ASAE deixou de
abastecer carros e pagar portagens
Catarina Falcão e
Pedro Rainho – Jornal i
Ministro proíbe
gastos de entidades públicas sem autorização prévia. Poucos conhecem alcance da
medida
Não foram precisas
48 horas para que o despacho assinado por Vítor Gaspar no início da semana
fizesse disparar reacções de responsáveis dos mais diversos sectores. Saúde,
Educação, Segurança Social e partidos da oposição juntaram- -se num coro de
protesto contra um documento que, dizem, vai obrigar o país a fechar portas. Na
Assembleia da República, os deputados reúnem-se hoje para um debate de
actualidade agendado ontem mesmo, a pedido do PCP.
Por via das
dúvidas, e para não “incorrer em responsabilidade financeira”, na ASAE ficaram
carros por abastecer, evitaram-se passagens por portagens, ficaram em suspenso
reparações de qualquer espécie e foram devolvidas 17 viaturas em regime de
aluguer. Pelo menos até que dos contactos efectuados com o ministério, “no
sentido de clarificar a situação”, resultem novos esclarecimentos, de acordo
com um email interno a que o i teve acesso.
No despacho posto a
circular pelas Finanças lê-se que todos os ministérios e serviços na
dependência do Estado estão impedidos de “assumir novos compromissos sem
autorização prévia” de Vítor Gaspar. Estava instalada a dúvida sobre qual a
extensão do congelamento das contas públicas. Sobre esse ponto, o documento
refere apenas como únicas excepções à regra as “despesas com pessoal”, o “pagamento
de custas judiciais” e os gastos “decorrentes de contratos em execução cujo
montante a pagar não pudesse ser determinado no momento em que foi celebrado”.
Outra das dúvidas
teve a ver com o tempo de vigência do congelamento das contas. Vítor Gaspar
escreveu no despacho que a suspensão de gastos teria efeitos a partir da sua
publicação, na segunda-feira, e caducaria “com a deliberação do Conselho de
Ministros que aprove limites aos fundos disponíveis no âmbito de cada um dos
programas orçamentais”. Isso significa que só será reposto o funcionamento
regular das contas públicas quando o governo encontrar uma alternativa aos
cerca de 1300 milhões de euros de cortes orçamentais, constantes das quatro
normas consideradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional.
Mas o i sabe
que em vários ministérios e organismos públicos a interpretação do despacho
levou a que se considerasse o dia de hoje como a data limite para a vigência do
despacho. Contactado para esclarecer que prazos estariam em cima da mesa, o
Ministério das Finanças remete para o despacho, sem adiantar quaisquer
esclarecimentos.
DE PORTAS FECHADAS
O comunicado
publicado na terça-feira pelo reitor da Universidade de Lisboa abriu as
hostilidades públicas contra a decisão das Finanças. António Sampaio da Nóvoa
acusou o governo de “fechar o país e bloquear o funcionamento das instituições
públicas” e de lançar a “perturbação e o caos sem qualquer resultado prático”.
O bastonário da
Ordem dos Advogados, Marinho e Pinto, viu no gesto de Gaspar “um acto
retaliatório e vingativo” contra o chumbo do Orçamento do Estado e disse ser
“incompreensível e inaceitável uma medida dessa natureza”. Falando em nome dos
Técnicos Oficiais de Contas, Domingues de Azevedo disse ter chegado “o tempo de
pedir também a outras classes sociais o seu contributo para o reequilíbrio das
contas públicas, porque até hoje só se tem pedido aos trabalhadores por conta
de outrem”. Por seu lado, Pacheco Pereira chegou a admitir estar justificada “a
demissão do governo”.
Desta vez, o
secretário-geral do PS não esperou pelo dia seguinte para comentar e António
José Seguro disse que o despacho de Gaspar “espelha o que este governo entende
sobre como se deve sair da crise: é fechar o país, é fechar os serviços, é
dificultar a vida das pessoas”.
MEDIDA VITAL
Na perspectiva da
maioria, o país não só não vai fechar, como esta proibição temporária de
contrair novos encargos é vital para reequacionar as finanças nacionais.
“Enquanto o governo não redefinir a forma como, do ponto de vista orçamental e
até sectorial, se vai acomodar esta decisão do Tribunal Constitucional, tem
naturalmente de ter algumas medidas preventivas”, disse ontem Luís Montenegro,
líder da bancada parlamentar social-democrata.
O deputado afirmou
que ficam assegurados os compromissos que visam “responder às pessoas que
precisam”, como tribunais, escolas e hospitais. “Não perceber que é com este
rigor que se salvaguarda a prestação de serviços públicos, a meu ver é
desvirtuar o problema que temos tragicamente em Portugal há mais de uma
década”, considerou Montenegro.
Apesar de assinalar
a situação excepcional que se vive no país, o CDS afirma que o documento
enviado pelo ministro aos órgãos públicos é “absolutamente normal”. “Há algum
exagero nas críticas feitas ao despacho do ministro das Finanças, porque é
transitório, não tem uma execução prolongada e justifica-se face aos mais recentes
acontecimentos, mas também face ao que se espera [para o país] nos próximos
dias”, disse Nuno Magalhães, líder dos deputados do CDS. Magalhães referiu
ainda que país e o mundo mudaram “para pior e que há quem não entenda isso.
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