Gilberto Costa -
Agência Brasil, Lisboa – Opera Mundi
Constatação nas
ruas e nos gabinetes de economistas é que opção pela austeridade só agrava
crise econômica no país
Passado o primeiro
mês de entrada em vigor do Orçamento do Estado em Portugal, que incluiu aumento
generalizado de impostos e redução das aposentadorias e do seguro desemprego, a
constatação nas ruas e nos gabinetes dos economistas de perfil não monetarista
é de que as medidas de ajuste fiscal (para equilíbrio entre receita e despesa
do Estado) estão agravando o quadro social do país e diminuindo ainda mais a
atividade econômica.
O desemprego está em mais de 16% (dado oficial) e o Banco de Portugal, banco
central do país, prevê queda de 7,4% do PIB (Produto Interno Bruto, a soma de
bens e serviços produzidos no país) entre 2009 e o final deste ano. De acordo
com a mesma instituição, o consumo privado vai cair 3,6% este ano, perfazendo
uma redução acumulada de 12,4% desde 2011.
“Se reduziram as pensões e as pessoas, obviamente, têm de cortar gastos. Já não
vêm aqui tomar um café ou comer bolo - não comem fora! Isso tudo vai [refletir]
no meu caixa”; diz Cristiana Almeida; dona de um café no bairro de Campo de
Ourique, na região nobre de Lisboa.
“Estou [fazendo] quase a metade do caixa que fazia há um ano, e já havia
crise”; reclama Manoel Margarido, dono de una mercearia na rua atrás do Palácio
de São Bento, a residência oficial do primeiro-ministro. Segundo ele, “as
pessoas estão recebendo menos dinheiro e estão com medo. Não gastam porque não
têm ou não gastam porque querem ficar com alguma reserva, porque não sabem o
dia de amanhã”.
A avaliação da economista Manuela Silva é que as medidas do Orçamento estão
agravando essa situação porque geram um “círculo vicioso”, que reduz a
arrecadação e dificulta o próprio ajustamento fiscal. “Essas medidas de
austeridade produzem efeitos não desejados pela própria lógica das medidas
utilizadas. As famílias viram reduzido seu poder de compra. Logo, a atividade
econômica sofreu uma quebra que, por sua vez, repercutiu nas receitas do
próprio Estado”.
A economista que
também é professora do Instituto Superior de Economia e Gestão acrescenta que a
austeridade agrava a situação social em Portugal. “A pobreza aumenta
significativamente e atinge estratos sociais que até pouco estavam abrigados da
pobreza”.
“Estamos [assistindo] a aumento das desigualdades socioeconômicas. As medidas
de austeridade não foram pautadas com objetivo de diminuir as desigualdades”,
lembra. Segundo ela, a situação se agrava por causa do desemprego, da
desvalorização do trabalho (com redução do poder de compra efetivo dos
salários) e do aumento da tributação.
Segundo o Orçamento, o IRS (Imposto de Renda para Pessoas Singulares) -
equivalente ao Imposto de Renda de Pessoa Física no Brasil – teve aumento
universal de 3,5% e as faixas de alíquotas caíram de oito para cinco, o que
resultou no incremento da cobrança do imposto, que é descontado na fonte. O
economista Nuno Alves (do Banco de Portugal) confirma que “o elevado aumento da
taxa média de imposto” acarretará na “ligeira diminuição de progressividade do
imposto”.
A progressividade dos impostos (isto é, a maior incidência quanto maior a
renda) é tradicionalmente destacada pelos economistas como medida de redução
das desigualdades. Outra estratégia são as transferências do Estado para os
mais pobres. Segundo Alves, o Estado português transfere proporcionalmente e em
valores absolutos menos recursos que os de outros países da Europa, mas é mais
justo e eficiente. “Portugal é mesmo um dos países em que as prestações em
dinheiro (excluindo pensões) são mais orientadas para os rendimentos mais
baixos”.
A avaliação de Nuno Alves descrita em estudo que acompanha o Boletim Econômico
de Inverno do Banco de Portugal contraria o argumento do governo de que é
necessário “refundar” o Estado social para que se torne mais eficiente e mais
justo. Para diminuir as despesas do Estado, o governo português deve anunciar
ainda este mês corte de 4 bilhões de euros (cerca de R$ 10,8 bilhões) - o que
equivale à 5% do OE 2013.
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