domingo, 8 de janeiro de 2023

A HONRA PELAS RUAS DA AMARGURA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A liberdade de expressão em Angola é tão evidente como os abusos feitos em seu nome e que violam gravemente direitos de personalidade constitucionalmente protegidos. Mas se é importante que todos possam expressar livremente o que pensam, também é péssimo que o regime democrático seja posto em causa. E isso acontece claramente quando alguém atenta contra a honra e o bom-nome de pessoas e instituições através dos meios de comunicação social.

O jornalismo não pode servir de capa a graves crimes contra o Direito à Inviolabilidade Pessoal, na sua projecção física (direito à imagem e à palavra escrita e falada), moral (direito à honra e ao bom-nome) e vital (esfera privada, esfera pessoal, segredo e história pessoal). É aqui que radicam todos os conflitos entre a liberdade de expressão e o Direito à Inviolabilidade Pessoal.

O Poder Judicial é chamado a agir sem qualquer concessão nem vacilação face aos chamados crimes de abuso de liberdade de imprensa. Isso não acontece. E quando os abusos vão a Tribunal, factos gravíssimos que violam direitos constitucionalmente protegidos são castigados com bagatelas penais. Está tudo feito para que a honra valha quase nada ou nada. Depois admiram-se que corrupção tenha tantos clientes e praticantes. É preciso agir contra os criminosos que abusam da liberdade de imprensa.

Não estou a defender a repressão pela repressão e muito menos a compressão de direitos e liberdades. Apenas defendo que os poderes instituídos não permitam que a comunicação social seja palco de crimes graves contra o jornalismo. Mais uma vez afirmo que quando os jornalistas cometem crimes de abuso de liberdade de imprensa estão a cometer, antes do mais, crimes contra o jornalismo. E qualquer crime contra o jornalismo tem sérias consequências negativas no regime democrático.

 Por isso, os democratas de todos os quadrantes têm o dever cívico de condenar, sem subterfúgios nem eufemismos, todos os abusos cometidos pelos jornalistas através da Imprensa. É isso que se passa em Angola? Longe, muito longe disso. Antros como o Maka Angola ou Club K são autênticos exterminadores de honras alheias. Fazem da especulação e da mentira o seu modo de vida. Porque nada lhes acontece. Pelo contrário, os donos, bem alojados no poder, protegem os seus agentes e até os condecoram, mesmo quando eles são as vítimas dos crimes. O masoquismo também anda à solta.

Vejo num jornal privado este título sugestivo sobre Angola: “Meio século de governos incapazes e criminosos”. Outro diz que “O estado Angolano Está no bolso da Odebrecht”. Um terceiro anuncia a morte do músico Justino Handanga porque “a notícia está a correr nas redes sociais”. O mesmo pasquim diz que afinal o músico está vivo e até fez chegar uma foto com dois amigos.

Todos temos direito à opinião e todos somos livres de exprimir as nossas opiniões. Mas não há liberdades ilimitadas nem direitos absolutos. Qualquer estagiário de jornalismo sabe isto, nos primeiros dias em que entra numa Redacção. Por isso, é com enorme perplexidade que assisto a uma espécie de jogos florais, quando instituições com grandes responsabilidades na regulação da actividade jornalística em Angola se pronunciam sobre evidentíssimos e repugnantes crimes de abuso de liberdade de imprensa. 

Uma carteira profissional de jornalista é uma licença para assassinar honras e o bom-nome a que todos têm direito. E ai de quem proteste ou recorra aos Tribunais. Aparece logo um qualquer bêbado da valeta atrelado ao órgão de regulação, dizendo que está em causa a liberdade de imprensa. A propósito já se sabe alguma coisa sobre os “assaltos” ao Sindicato dos Jornalistas? O senhor Teixeira Cândido já apresentou provas das gravíssimas acusações que fez? Tanto barulho e agora um silêncio ensurdecedor. Estava tudo combinado para a entrevista à rádio da CIA?

 Pessoas e instituições responsáveis afunilam o debate sobre a liberdade de imprensa e limitam-se a ver a árvore, ignorando olimpicamente a floresta. Isto para não falar de um truque pouco menos do que desprezível quando se atacam órgãos de comunicação social públicos, por veicularem opiniões que não agradam aos donos da verdade. 

Uma opinião crítica sobre os crimes de abuso de liberdade de imprensa publicada nos Media públicos é catalogada como uma “campanha” contra os abusadores. Mas a opinião veiculada em órgãos privados em apoio aos abusadores e ladrões da honra de pessoas e instituições é absolutamente legítima e elogiada.

O Chefe de Estado é tratado de uma forma insultuosa em alguns Media privados, que a maior parte das vezes recorrem a “comentários” publicados nas redes sociais. Membros do Executivo levam pela mesma medida. Empresários que não alinham em extorsões e chantagens são esfrangalhados na praça pública. Cidadãos a contas com a Justiça mas que nunca foram condenados ou as sentenças não transitaram em julgado, são apresentados como criminosos, seguindo o exemplo do ainda Procurador-Geral da República, Hélder Pita Grós. Nem um comentário das autoridades titulares de investigação e acção penal. Está tudo bem!

O que está em causa é muito simplesmente uma sucessão de crimes de abuso de liberdade de imprensa, quase sempre protagonizados por um qualquer Rafael Marques que é pago para fazer esse papel a mando de instituições bem conhecidas e por isso mesmo condecorado pelo Presidente da República. 

Arregimentam “jornalistas” com agendas políticas ocultas ou jovens ambiciosos que querem fazer do jornalismo um elevador rápido para ganharem fama e algum (pouco) proveito. Através deles lançam ataques repugnantes contra o MPLA e os seus dirigentes.

Vejo com alguma preocupação jovens jornalistas em início de carreira serem convidados por certas embaixadas, para se deslocarem aos países ocidentais onde estão instaladas as centrais de intoxicação contra Angola. Lá aprendem as verdades deles, são colocados perante “investigações” feitas por eles e depois lançam os cães ao nosso país. 

Ainda não perceberam que esta aventura acaba sempre mal. A mais terrível acabou tragicamente no Lucusse. Depois veio a paz de Luena, mas pelos vistos a lição não foi suficiente. É lamentável que países com quem Angola tem parcerias estratégicas sejam depósitos de tanto lixo a céu aberto que depois ventilam na comunicação social.  

*Jornalista

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