João Lemos Esteves –
Expresso, opinião
Após semanas repletas de trabalho, voltamos hoje (ainda que com algumas
intermitências) às crónicas regulares aqui no POLITICOESFERA. Enquanto estive
ausente, fui registando os factos políticos mais relevantes, mais insólitos e
mais surpreendentes. Hoje, terei de me pronunciar sobre o facto mais
insólito deste ano (até ao momento, mas dada a sua bizarrice será
difícil de superar) político: o regresso de Miguel Relvas à política activa,
por via da sua eleição para o Conselho Nacional do PSD. Miguel Relvas - registe-se,
para memória futura - encabeçou a lista de Pedro Passos Coelho, elegendo apenas
18 representantes. Valeu a pena esta aposta de Pedro Passos Coelho? A primeira
resposta seria um categórico "não": Passos elegeu apenas 18
representantes para o Conselho Nacional, obtendo o seu pior resultado de sempre
em eleições internas. O que mostra bem como o PSD é um partido fantástico:
enquanto Passos Coelho apresentava com alegria e satisfação o nome de Miguel
Relvas, os militantes olhavam-se entre si, estupefactos, a questionar se tal
revelação era mesmo verdade! Os militantes do PSD não aguentam Passos Coelho,
discordam de Passos Coelho - mas, colocando o interesse de Portugal em manter a
estabilidade política num momento em que Paulo Portas chamou para si a
liderança do Governo, vão aguentando o seu "líder" de Partido.
Dito isto, a verdade
é que Passos Coelho cumpriu os seus objectivos ao fazer regressar Miguel Relvas
à política activa (sim, porque Relvas está de volta: só por ingenuidade será
possível afirmar que Relvas vai para um órgão nacional do PSD para
"brincar" ou para "andar a esconder-se"...). Vejamos
porquê.
Em primeiro lugar,
Passos Coelho mostrou claramente que defende o seu núcleo duro até ao
"último sopro", custe o que custar. Passos Coelho deixou cair Relvas
no ano passado, num episódio que causou algum atrito na relação entre os dois.
E Relvas, ao contrário do que afirmou, não tem andado desaparecido da vida do
partido. Relvas é incapaz de deixar a política - porque depende dela e os seus
negócios estão a ela associados. Relvas precisa de poder - sem poder não há
Relvas. É uma questão de sobrevivência. Ora, o que tem feito Miguel Relvas? Miguel
Relvas, como vingança da atitude do Primeiro-Ministro, andou a sondar a
disponibilidade de gente não alinhada com Passos para formar uma alternativa à
sua liderança. Ou seja, Relvas percebendo que Passos Coelho estava muito
enfraquecido e que tinha quebrado o dever de solidariedade que os unia, tentou
criar uma onda de agitação no partido e através de alguns meios de comunicação
social (os almoços com alguns jornalistas mantiveram-se). Há quem diga que
Miguel Relvas chegou a almoçar com Rui Rio algumas vezes - não sei se tal rumor
tem ou não fundamento: direi apenas que é muito provável que tenha algum fundo
de veracidade. Ora, Passos Coelho, ao convidar Miguel Relvas, volta a ter o seu
amigo "operacional" consigo para dominar a máquina, para preparar as
eleições autárquicas (Relvas mexe-se muito bem nos bastidores e ainda tem
algumas posições estratégicas em algumas redacções) - e dá uma imagem de força
política. De facto, se Passos Coelho não estivesse confiante de que a
conjuntura lhe é particularmente favorável, não terei certamente chamado Miguel
de Relvas de volta - no fundo, o sinal que pretende dar aos Portugueses é o de
que ele rinha razão desde o início, até na equipa que formou! E que Miguel
Relvas é um dos protagonistas do "milagre económico português" -
merecendo, por conseguinte, um reconhecimento por tal feito! Passos Coelho
já dá a sua vitória nas legislativas como dado adquirido!
Por outro lado,
Passos Coelho pretendeu com o regresso de Miguel Relvas colocar travões à
ascensão, segura e meritória, de Marco António Costa dentro do PSD - mas também
no País. Marco António Costa tem sido a revelação do "passismo":
seguro, muito trabalhador, com um discurso social forte e um trabalho notável
de concertação e colaboração com as Misericórdias. Até um conhecido meu
comunista elogiou a qualidade do trabalho de Marco António Costa! - o que é
obra! Marco António Costa é muito melhor do que muitos (incluindo eu)
julgavam! Ultimamente, têm surgidas inúmeras divergências - sobre matérias
politicamente importantes - entre Passos Coelho e Marco António Costa. O
regresso de Miguel Relvas é, pois, também uma forma de Passos Coelho controlar
Miguel Relvas. Passos Coelho quer ser ele a dominar a máquina, sem qualquer
contestação. Eis as verdadeiras razões do regresso de Miguel Relvas.
Enfim, Passos
Coelho não vive sem Miguel Relvas. Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és...
Refira-se, ainda, que o regresso de Relvas é uma desautorização objectiva de
Nuno Crato: então, o Ministro da Educação retira o diploma a Relvas e
Passos Coelho vem reabilitar o seu ex-Ministro? Tem alguma lógica? Por isso é
que Passos não consegue ter pulso no Governo, precisando de Paulo Portas...
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