Rui Peralta,
Luanda
Está o emprego condenado a extinguir-se? A resposta a esta pergunta comporta
sentimentos e estados de alma diferenciados: por parte dos que vivem do seu
salário comporta um sentido de negação dessa realidade, mesclado com uma
angústia permanente causada pela incerteza; do lado dos que pagam salários
existem atitudes diferenciadas (da desconfiança ao optimismo absoluto, do medo
ao deslumbramento), conforme o nível em que se encontrem na escala.
Afirmar que a forma de redistribuição do capitalismo sob a forma de salário (e
que nas tentativas socialistas realizadas no século XX manteve posição,
inicialmente vista como resíduo, depois como fazendo parte do sistema, algo que
iria ser abolido quando as condições o permitissem) está em fase terminal,
devido á automação dos processos produtivos e da introdução das últimas
tecnologias nesses processos, é pura especulação. Termina o emprego, termina o
salário, termina a mão-de-obra proletarizada, tudo em função dos lucros
excepcionais criados pela generalização da automação integrada é uma crença que
começou a ganhar corpo prático nos anos 50, com a fragmentação de tarefas e que
ampliou-se nos finais dos anos 70 com o advento neoliberal.
As utopias capitalistas giram, hoje, em torno de dicotomias como emprego/novos
processos acumulativos, trabalho/aplicação tecnológica nos processos produtivos
e salário/novas formas de redistribuição. E por uma razão simples: emprego e
salário constituem dois alicerces sobre os quais assentou o capitalismo após a
Revolução Industrial e que se tonaram dominantes, generalizadas, na
economia-mundo. De uma forma geral, mas pouco objectiva, fala-se no fim do
emprego, em prestações de recursos, novas formas de distribuição dos
rendimentos, tudo provocado pela automação do sistema.
O saber e o conhecimento são revalorizados e vistos, simultaneamente, como
valores de uso e de troca mas, também, como um valor prático que alguns
consideram “omnitemporal”, produzido pelas descontinuidades e produtor de
descontinuidades. Quanto ao salário pretendem os novos gurus que seja “contributivo”,
distinto do salário universal, dominante até ao momento. Pretendem uma forma de
remuneração que se integre nas “descontinuidades”. Na aparência este “salário
contributivo” seria aproximado ao rendimento básico universal excepto no facto
de não ser incondicional, ou seja, não seria para todos.
Excluídos
ficariam os que não entram nestes processos sociais “personalidades frágeis”,
desprovidas das “capacidades” necessárias. A estes seria cedido um “salário
existencial” que garanta condições de sobrevivência elementar em alto nível de
precariedade. É o apartheid social a ser instalado como modelo único de vida, a
nova forma social adoptada pelo capitalismo nesta sua fase de alta rotatividade
de capitais e de desmesurada concentração de riqueza nas mãos das oligarquias.
Desta
forma, a nova visão “tecno” das variantes neoliberais, atira para o cemitério
os direitos sociais adquiridos através de séculos de luta. Os direitos
individuais dos trabalhadores e os seus direitos colectivos são transformados
em cadáveres, assim como as suas formas autónomas de organização. O direito á
greve passa a ser tema do combate ao terrorismo e o processo de democratização
do ensino é transformado numa cadeia automatizada de produção de mão-de-obra
qualificada, de baixo-custo e formatada para a obediência.
Esquecem-se,
estes gurus baratos das utopias capitalistas, que há uma humanidade que
desbrava caminhos através da aplicação dos seus conhecimentos e saberes, das
suas capacidades e dos seus sonhos, da sua força braçal e criativa,
socializando e humanizando o Trabalho, não como factor de exploração, mas de
libertação.
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