentário de um leitor, que descreveu como não ofensivo.
 
"Se não era verdadeiro, não quer dizer que tenha de ser retirado", acrescentou.
 
Questionado sobre eventuais ações futuras do jornal, Carlos Morais José salientou que "não pode processar o Ministério Público", mas disse esperar uma reação da sociedade civil e comunidade jurídica, além de uma investigação do organismo que combate a corrupção em Macau.
 
"Espero que o comissário contra a corrupção faça alguma coisa, e que investigue este caso", concluiu.
 

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