Diário de Notícias,
editorial
O Presidente da
República exigiu ontem três coisas concretas ao PSD, ao PS e ao CDS: negociarem
a marcação da data de umas eleições antecipadas para depois de junho de 2014,
negociarem um pacote de medidas imediatas que permita o cumprimento do Programa
de Ajustamento e o regresso aos mercados no início de 2014, negociarem um
acordo de médio prazo que garanta, seja qual for o Governo, que não haja
oposição dos partidos subscritores numa lista concreta de objetivos financeiros
e económicos que implicam, certamente, a aplicação de mais medidas difíceis
para o País.
Será compreensível,
face aos contornos inesperados da crise política deflagrada no interior dos
partidos do Governo, que Cavaco Silva, receoso dos perigos da marcação de
eleições para setembro, tente procurar um compromisso de médio prazo para
reforçar junto da troika e dos mercados bolsistas a convicção de que, sejam
quais forem as futuras alterações de elenco governativo que Portugal vier a
atravessar, está sempre garantida a aplicação de uma política financeira e
económica coerente, estável, previsível, respeitadora dos compromissos
assumidos, claramente apoiada pelas instituições europeias.
Ao tentar precaver
o médio prazo com a tentativa de imposição aos partidos que assinaram o
Programa de Ajustamento de um compromisso que o próprio Presidente da República
reconhece ter grandes dificuldades políticas de concretização, Cavaco Silva
aparenta, no entanto, ter descurado as questões do curto prazo.
Em primeiro lugar,
a solução presidencial deixa o Governo de Pedro Passos Coelho sem margem e sem
aval para aplicar a remodelação que projetou com Paulo Portas - e que
reforçaria os poderes deste -, fazendo prolongar no tempo as contradições que
estiveram na base da crise política e que culminaram na saída de Vítor Gaspar,
na nomeação de Maria Luís Albuquerque e no pedido, não aceite, de saída do
líder do CDS-PP. É, portanto, um governo de enorme fragilidade aquele que terá
de exercer o poder até junho de 2014.
Em segundo lugar, o
Presidente exige aos partidos um acordo, que apelidou de salvação nacional,
numa altura em que a crispação está no auge, com toda a oposição a pedir
eleições e com os partidos do Governo num estágio de relações entre si muito
degradado. Tudo indica que, no curto prazo, a viabilidade de um entendimento
desse tipo é de dificuldade extrema.
Em terceiro lugar,
imagine-se o mau ambiente político - e as repercussões que isso terá no
Governo, na economia, nos mercados, na troika e na Europa - se se prolongar no
tempo, indefinida e sem solução à vista, a negociação que Cavaco pediu ontem
aos partidos...
Ao dar prioridade
ao médio prazo, o Presidente da República não solucionou o curto prazo e, com
isso, arrisca-se a não ser o fator de estabilidade política que pretende ser.
Pelo contrário, ao fazer prolongar a indefinição, ao comunicar o seu pensamento
de uma forma que suscitou na generalidade dos analistas muitas dúvidas e
interpretações divergentes, ao não separar a solução para a definição clara e
rápida do poder executivo da assinatura do pacto de regime que pretende obter,
Cavaco Silva corre o enorme risco de ser ele próprio um fator de instabilidade.
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