Leston
Bandeira*, opinião
Muitos
estranharam que o primeiro ministro de Portugal, António Costa, tivesse
escolhido Cabo Verde para a sua primeira visita oficial. Na conclusão da mesma,
ficou claro que é o princípio da efectivação de uma estratégia, enunciada ao
longo da campanha eleitoral e perceptível nesta sua primeira movimentação com o
seu ministro dos negócios estrangeiros, Augusto Santos Silva.
A
Europa olha para África como um foco de grandes preocupações, presentes, mas
sobretudo, futuras. Portugal é, de entre os membros da União Europeia, um dos
Estados com mais profundas ligações a África e pode, por isso, desempenhar um
papel importante na tentativa de aliviar as tensões africanas.
É
conhecida a especial atenção que a Cidade da Praia dedica à política externa.
Não se pode esquecer que foi Cabo Verde que desenvolveu a estratégia
diplomática para terminar com a presença de tropas cubanas em Angola, para
garantir a Independência da Namíbia e, posteriormente, terminar com a guerra
entre Angola e a República da África do Sul. Esta viagem de António Costa é, no
fundo, o princípio de uma aliança interessante para ambos os países e que pode
estender-se a outros. Moçambique poderá mesmo ser o próximo passo táctico de
António Costa, a que juntará Janira Hopffer Almada ou Ulisses Correia da Silva.
Um
primeiro passo desta "aliança" pode vir a ser dado em relação à Guiné
Bissau, onde, de novo, se entrou numa crise política que pode dar maus
resultados e já fez andar para trás algumas das vitórias dadas como certas
ainda há pouco tempo: por exemplo ter deixado de ser um estado de nacrotráfico.
De resto os dois primeiros ministros manifestaram uma “profunda preocupação”
com o que se passa na Guiné Bissau, onde o Parlamento deixou de ter condições
para cumprir a sua missão e o governo tem a oposição do presidente da República.
Além
disso, a CPLP vai eleger, brevemente, o secretário executivo – numa altura em
que os “Cinco”, para além dos problemas internos de cada um têm, para
solucionar as questões levantadas com a adesão da Guiné Equatorial, cuja
ligação a Timor Leste também é um problema. Esta eleição foi, evidentemente,
discutida nos vários encontros.
Costa
juntou-se aos cabo-verdianos, em vésperas de eleições legislativas, comemorou
o” Dia dos Heróis”, assinalando o 43º aniversário do assassinato de Amilcar
Cabral, a que juntou, com o apoio das entidades cabo-verdianas, uma homenagem a
António Almeida Santos, falecido dois dias antes.
Um
homenagem a propósito, já que Almeida Santos foi o ministro que conduziu a
descolonização e a de Cabo Verde tinha um problema grave para resolver porque
Spínola entendia que o Arquipélago não devia ser independente mas ter um
estatuto semelhante ao da Madeira e Açores. Almeida Santos foi dos que mais
lutou para insistir no cumprimento total do programa do MFA: Cabo Verde devia
ser um país independente.
António
Costa encontrou-se com as mais altas individualidades da Cidade da Praia.
Esteve também se encontrou com os principais dirigentes partidários: Janira
Hopffer Almada, presidente do Partido Africano para a Independência de Cabo
Verde ( PAICV), candidata ao lugar de José Maria Neves, que deixou a
presidência do partido e é apontado como possível escolha do PAICV para as
eleições presidenciais, que também se irão disputar este ano, em data ainda
desconhecida.
Do
Movimento para a Democracia (MpD), partido do presidente Jorge Fonseca, esteve
com Ulisses Correia da Silva dirigente máximo e até há pouco presidente da
Câmara Municipal da Cidade da Praia, cargo de que se demitiu para ser
adversário de Janira nas eleições de 20 de Março.
Ulisses
evoca um certo paralelismo do seu percurso político com o de António Costa,
pelo sua condição de ex-autarca e Janira evoca o facto de o PAICV e o PS
fazerem parte de uma importante organização política: a Internacional Socialista.
Estas
circunstâncias não são de somenos importância para os objectivos de António
Costa, já que, antes de uma disputa eleitoral – que se adivinha renhida –
estabelece contactos com os possíveis vencedores. As propostas apresentadas
durante estes dois dias podem, portanto, ser enquadradas nas futuras projecções
governativas de Cabo Verde, quer com o PAICV, quer com o MPD.
No
final, ficou a proposta de que a CPLP se constitua num espaço de livre
circulação económica e de pessoas e o desenvolvimento de uma cooperação em
sectores específicos: energias renováveis, economia marítima e tecnologias de
inovação. No domínio da cultura, a colaboração na concretização do
Conservatório Nacional das Artes.
Um
política externa que busque o centro e fuja abertamente da periferia permitira
a António Costa ter uma outra voz no seio da União Europeia e esse reforço
conviria a toda a CPLP, sobretudo se houver a habilidade para solicitar a cada
um a contribuição que mais convém para fortalecer o grupo.
Esta
não foi apenas uma viagem de circunstância. Em quarenta anos deve mesmo ter
sido a viagem mais importante, do ponto de vista político, de um governante
português a Cabo Verde.
*África
Monitor
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