Ana Sá Lopes –
Jornal i, opinião
A tragédia nacional
é que, se o governo é mau, a oposição não tem alternativas
O governo é
péssimo, o Memorando inqualificável e destrutivo. Podemos estar de acordo sobre
estes dois assuntos e ficar muito contentes, pedindo para se “rasgar” o papel,
avançar para uma agenda de “crescimento” ou acabar com o “pacto de agressão”. A
tragédia nacional (e europeia) é que, se o governo é mau – e sobre isso nenhuma
dúvida – a oposição não tem nenhuma alternativa concreta à situação existente.
Toda a conversa no espaço público contra o Memorando é mistificadora – como se
fosse possível a Jerónimo de Sousa, tendo o PCP mais uns votinhos, acabar com o
“pacto de agressão”, a João Semedo “rasgar o Memorando” e a António José Seguro
ter excelentes resultados económicos se a troika lhe exigisse (como exigiria) o
cumprimento de objectivos similares.
Em entrevista ao i
nesta edição, o filósofo francês François Badiou reconhece a existência de uma
“fraqueza política na Europa”. E não, não está a falar da senhora Merkel, mas
precisamente daqueles que se lhe opõem. “É politicamente impossível fazer as
coisas a longo prazo sem a consistência ideológica que neste momento não
existe”. Assiste-se então a “uma mera revolta” – de resultados práticos até
aqui nulos – quando o que devia haver era “uma visão geral”.
Em Portugal, todos
os partidos que se opõem ao governo partilham essa incapacidade de formular uma
“visão geral” que pudesse conduzir a uma alternativa sustentada.
Tudo começa e acaba
numa palavra – a moeda e as alternativas europeias. Tanto o Bloco de Esquerda
como o PCP recusam a única forma daquilo que defendem ter algum, digamos,
cabimento – a saída do euro. O PCP tem fugido notoriamente ao debate, por muito
que na resolução aprovada no congresso aponte todos os malefícios da Europa. E
o anúncio de um referendo sobre a participação de Portugal no euro não deixa de
ser uma forma de adiar o debate. Com o Bloco de Esquerda passa-se praticamente
a mesma coisa – “rasgar o Memorando” não é uma coisa que se possa fazer sem ter
uma alternativa consistente. A verdade é que, se ganhasse as eleições, o Bloco
de Esquerda limitava-se a pedir para renegociar com os credores. É apenas isto
que significa o “rasgar o Memorando” e nada mais.
A destruição em
curso do país não está a decorrer apenas porque Passos Coelho está no poder,
mas porque Portugal está amarrado a uma moeda impossível. Rejeitar discutir a
única forma de romper verdadeiramente com o Memorando da troika é uma vergonha
para as alternativas.
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