Nuno Ramos de
Almeida – Jornal i, opinião
No dia 2 de Março,
os que se opõem a um caminho que está a levar o país à miséria podem mostrar
que esta política não pode continuar e que é preciso dar voz ao povo
O maior filósofo de
origem portuguesa viveu em Amesterdão. Bento Espinosa e a família fugiram aos
archotes da inquisição numa época em que a liberdade não existia em Portugal.
Na sua obra defendeu que a soberania não tinha origem nas instituições, que a origem
dessa estranha potência residia no povo em movimento. O povo não aprisionado em
instituições era o excesso que estava na base do poder constituinte da
liberdade. Diríamos hoje que a democracia tem de ser o regime em que o sujeito
é o povo. Algo que é muito diferente da ditadura dos governantes. Os poderosos
e os seus acólitos esqueceram convenientemente que a democracia não é apenas o
acto de eleger um parlamento: só há democracia a sério se as pessoas tiverem a
liberdade de se opor a políticas e governos injustos. A democracia mede-se
pela possibilidade de dizer “não”.
O actual governo
foi a eleições defender que baixava os impostos, não cortava nos subsídios e
nos salários dos trabalhadores, não extorquia as reformas dos pensionistas e
não ia despedir funcionários públicos e muito menos aumentar o desemprego.
Um dia depois de a
troika aterrar para a sua sétima avaliação, sabemos que governo e troika
mentiram e fizeram tudo ao contrário do que prometeram. As suas medidas estão a
levar o país à ruína. No final de 2013 haverá cerca de 17,5% de desempregados
nas estatísticas, mas o número real de pessoas que estarão no desemprego tocará
os 25%. A maioria das pessoas estarão mais pobres e muitas serão obrigadas a
deixar Portugal. A dívida externa será superior a 122% do produto interno bruto
(PIB) e desde que os homens da troika aterraram em Portugal esse mesmo PIB terá
descido mais de 7%.
Basta viver e
trabalhar em Portugal para saber que esta política tem sido uma catástrofe. Um
relógio parado acerta mais vezes nas horas que o governo de Vítor Gaspar nas
projecções económicas. Chegou o momento de recusarmos um caminho que não
votámos, que não discutimos e que vai hipotecar o futuro de muitas gerações.
A manifestação de 2
de Março, que está marcada para mais de 40 cidades, em Portugal e no
estrangeiro, é esse momento. Se formos muitos os que sairmos à rua, vamos
mostrar que a maioria das pessoas não quer este caminho. Há um governo, um
parlamento e um Presidente da República da mesma cor política e que querem ser
cegos e surdos à vontade dos portugueses, mas eles só conseguem governar se nós
quisermos e se a nossa rejeição for invisível. A 2 de Março, do que se trata é
de mostrar que não queremos mais esta situação e esta política.
Quando conquistámos
a nossa liberdade, há mais de três décadas, fizemo-lo com um símbolo que era
uma canção que nos lembrava que “o povo é quem mais ordena”. Neste momento é
preciso relembrar àqueles que servem outros interesses que não os da população
que em democracia o poder é do povo. E em momentos determinantes é preciso dar
a voz ao povo.
Num belo texto de
apoio à manifestação de 2 de Março, o poeta Manuel Gusmão escreveu que nós
somos “a esperança que não fica à espera”:
“Quem pode ser no
mundo tão quieto/Que o não movem nem o clamor do dia/Nem a cólera dos homens
desabitados/Nem o diamante da noite que se estilhaça e voa/Nem a ira, o grito
ininterrupto e suspenso/Que golpeia aqueles a quem a voz cegaram/Quem pode ser
no mundo tão quieto/que o não mova o próprio mundo nele.”
A 2 de Março somos
todos precisos para mover Portugal.
Editor-executivo
Escreve à
terça-feira
*Áudio-Vídeo “A Liberdade Está a Passar Por Aqui” (Maré Alta)
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