Martinho Júnior,
Luanda
A 10 DE ABRIL DE
2004, O ACTUAL Nº 391 PUBLICAVA A 2ª PARTE DA CRONOLOGIA HISTÓRICA SOBRE O
RUANDA.
FICAVA DESDE LOGO
PATENTE QUE OS BELGAS PERDERAM INFLUÊNCIA E, ENTRE OS INTERESSES EXTERNOS,
PERFILHAVAM-SE OS DA FRANÇA E OS DOS ESTADOS UNIDOS.
AMBAS AS POTÊNCIAS
TIVERAM INFLUÊNCIA DIRECTA NOS DOIS LADOS DA BARRICADA E NÃO PODEM ALEGAR QUE
NADA TÊM A VER COM OS ACONTECIMENTOS, DE FORMA DIRECTA E INDIRECTA.
É EVIDENTE QUE
DESDE O INÍCIO DO SÉCULO XXI O IMPÉRIO SUBORDINOU, SOB OS PONTOS DE VISTA
GEO-ESTRATÉGICO E GEO-POLÍTICO, O PAPEL DA FRANÇA EM ÁFRICA E DESDE ENTÃO
MANTÉM PREPONDERÂNCIA NO CORAÇÃO DO CONTINENTE, NA IMENSA REGIÃO DOS GRANDES
LAGOS, MATRIZ DE DOIS DOS MAIS IMPORTANTES RIOS AFRICANOS: O CONGO E O NILO!
A PAZ PAN-AFRICANA
TEM A SUA OPORTUNIDADE SOBRE OS ESCOMBROS DESSA IMENSA REGIÃO FULCRAL PARA O
CONTINENTE: SE ELA FOR ALCANÇADA ALI, ÁFRICA PODERÁ EVOLUIR PARA O
RENASCIMENTO, APROVEITANDO APOIOS EXTERNOS QUE PREVALEÇAM NA DIRECÇÃO DA PAZ!
- O fim da Guerra
Fria veio alterar profundamente a vida no país: em Julho de 1990, sob pressão
dos países ocidentais, entre eles a própria França, o Presidente Juvenal
Habyarimana concede o princípio de formação duma democracia multi-partidária,
mas as disputas geo estratégicas entre os Estados Unidos e a França em relação
à África Central, acabam por inflamar ainda mais os conflitos locais, cada qual
envolvendo a sua “procuração”.
- O Presidente
François Mitterrand discursa em La Baule e, entre outros Chefes de Estado
africanos, o Presidente Juvenal Habyarimana é convidado a implantar a
democracia no Ruanda.
O Presidente
francês assegurou o seu total apoio ao Presidente do Ruanda na reorientação do
estado do seu país nessa direcção.
O discurso do
Presidente François Mitterrand foi elaborado por Erik Orsena, que mais tarde
abandonará o Elysée, denunciando a política africana do Presidente Francês.
De 1990 a 1994, o
Presidente François Mitterrand manteve-se sempre ao corrente da evolução da
situação do Ruanda e, em 1993, a célula do Elysée mantém o General Jean Pierre
Huchon ao seu serviço, propositadamente para melhor acompanhar o desenrolar dos
acontecimentos e melhor dirigir as acções de resposta.
- Em Outubro de
1990 as guerrilhas do “RPF” invadem o país a partir do Uganda.
Depois de intensos
combates em que o governo solicitou a ajuda de tropas zairenses, francesas e
belgas; os belgas acabaram por abandonar essa ajuda sob pressão do Parlamento
do seu país e o Presidente Mobutu envia 3.000 homens da Divisão Especial
Presidencial (“DSP”), mas sob pressão interna, não os consegue manter por muito
tempo no Ruanda pelo que o encargo principal do lado do regime, recaiu sobre a
presença militar francesa; um Acordo de Cessar-Fogo foi assinado a 29 de Março
de 1991.
É em função desses
acontecimentos que o governo começou a formar milícias, conhecidas como “interahamwe”
(“aqueles que estão juntos”).
Desde então tornaram-se
mais frequentes os massacres de tutsis e quer os partidos, quer personalidades
de oposição, passaram a ser perseguidas e assassinadas.
- Pelas 14H30 de 1
de Outubro de 1990, o “FPR” realizou a sua primeira acção que inaugurou as luta
armada contra o regime: um grupo de cinquenta homens armados, comandados por
Fred Rwigema, ataca um posto fronteiriço do Ruanda, no Norte.
O inspirador do “FPR”
morre nessa primeira acção em circunstâncias até hoje não esclarecidas e Paul
Kagame passou a assumir o protagonismo principal no “FPR”.
Em retaliação,
cerca de 8.000 tutsis são massacrados em Kibirira.
- Nessa mesma data,
Paul Kagame encontrava-se de há dois meses a essa parte num curso para Oficiais
de Estado-Maior, em Fort Leavenworth, no Kansas, Estados Unidos, beneficiando
dos relacionamentos entre o Uganda e os norte-americanos, depois da tomada do
poder por Yoweri Museveni.
Regressou
imediatamente à região e internou-se com o “FPR” no Ruanda, assumindo o seu
comando.
- É também em
Outubro de 1990 que se iniciou a propaganda ideológica por parte do regime e
contra a revolta do“FPR”.
Muitas rádios
locais começaram por emitir ameaças, incitações ao medo, insinuações sobre a
situação catastrófica para o caso do poder vir a ser partilhado, difamação de
opositores, apelos à “solidariedade étnica”, etc.
Em Dezembro de 1990
e nessa conformidade, a revista Kangura , publicada em Gysenyi, difunde os “10
mandamentos Hutus”, com o apoio da família do Presidente Juvenal Habyarimana.
No 4º “mandamento” é
publicada a foto do Presidente François Mitterrand com uma legenda – “Os
grandes amigos, são para as ocasiões difíceis”.
- Em Janeiro de
1991 o “FPR” liberta os presos da prisão de Ruhengeri , no oeste do país e abre
uma nova frente em Byumba, no nordeste.
Um destacamento
francês intervém a fim de obstar os esforços do “FPR” no Nordeste.
Nesse mês deu-se
mais um massacre de tutsis na comunidade de Bagogwe, executado pelas “FAR” (“Forces
Armées Ruandaises”).
- Em Fevereiro de
1991 um antigo membro dos esquadrões da morte, Janvier Afrika, afirmou
publicamente que os militares franceses estavam directamente empenhados na
formação das milícias “interahamwe”.
- Em Novembro de
1991 a Federação Internacional dos Direitos do Homem, na pessoa da activista
Eric Gillet, acusa os militares franceses de “fazerem interrogatórios
musculados” a todos os prisioneiros do “FPR”.
- Em Fevereiro de
1992 é destacado pelo Ministro Francês da Defesa o Tenente Coronel Cholet a fim
de, junto do Presidente Juvenal Habyarimana, “organizar a defesa e o
funcionamento da instituição militar”.
- Em Março de 1992
é criado o “CDR”, (“Coalizão para a Defesa da República”), que haveria de
pautar a sua actuação com uma militância radical de direita, em nome do “Poder
Hutu”.
Nesse mesmo mês é
assinado um contrato Egípcio para o fornecimento ao Ruanda de material de
guerra , no valor de 6 milhões de USD sob cobertura do Banco Francês Crédit
Lyonnais.
A partir dessa data
e até 1993, a Firma Sul Africana “ARMSCOR” fornece ao Ruanda material de guerra
no valor anual de 86 milhões de USD não se sabendo em que divisas isso foi
pago.
- Em Agosto de 1992
registou-se um novo massacre de tutsis na região de Kibuye, perpetrado pelas
milícias.
- Em Outubro , o Senador
belga Kuypers denuncia o papel dos “esquadrões da morte” (os “redes Zero”) e a
política racista do regime de Habyarimana.
- Em Novembro de
1992 um proeminente activista hutu, o Dr. Léon Mugesera, apelou para que os
hutus enviassem os tutsis “de volta para a Etiópia” pelos rios e, a partir
dessa data, os apelos ao divórcio entre tutsis e hutus multiplicaram-se, de
ambos os lados.
Léon Mugeresa era
membro do Bureau Político do “MRND”.
Em Dezembro novos
massacres dos tutsis são feitos, desta vez na terra natal do Presidente Juvenal
Habyarimana, em Gisenyi.
- Em Janeiro de
1993 foi feita uma visita de activistas da Federação Internacional dos Direitos
Humanos que percorreu o Ruanda e encontrou provas da implicação de algumas
unidades francesas nos massacres.
Depois da denúncia,
após a saída dos membros da “FIDH”, novos massacres foram cometidos.
- Em Fevereiro de
1993 o “FPR” lançou uma nova ofensiva e as guerrilhas atingiram os arredores de
Kigali , pelo que o governo fez de novo apelo às tropas francesas, a fim de o
ajudar na resposta.
Os combates
continuaram por vários meses.
A França assumiu o
seu papel de aliado do regime em manifesta contraposição à expansão dos
interesses anglófonos à responsabilidade da Administração Democrata de Bill
Clinton na África Central.
- Em Março de 1993
o Conselho de Segurança da ONU toma a Resolução nº 812 visando colocar uma
força internacional de interposição entre os contendores, numa altura em que
foram retirados os reforços franceses chegados em Fevereiro e em que o “FPR” toma
as suas posições abandonadas.
- A 4 de Agosto de
1993 o Presidente Juvenal Habyarimana e o “FPR” assinaram um Acordo (o Acordo
de Arusha) que permitia o regresso dos refugiados ao país e a formação dum
governo de coalizão entre os hutus e o “FPR”.
Nesse quadro a ONU
enviou 2.500 capacetes azuis para o Ruanda, na tentativa de levar por diante a
sua implementação.
O Ministro dos
Negócios Estrangeiros francês, Alain Juppé, apoia oficialmente o Acordo.
- Apesar desse
Acordo o conhecimento dos preparativos para o início do holocausto genocida
generalizou-se a ponto do Rei Tutsi, Kigeli V, que vivia no exílio, enviar
cartas ao governo dos Estados Unidos e à ONU, alertando para os perigos que
espreitavam no horizonte político ruandês.
- O “FPR”, sem
conferir relevância ao discurso de Paz em função do Acordo de Arusha, reiniciou
a sua preparação para a guerra recebendo muito material dos ugandeses e
reiniciando a preparação das suas tropas em Karama, um centro político militar
existente na Prefeitura de Byumba.
O objectivo a
partir de então passou a ser a tomada absoluta do poder, com o derrube do
regime do Presidente Juvenal Habyarimana.
- De Setembro de
1993 a Março de 1994 o Presidente Juvenal Habyarimana mantém-se no poder e, ao
mesmo tempo que bloqueou o Acordo de Arusha de transição democrática, ordenou a
aceleração da formação e do treino das milícias “interahamwe”, fortaleceu os
sectores extremistas do “MRND”, ao mesmo tempo que emissoras extremistas, como
a famosa “Rádio Televisão das Mil Colinas” começavam a exortar o ataque aos
Tutsis.
Activistas dos
Direitos Humanos manifestaram nessa altura a sua apreensão sobre a possível
eclosão de calamidades no relacionamento entre as duas castas e muitos deles
evacuaram do país as suas próprias famílias.
- Durante esse
período crítico o governo de Juvenal Habyarimana comprou armas a um comerciante
de armas francês, Dominique Lemaunier, a fim de reequipar as suas forças, tendo
os pagamentos sido feitos pelo Ministro das Finanças de então , Marc Rugenera.
- Amigos e
emissários do “FPR” moveram influências junto do Presidente tanzaniano Hassan
Mwinyi, a fim de através dos seus bons ofícios pressionar os Presidentes do
Ruanda e do Burundi para implementarem o Acordo de Arusha.
Essa manobra
político-diplomática, (que reclamava a presença em Dar Es Salam dos dois
Presidentes e dos Chefes militares do Ruanda e do Burundi), visava obrigar os
dois Presidentes e a cúpula militar a movimentarem-se, a fim de preparar o
plano do seu assassinato, derrubando o avião Presidencial de Juvenal
Habyarimana quando ele regressasse dessa Conferência a Kigali.
Desse modo o início
da ofensiva do “FPR” encontraria pela frente uma resposta debilitada com a
decapitação da cúpula política e militar inimiga.
- O Presidente
Mobutu esteve para assistir a essa Conferência do Presidente Tanzaniano com os
Presidentes do Ruanda e do Burundi a pedido pessoal do Presidente Juvenal
Habyarimana que tentava assim encontrar apoios regionais para fazer frente às
iniciativas dos aliados do “FPR”, mas o Presidente Mobutu cancelou a sua
deslocação à última da hora, a pedido de seus assessores de segurança.
- Em Janeiro de
1994 uma das personalidades que visita discretamente Kigali, enviado pela
célula Africana do Elysée, é Paul Barril, um dos especialistas “TECHINT”ao
serviço do Elysée.
- Em Fevereiro de
1994, Gatabazi Felicien, Secretário Geral do “PSD” (“Partido Social Democrata”),
foi assassinado em Kugali por um comando do “FPR”, em retaliação ao facto de
ele se ter oposto ao plano do “FPR” de assassinar o Presidente Juvenal
Habtarimana e evitando que ele fizesse chegar ao então Presidente do Ruanda o
conhecimento dos riscos que sobre ele pendiam.
- Em resposta ao
assassinato de Gatabazi Felicien os militantes do “PSD” de Butare, na
ignorância das operações psicológicas do “FPR”, assassinaram em jeito de
retaliação Bucyana Martin, Presidente do “CDR” (“Coalizão para a Defesa da
República”).
- Em Março de 1994 chegaram
vários carregamentos de armas para distribuir pelo “interahamwe”provenientes
via aérea a partir do Egipto.
Nesse mesmo mês, o
então Tenente Coronel James Kabarehe levou pessoalmente para Kigali os mísseis
SAM-7 que seriam utilizados no derrube do avião Presidencial, entregando-os a
um comando de atiradores às ordens do Tenente Coronel Charles Kayonga.
Nessa altura ele
preparou toda a manobra ofensiva do “FPR” que se seguiria ao ataque.
- Ainda em Março de
1994, o “FPR” comprou 12 sistemas de artilharia pesada ao “UPDF”.
Essas armas foram
estacionadas antes do início das operações no Quartel-General do “RPF”, em
Mulindi.
- Pelas 20H25 de 6
de Abril de 1994 o Presidente Juvenal Habyarimana e o Presidente do Burundi,
Cyprien Ntaryamira, foram assassinados, num atentado com a utilização de
mísseis SAM-7 que derrubaram o avião Presidencial ruandês, à chegada ao
Aeroporto de Kigali.
O genocídio começou
na mesma noite. Nessa mesma noite, por seu turno, o “RPF” deu início ao
movimento ofensivo de suas tropas, até à tomada do poder pela força das armas.
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