Na
abertura da III Sessão Extraordinária do Comité Central da FRELIMO, Presidente
moçambicano diz que partido não pode ser plataforma para atingir fins pessoais.
XI Congresso da FRELIMO é um dos temas em debate.
O
encontro começou esta sexta-feira (07.10.) e termina no sabádo (08.10.). Os
membros da Frente para a Libertação de Moçambique (FRELIMO), partido no
poder, discutem na cidade da Matola vários temas, entre eles a realização do
seu XI Congresso, as próximas eleições e a disciplina partidária. Sobre o
Comité Central extraordinário, a DW África entrevistou o analista
moçambicano Severino Ngoenha:
DW
África: É mera coincidência que a III Sessão Extraordinária da FRELIMO aconteça
num momento crítico em termos económicos e políticos?
Severino
Ngoenha (SN): A gente só faz coisas extraordinárias quando os momentos também
são extraordinários. O extraordinário pode ser positivamente, mas normalmente é
negativo. Em Moçambique passamos por um momento extraordinariamente negativo e
é preciso que aqueles que por função, os partidos políticos, governantes, etc,
tomem a sério as medidas que se impõem para trazer o país e o povo a uma certa
normalidade. Primeira coisa é que no dia 4 de outubro celebramos a paz, mas
estamos em guerra. A guerra cria uma desestabilização ao nível humano. A
juntar-se a isto temos uma falta de clareza, o Parlamento está a funcionar com
bancadas que tentam impor a sua posição, mesmo quando estão erradas. Há
problemas não resolvidos, como a questão das dívidas ocultas, que a própria comunidade
internacional entrou e que faz com que praticamente não haja a ajuda que temos
tido. E isso encarece o custo de vida. E isso leva a greves, ao
descontentamento nacional e a uma situação de tensão que é patente no cotidiano
dos moçambicanos. Faz com que o país passe por situações
catastróficas que precisam de soluções. E o comité central é convocado para
colmatar situações extraordinárias que nós vivemos.
DW
África: No seu discurso de abertura o Presidente Filipe Nyusi destacou que a
FRELIMO não pode ser encarada como uma plataforma de acesso ao poder para
atingir fins pessoais ou de grupos. Sabendo que as elites deste partido dominam
o mundo dos negócios, e até uns entram em conflitos, se pode entender
a mensagem do líder do partido como uma chamada de atenção às tais elites?
SN: Mais
do que uma chamada de atenção, revela o que é a política moçambicana desde que
passamos do monopartidarismo ao multipartidarismo. Em Moçambique não tínhamos
dinheiro para todos aqueles que eram membros da FRELIMO até o momento dos
Acordos de Paz e, de um dia para o outro, tornaram-se banqueiros,
acionistas, etc. A gente não vai para a FRELIMO por uma ideologia, porque já
não há ideologia, ou por convicções, porque não há convicções, mas porque a
FRELIMO é provedora de oportunidades. Quem entra na FRELIMO sabe que pode ter
com os camaradas mais oportunidades, isso quer dizer fazer riqueza. Mais do que
chamada de atenção, a denúncia popular, a crítica pública e da sociedade civil
tentam desconstruir essa amálgama que se criou. Mas essa autocrítica antes de
ser feita aos outros tem de ser feita aos que governam, e o Presidente
Nyusi faz parte dos que governam, faz parte daqueles que provavelmente se
beneficiaram desse trampolim política-economia. Ora, sair disso é necessário,
mas vai ser um trabalho de anos.
DW
África: Um dos objetivos desta III Sessão Extraordinária é preparar o XI
Congresso da FRELIMO. O Presidente Nyusi disse no seu discurso que é preciso
renovar a confiança da sociedade no partido como força motriz da agenda
nacional, e construção do bem estar de Moçambique e dos moçambicanos. Tomando
em conta esse historial que acabou de citar é possível reconquistar essa
confiança?
SN: Acho
que o problema não é reconquistar a confiança. O povo perdeu a confiança na
FRELIMO, mas infelizmente não é [só] a FRELIMO que perdeu a confiança, é a
política toda que vai perdendo confiança. E a FRELIMO contribuiu muito,
contribuiu a RENAMO, contribuiu muito a comunidade internacional, porque certas
atitudes mostram que os nossos governantes não servem nada, porque quem governa
é Washington, Nova Iorque e outras capitais ocidentais. Dentro da FRELIMO há
frações, o próximo congresso não é para tentar encontrar remédios para
pequenas feridas, é para tentar ver o que a FRELIMO tem de ser na conjuntura
nacional. Se eles forem honestos e fizerem um congresso sério, aquilo vai
ser partir pratos. E se for necessário, talvez até vai-se sair dali
não com uma FRELIMO, mas com muitas FRELIMOS.
Nádia
Issufo – Deutsche Welle
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