Excelentíssimos
Senhores. Queiram aceitar os meus melhores cumprimentos. No âmbito das
competências que me são atribuídas pelo estatuto de cidadã deste país, onde
tenho residência fiscal, venho por este meio convidar os responsáveis do sector
energético a passarem uma noite no povoado.
Luísa
Rogério – Rede Angola, opinião
Excelentíssimos
Senhores. Queiram aceitar os meus melhores cumprimentos. No âmbito das
competências que me são atribuídas pelo estatuto de cidadã deste país, onde
tenho residência fiscal, venho por este meio convidar os responsáveis do sector
energético a passarem uma noite no povoado. Face aos objectivos da convivência
proposta a estadia pode prolongar-se até ao anoitecer do dia seguinte. Desse
modo, as entidades do supracitado sector terão a soberana oportunidade de
constatar “in loco” quão desestruturante pode ser uma noite. Travar inglórios
combates contra mosquitos ao som do estrondoso ruído de poluentes geradores
conforma só um detalhe da jornada plena de sensações.
Embora
não se enquadre no objectivo primordial do convite, as entidades terão a possibilidade
de ver incontáveis viveiros do minúsculo ser que contribui sobremaneira para
elevar os índices de mortalidade em África. Involuntariamente os habitantes do
povoado têm contribuído para a reprodução em grande escala de mosquitos, esses
abomináveis insectos responsáveis por milhões de vidas perdidas. Devido à
escassez de água o precioso líquido é armazenado em todos os recipientes e mais
alguns nos santos dias em que jorra nas nossas torneiras. Fora disso o
abastecimento regular tem sido garantido pelos oportunos kupapatas que também
chamamos “Avô Chegou”. Portanto, somos movidos pela elementar necessidade de
sobrevivência quando descuramos o cumprimento de algumas recomendações das
autoridades com vista a diminuir a proliferação de mosquitos.
De
volta ao principal assunto que motivou esta carta-convite, encorajo as chefias
a providenciarem repelentes para afugentar os execráveis voadores. Por mais que
apele a vossa solidariedade jamais me perdoaria se contraíssem alguma doença
comum em comunidades pobres. Infelizmente não garanto nenhum paliativo contra o
calor. A única saída é a pessoa manter-se quieta. E derreter tranquilamente.
Apesar de cansativo, recorrer ao velho abano pode ser um exercício salutar para
tonificar os braços. Menos mal. Como todo o episódio negativo carrega a
componente exótica, recomendo não se esquecerem de trazer smartphones, tablets
e demais dispositivos apropriados para registarem com rigor os tormentos de uma
noite sem energia eléctrica.
Estou
convicta de que se vão sensibilizar quando ouvirem os nossos filhos a pedirem
para abanarmos mais fortemente contra o calor. O inocente sorriso que acompanha
a bem disposta saudação matinal ameniza o sentimento de derrota na luta contra
os mosquitos. Chega a hora em que, vencida pela exaustão ofereço também o meu
sangue aos vampiros em versão quase microscópica, rogando aos céus para não
terem plantado a praga da malária. Queiram tranquilizar-se entidades, vou
evitar conversas do género levar crianças ao hospital porque esse não é o vosso
pelouro e eu própria perdi arcabouço mental para aumentar o grau de depressão.
Caríssimos
responsáveis, caso pretendam apresentar-se bem ataviados depois da jornada
devem trazer roupas bem engomadas. O famoso ferro à gaz, como convencionamos
designar o processo de aquecer o ferro no fogão para alisar o vestuário, tanto
quanto o engenhoso método da panela passadeira comporta custos adicionais. O
gaz também está caro. Além disso, quase ninguém se importa quando vê gente com
vestes meio amarrotadas. Aproveito a ocasião para informar que comprei pilhas
extras para lerem, sob as luzes das lanternas compradas na cantina do amigo
Mamadú, os projectos que prometem a resolução quase total dos problemas do
sector até 2017. Por sinal, este ano eleitoral. Preferi não ligar ao recorte de
Jornal que prometia melhorias substanciais em 2012. A matéria foi publicada na
véspera de ano eleitoral.
Sem
prejuízo do clima de hospitalidade exorto os camaradas responsáveis do sector a
jantarem antes da visita ou a trazerem os respectivos farnéis porque já não
temos frescos em casa. Os produtos armazenados na arca que serviriam para
cobrir parcialmente as necessidades do mês foram para o lixo. Num determinado
dia comeu-se à grande e à francesa cá em casa. Faltou pouco para ultrapassarmos
o limite entre a tentativa de evitar o desperdício e a congestão. Esforço em
vão. O estomago humano é desprovido da capacidade de conservar alimentos. E o
calor acelerou a rápida deterioração de bens tão duramente alcançados.
Inumeráveis
aspectos caberiam nesta longa exposição. Poupo-vos de detalhes cansativos
porque vão constatar a realidade no terreno. Deveria simplificar a questão
resumindo-a em dois ou três parágrafos. Certamente vão notar a linguagem
recheada de lugares comuns. Espero que compreendam. Noites mal dormidas
provocam confusão mental, cansaço físico e desgaste psicológico.
Com
consumo baixo ou moderado o valor da factura aumenta. Sou sensível aos alegados
esforços com vista a resolução de problemas básicos da população. Ainda que
empregue dinheiro a comprar um eventual companheiro do projecto de carcaça que
enfeita o meu quintal, não abdico dos meus direitos. Pago as minhas contas.
Tenho legitimidade para buscar o equilíbrio entre direitos e deveres. Não me
venham dizer que seria mais prático deixar de lamuriar, comprar um novo gerador
e ser boa patriota. Geradores custam dinheiro. Precisam de manutenção.
Alimentam-se de combustível e não de energia solar. O uso continuado provoca
danos irreversíveis a saúde humana. Por hoje, dia tórrido de Março fico por
aqui.
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