Fernando Santos –
Jornal de Notícias, opinião
O quadro
comunitário de apoio para o período 2014-2020 está a reativar nefastos vícios
públicos e privados. Enganados estavam todos quantos julgavam mortos e
enterrados os comportamentos que conduziram o país à pré-falência e à hipoteca
do futuro de várias gerações.
Os 25 mil milhões
de euros postos à disposição pela União Europeia representam a derradeira
oportunidade de o país dispor de fundos capazes de permitir a sua modernização,
seja ela infraestrutural seja de capital humano. Como fazê-lo é o ponto-chave
de um tabuleiro demasiado marcado por jogatanas e discórdia e no qual se tenta
fintar a necessidade de acompanhar uma parte menor do financiamento dos
projetos através de capitais próprios, isto é, pelo recurso a dinheiros
públicos - leia-se impostos dos portugueses.
Ainda no limiar do
acionamento dos fundos estão já à vista, de facto, os sintomas da atração pela
reincidência em erros do passado e subserviência aos interesses de sempre.
A excitação provocada
pelas conclusões de um grupo de estudo sobre os projetos de obras públicas
consideradas estratégicas para a felicidade futura é paradigmática. A bondade
do grupo de estudiosos concluiu pela aplicação de 5,1 mil milhões de euros em
30 projetos, a maioria infraestruturas de índole portuária e ferroviária -
descartando, como seria de todo natural, a continuidade do investimento em elefantes
brancos rodoviários.
Secundarize-se a
análise à distribuição geográfica dos investimentos preconizados - sintomática
do objetivo de satisfazer todas as capelinhas. E então?
Não dispondo o país
de meios para arcar com a parte de financiamento que lhe compete, a apetência
será sempre a de envolver os privados. E sabe-se como....
Os 30 projetos
apresentados formam um cardápio de boas intenções - curiosamente, jamais
fundamentadas em estudos de viabilidade económico-financeira - e, bem vistas as
coisas, as projeções até são dispensáveis, evitando-se assim repetir a
indecente e má figura de "filmes" anteriores.
Para todos os
efeitos, a conversa fiada do investimento para o bem--estar geral é a mais
conveniente para satisfazer os sindicatos financeiros (e não só) do costume,
disfarçando sempre o lema da socialização dos custos e a privatização dos
lucros.
É uma triste sina a
existência do risco de conclusão pela incapacidade de o poder decisório se
desamarrar de grupos de pressão - e eles mexem-se num jogo de sombras no qual
mais se parecem com bandos de aves de rapina em sobrevoo da presa.
Sim, é só um
estudo, entregue ao Governo para avaliação e posterior decisão. Mas é legítimo
temer-se pela repetição de erros recentes - e de consequências bem à vista.
A teia de
interesses é demasiado forte e será uma proeza se o Poder Executivo nela não se
enredar.
A ruína das
parcerias público-privadas tem tudo para ser replicada. Sem emenda.
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