terça-feira, 15 de abril de 2014

RUANDA – CRONOLOGIA HISTÓRICA DESDE 1990 ATÉ 6 DE ABRIL DE 1994



Martinho Júnior, Luanda

A 10 DE ABRIL DE 2004, O ACTUAL Nº 391 PUBLICAVA A 2ª PARTE DA CRONOLOGIA HISTÓRICA SOBRE O RUANDA.

FICAVA DESDE LOGO PATENTE QUE OS BELGAS PERDERAM INFLUÊNCIA E, ENTRE OS INTERESSES EXTERNOS, PERFILHAVAM-SE OS DA FRANÇA E OS DOS ESTADOS UNIDOS.

AMBAS AS POTÊNCIAS TIVERAM INFLUÊNCIA DIRECTA NOS DOIS LADOS DA BARRICADA E NÃO PODEM ALEGAR QUE NADA TÊM A VER COM OS ACONTECIMENTOS, DE FORMA DIRECTA E INDIRECTA.

É EVIDENTE QUE DESDE O INÍCIO DO SÉCULO XXI O IMPÉRIO SUBORDINOU, SOB OS PONTOS DE VISTA GEO-ESTRATÉGICO E GEO-POLÍTICO, O PAPEL DA FRANÇA EM ÁFRICA E DESDE ENTÃO MANTÉM PREPONDERÂNCIA NO CORAÇÃO DO CONTINENTE, NA IMENSA REGIÃO DOS GRANDES LAGOS, MATRIZ DE DOIS DOS MAIS IMPORTANTES RIOS AFRICANOS: O CONGO E O NILO!

A PAZ PAN-AFRICANA TEM A SUA OPORTUNIDADE SOBRE OS ESCOMBROS DESSA IMENSA REGIÃO FULCRAL PARA O CONTINENTE: SE ELA FOR ALCANÇADA ALI, ÁFRICA PODERÁ EVOLUIR PARA O RENASCIMENTO, APROVEITANDO APOIOS EXTERNOS QUE PREVALEÇAM NA DIRECÇÃO DA PAZ!

- O fim da Guerra Fria veio alterar profundamente a vida no país: em Julho de 1990, sob pressão dos países ocidentais, entre eles a própria França, o Presidente Juvenal Habyarimana concede o princípio de formação duma democracia multi-partidária, mas as disputas geo estratégicas entre os Estados Unidos e a França em relação à África Central, acabam por inflamar ainda mais os conflitos locais, cada qual envolvendo a sua “procuração”.

- O Presidente François Mitterrand discursa em La Baule e, entre outros Chefes de Estado africanos, o Presidente Juvenal Habyarimana é convidado a implantar a democracia no Ruanda.

O Presidente francês assegurou o seu total apoio ao Presidente do Ruanda na reorientação do estado do seu país nessa direcção.

O discurso do Presidente François Mitterrand foi elaborado por Erik Orsena, que mais tarde abandonará o Elysée, denunciando a política africana do Presidente Francês.

De 1990 a 1994, o Presidente François Mitterrand manteve-se sempre ao corrente da evolução da situação do Ruanda e, em 1993, a célula do Elysée mantém o General Jean Pierre Huchon ao seu serviço, propositadamente para melhor acompanhar o desenrolar dos acontecimentos e melhor dirigir as acções de resposta.

- Em Outubro de 1990 as guerrilhas do “RPF” invadem o país a partir do Uganda.

Depois de intensos combates em que o governo solicitou a ajuda de tropas zairenses, francesas e belgas; os belgas acabaram por abandonar essa ajuda sob pressão do Parlamento do seu país e o Presidente Mobutu envia 3.000 homens da Divisão Especial Presidencial (“DSP”), mas sob pressão interna, não os consegue manter por muito tempo no Ruanda pelo que o encargo principal do lado do regime, recaiu sobre a presença militar francesa; um Acordo de Cessar-Fogo foi assinado a 29 de Março de 1991.

É em função desses acontecimentos que o governo começou a formar milícias, conhecidas como “interahamwe” (“aqueles que estão juntos”).

Desde então tornaram-se mais frequentes os massacres de tutsis e quer os partidos, quer personalidades de oposição, passaram a ser perseguidas e assassinadas.

- Pelas 14H30 de 1 de Outubro de 1990, o “FPR” realizou a sua primeira acção que inaugurou as luta armada contra o regime: um grupo de cinquenta homens armados, comandados por Fred Rwigema, ataca um posto fronteiriço do Ruanda, no Norte.

O inspirador do “FPR” morre nessa primeira acção em circunstâncias até hoje não esclarecidas e Paul Kagame passou a assumir o protagonismo principal no “FPR”.

Em retaliação, cerca de 8.000 tutsis são massacrados em Kibirira.

- Nessa mesma data, Paul Kagame encontrava-se de há dois meses a essa parte num curso para Oficiais de Estado-Maior, em Fort Leavenworth, no Kansas, Estados Unidos, beneficiando dos relacionamentos entre o Uganda e os norte-americanos, depois da tomada do poder por Yoweri Museveni.

Regressou imediatamente à região e internou-se com o “FPR” no Ruanda, assumindo o seu comando.

- É também em Outubro de 1990 que se iniciou a propaganda ideológica por parte do regime e contra a revolta do“FPR”.

Muitas rádios locais começaram por emitir ameaças, incitações ao medo, insinuações sobre a situação catastrófica para o caso do poder vir a ser partilhado, difamação de opositores, apelos à “solidariedade étnica”, etc.

Em Dezembro de 1990 e nessa conformidade, a revista Kangura , publicada em Gysenyi, difunde os “10 mandamentos Hutus”, com o apoio da família do Presidente Juvenal Habyarimana.

No 4º “mandamento” é publicada a foto do Presidente François Mitterrand com uma legenda – “Os grandes amigos, são para as ocasiões difíceis”.

- Em Janeiro de 1991 o “FPR” liberta os presos da prisão de Ruhengeri , no oeste do país e abre uma nova frente em Byumba, no nordeste.

Um destacamento francês intervém a fim de obstar os esforços do “FPR” no Nordeste.
Nesse mês deu-se mais um massacre de tutsis na comunidade de Bagogwe, executado pelas “FAR” (“Forces Armées Ruandaises”).

- Em Fevereiro de 1991 um antigo membro dos esquadrões da morte, Janvier Afrika, afirmou publicamente que os militares franceses estavam directamente empenhados na formação das milícias “interahamwe”.

- Em Novembro de 1991 a Federação Internacional dos Direitos do Homem, na pessoa da activista Eric Gillet, acusa os militares franceses de “fazerem interrogatórios musculados” a todos os prisioneiros do “FPR”.

- Em Fevereiro de 1992 é destacado pelo Ministro Francês da Defesa o Tenente Coronel Cholet a fim de, junto do Presidente Juvenal Habyarimana, “organizar a defesa e o funcionamento da instituição militar”.

- Em Março de 1992 é criado o “CDR”, (“Coalizão para a Defesa da República”), que haveria de pautar a sua actuação com uma militância radical de direita, em nome do “Poder Hutu”.

Nesse mesmo mês é assinado um contrato Egípcio para o fornecimento ao Ruanda de material de guerra , no valor de 6 milhões de USD sob cobertura do Banco Francês Crédit Lyonnais.

A partir dessa data e até 1993, a Firma Sul Africana “ARMSCOR” fornece ao Ruanda material de guerra no valor anual de 86 milhões de USD não se sabendo em que divisas isso foi pago.

- Em Agosto de 1992 registou-se um novo massacre de tutsis na região de Kibuye, perpetrado pelas milícias.

- Em Outubro , o Senador belga Kuypers denuncia o papel dos “esquadrões da morte” (os “redes Zero”) e a política racista do regime de Habyarimana.

- Em Novembro de 1992 um proeminente activista hutu, o Dr. Léon Mugesera, apelou para que os hutus enviassem os tutsis “de volta para a Etiópia” pelos rios e, a partir dessa data, os apelos ao divórcio entre tutsis e hutus multiplicaram-se, de ambos os lados.

Léon Mugeresa era membro do Bureau Político do “MRND”.

Em Dezembro novos massacres dos tutsis são feitos, desta vez na terra natal do Presidente Juvenal Habyarimana, em Gisenyi.

- Em Janeiro de 1993 foi feita uma visita de activistas da Federação Internacional dos Direitos Humanos que percorreu o Ruanda e encontrou provas da implicação de algumas unidades francesas nos massacres.

Depois da denúncia, após a saída dos membros da “FIDH”, novos massacres foram cometidos.

- Em Fevereiro de 1993 o “FPR” lançou uma nova ofensiva e as guerrilhas atingiram os arredores de Kigali , pelo que o governo fez de novo apelo às tropas francesas, a fim de o ajudar na resposta.

Os combates continuaram por vários meses.

A França assumiu o seu papel de aliado do regime em manifesta contraposição à expansão dos interesses anglófonos à responsabilidade da Administração Democrata de Bill Clinton na África Central.

- Em Março de 1993 o Conselho de Segurança da ONU toma a Resolução nº 812 visando colocar uma força internacional de interposição entre os contendores, numa altura em que foram retirados os reforços franceses chegados em Fevereiro e em que o “FPR” toma as suas posições abandonadas.

- A 4 de Agosto de 1993 o Presidente Juvenal Habyarimana e o “FPR” assinaram um Acordo (o Acordo de Arusha) que permitia o regresso dos refugiados ao país e a formação dum governo de coalizão entre os hutus e o “FPR”.

Nesse quadro a ONU enviou 2.500 capacetes azuis para o Ruanda, na tentativa de levar por diante a sua implementação.

O Ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Alain Juppé, apoia oficialmente o Acordo.
- Apesar desse Acordo o conhecimento dos preparativos para o início do holocausto genocida generalizou-se a ponto do Rei Tutsi, Kigeli V, que vivia no exílio, enviar cartas ao governo dos Estados Unidos e à ONU, alertando para os perigos que espreitavam no horizonte político ruandês.

- O “FPR”, sem conferir relevância ao discurso de Paz em função do Acordo de Arusha, reiniciou a sua preparação para a guerra recebendo muito material dos ugandeses e reiniciando a preparação das suas tropas em Karama, um centro político militar existente na Prefeitura de Byumba.

O objectivo a partir de então passou a ser a tomada absoluta do poder, com o derrube do regime do Presidente Juvenal Habyarimana.

- De Setembro de 1993 a Março de 1994 o Presidente Juvenal Habyarimana mantém-se no poder e, ao mesmo tempo que bloqueou o Acordo de Arusha de transição democrática, ordenou a aceleração da formação e do treino das milícias “interahamwe”, fortaleceu os sectores extremistas do “MRND”, ao mesmo tempo que emissoras extremistas, como a famosa “Rádio Televisão das Mil Colinas” começavam a exortar o ataque aos Tutsis.

Activistas dos Direitos Humanos manifestaram nessa altura a sua apreensão sobre a possível eclosão de calamidades no relacionamento entre as duas castas e muitos deles evacuaram do país as suas próprias famílias.

- Durante esse período crítico o governo de Juvenal Habyarimana comprou armas a um comerciante de armas francês, Dominique Lemaunier, a fim de reequipar as suas forças, tendo os pagamentos sido feitos pelo Ministro das Finanças de então , Marc Rugenera.

- Amigos e emissários do “FPR” moveram influências junto do Presidente tanzaniano Hassan Mwinyi, a fim de através dos seus bons ofícios pressionar os Presidentes do Ruanda e do Burundi para implementarem o Acordo de Arusha.

Essa manobra político-diplomática, (que reclamava a presença em Dar Es Salam dos dois Presidentes e dos Chefes militares do Ruanda e do Burundi), visava obrigar os dois Presidentes e a cúpula militar a movimentarem-se, a fim de preparar o plano do seu assassinato, derrubando o avião Presidencial de Juvenal Habyarimana quando ele regressasse dessa Conferência a Kigali.

Desse modo o início da ofensiva do “FPR” encontraria pela frente uma resposta debilitada com a decapitação da cúpula política e militar inimiga.

- O Presidente Mobutu esteve para assistir a essa Conferência do Presidente Tanzaniano com os Presidentes do Ruanda e do Burundi a pedido pessoal do Presidente Juvenal Habyarimana que tentava assim encontrar apoios regionais para fazer frente às iniciativas dos aliados do “FPR”, mas o Presidente Mobutu cancelou a sua deslocação à última da hora, a pedido de seus assessores de segurança.

- Em Janeiro de 1994 uma das personalidades que visita discretamente Kigali, enviado pela célula Africana do Elysée, é Paul Barril, um dos especialistas “TECHINT”ao serviço do Elysée.

- Em Fevereiro de 1994, Gatabazi Felicien, Secretário Geral do “PSD” (“Partido Social Democrata”), foi assassinado em Kugali por um comando do “FPR”, em retaliação ao facto de ele se ter oposto ao plano do “FPR” de assassinar o Presidente Juvenal Habtarimana e evitando que ele fizesse chegar ao então Presidente do Ruanda o conhecimento dos riscos que sobre ele pendiam.

- Em resposta ao assassinato de Gatabazi Felicien os militantes do “PSD” de Butare, na ignorância das operações psicológicas do “FPR”, assassinaram em jeito de retaliação Bucyana Martin, Presidente do “CDR” (“Coalizão para a Defesa da República”).

- Em Março de 1994 chegaram vários carregamentos de armas para distribuir pelo “interahamwe”provenientes via aérea a partir do Egipto.

Nesse mesmo mês, o então Tenente Coronel James Kabarehe levou pessoalmente para Kigali os mísseis SAM-7 que seriam utilizados no derrube do avião Presidencial, entregando-os a um comando de atiradores às ordens do Tenente Coronel Charles Kayonga.
Nessa altura ele preparou toda a manobra ofensiva do “FPR” que se seguiria ao ataque.

- Ainda em Março de 1994, o “FPR” comprou 12 sistemas de artilharia pesada ao “UPDF”.

Essas armas foram estacionadas antes do início das operações no Quartel-General do “RPF”, em Mulindi.

- Pelas 20H25 de 6 de Abril de 1994 o Presidente Juvenal Habyarimana e o Presidente do Burundi, Cyprien Ntaryamira, foram assassinados, num atentado com a utilização de mísseis SAM-7 que derrubaram o avião Presidencial ruandês, à chegada ao Aeroporto de Kigali.

O genocídio começou na mesma noite. Nessa mesma noite, por seu turno, o “RPF” deu início ao movimento ofensivo de suas tropas, até à tomada do poder pela força das armas.


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