Rui
Sá – Jornal de Notícias, opinião
A
semana foi marcada pela decisão do Tribunal Constitucional sobre as pensões
vitalícias de ex-titulares de cargos políticos. Sobre isto li e ouvi muitos
comentários que, na verdade, têm o condão de se afastarem do fundamental.
Importa, assim, ver os factos e chamar os bois pelos nomes.
Em
primeiro lugar, a criação das subvenções vitalícias remonta a 1985, numa altura
em que o país era liderado pelo Bloco Central. Logo, os autores daquilo que
hoje se considera, e muito justamente, uma imoralidade, têm pai e mãe: o PS e o
PSD, que implementaram a medida com o apoio do CDS. Medida essa que contou com
a oposição do PCP. Isto são factos! Por isso, esta coisa de dizer que foram os
"políticos" mais não é do que uma forma de apaziguar a consciência por
parte dos que, tendo contribuído para a eleição de determinados políticos
concretos que criaram e aprovaram esta legislação, procuram sacudir a água do
capote das suas próprias responsabilidades.
Em
segundo lugar, e dentro da mesma linha de branquear a paternidade (e
maternidade) da legislação que criou as subvenções vitalícias, procura agora
atribuir-se a responsabilidade pela sua manutenção ao Tribunal Constitucional.
Naturalmente que podemos discordar das decisões do Tribunal Constitucional,
mas, em matéria tão técnica, convenhamos que a maior parte das pessoas que se
pronuncia mais não é do que "treinador de bancada". O Tribunal
Constitucional não se pronunciou sobre a existência, ou não, de subvenções
vitalícias. Pronunciou-se, isso sim, sobre um artigo concreto do Orçamento do
Estado que altera a essência dessas subvenções, que foram criadas como
"prémio" pelo exercício de funções públicas e, com alteração proposta
pelo Governo PSD/CDS, se transforma num regime de "assistência
social" a ex-políticos em "dificuldades económicas". Logo, a
culpa deste privilégio de ex-políticos não é do Tribunal Constitucional mas
sim, repito, de quem criou as subvenções vitalícias.
Em
terceiro lugar, a crítica aos deputados que solicitaram ao Tribunal
Constitucional a análise da constitucionalidade dessa norma, com o
"picante" de Maria de Belém, candidata presidencial, ser uma das
subscritoras. Em abstrato diria que sou a favor de que todos os cidadãos,
quando consideram os seus direitos atingidos, lutem pela sua defesa. Há, no
entanto, neste caso, um problema moral: o facto de os deputados que se
insurgiram contra este corte nos seus "direitos" não terem sentido a
mesma necessidade de recorrerem a esse mesmo Tribunal Constitucional para
analisar a constitucionalidade dos cortes nos "direitos" de
pensionistas bem mais penalizados do que eles e a viverem em condições
económicas e sociais muito mais difíceis. Com a agravante de os deputados do
PSD que o solicitaram terem aprovado esses mesmos cortes à generalidade dos
pensionistas...
Por
isso, nesta como em outras matérias, os bois têm nomes. E chamam-se deputados
do PSD, PS e CDS, por muito que isso custe a muitos dos seus eleitores que não
podem assobiar para o ar...
*Engenheiro
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