quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Portugal: MONTANHAS E RATOS

 

Eduardo Oliveira Silva – Jornal i, opinião
 
Raramente os processos de corrupção chegam ao fim, por faltar descobrir o elo que se sabe existir
 
Existe a percepção interna e externa de que a corrupção em Portugal atinge patamares alarmantes, tendo-se agravado inclusivamente desde o advento da democracia.
 
O facto de sermos uma sociedade amplamente burocrática é sem dúvida um dos factores que facilitam subornos, arranjos e a existência de níveis elevados de corrupção. Esta é exposta por notícias e informações que circulam sempre que há um grande contrato que envolva qualquer coisa no ar, em terra ou no mar, à superfície ou em profundidade.
 
Seja a aquisição de equipamento militar ou (há muitos anos) a compra de aviões comerciais, sejam grandes obras públicas de qualquer natureza, PPP ou swaps, seja ainda a fixação de rendas disto ou daquilo, tudo, ou quase tudo, tem ao seu redor a suspeita do negócio duvidoso.
 
No entanto, a verdade obriga a constatar que só muito raramente o apuramento de factos vai até ao fim, porque falta quase sempre a prova definitiva do elo de uma corrente que se sabe existir, mas não se prova, exactamente porque a verdadeira corrupção é inteligente.
 
Os casos substanciais que chegam aos tribunais têm em geral mais a ver com a natureza de actos que configuram roubos, desvios ou crimes fiscais do que propriamente corrupção, que – enfatize-se – tem uma natureza muito subtil e obscura.
 
O caso da gestão de Oliveira Costa no BPN e de outras situações ligadas à banca é de resto a prova evidente de que quando há desvios de dinheiros tão óbvios as coisas sempre se podem ir descobrindo, e é de notar que o que está em apreciação da parte dele se prende mais com casos de polícia do que com corrupção.
 
É também um facto que a lentidão da justiça causa prejuízos gravíssimos, e eventualmente irreparáveis, para a imagem de gente de bem cujo nome é envolvido sem razão em processos que duram anos. Isto para não falar de danos materiais e morais resultantes de medidas judiciais injustificadas e cujo levantamento não altera o prejuízo.
 
Para ser verdadeiramente eficaz e transparente no combate à corrupção, a justiça na fase de investigação tem de ser célere, tem de dispor de meios eficientes face à complexidade do tipo de crime, tem de esclarecer quando há nomes erradamente envolvidos e de enviar para julgamento processos bem instruídos.
 
Os casos que chegarem a julgamento terão, por outro lado, de ser decididos sem o enorme manancial de manobras legais dilatórias que falseiam a aplicação da lei, dando à população largas razões de desconfiança.
 
Seja como for, as razões de fundo que fazem o caldo de cultura favorável à corrupção são uma realidade que existe efectivamente em Portugal. Passam por um conjunto de comportamentos que começam em pequenas práticas que todos consentimos por razões culturais e a que Queirós chamava “empenhos” e acabam nos verdadeiros grandes cambalachos, que são aqueles de que muito se fala e normalmente dão em nada ou se ficam nas nossas. Queridíssimas águas de bacalhau, isto para não usar a imagem mais crua da montanha que pariu um rato.
 
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