segunda-feira, 16 de outubro de 2023

OS JUDEUS ESQUECIDOS DE ANGOLA - Mito e Realidade da Herança Sefardita

JAIME AZULAY*

Em 2 de Maio de 2013 realizou-se em Cabo Verde, no cemitério da Várzea, a cerimónia de descerramento da placa de dez campas judaicas restauradas com a colaboração da Câmara Municipal da Praia e do governo daquele país africano. De acordo com o jornal “Expresso das Ilhas”, autoridades cabo-verdianas, membros da comunidade judaica internacional e descendentes cabo-verdianos presenciaram o acto. 

A recuperação do cemitério judaico da Várzea assinalou a passagem de mais de 150 anos da chegada dos primeiros judeus sefarditas a Cabo Verde. Pretendeu-se assim preservar a sua memória e honrar a contribuição que prestaram ao desenvolvimento do arquipélago.

Um dos benfeitores do Projecto de Preservação da Herança Judaica em Cabo Verde é o rei Mohamed VI de Marrocos, que se fez representar no evento pelo seu conselheiro sénior André Azoulay. Temos assim a situação insólita de “um monarca muçulmano a contribuir para um projecto judaico num país cristão”. 

No mesmo âmbito estão previstas pesquisas e trabalhos de investigação com instituições universitárias locais bem como um simpósio internacional em 2015 com a participação de pesquisadores africanos, da Europa e dos Estados Unidos da América. Para além do interesse científico, Cabo Verde terá ganhos com o fluxo anual de mais turistas interessados em conhecer a herança judaica naquele país africano.

Há dois mil anos, judeus presos e escravos dos romanos chegaram a “Sefarad” na Espanha, de onde viriam a ser expulsos em 1490 e assim passaram a chamar-se “sefarditas”. Judeus Sefarditas, oriundos de Marrocos e Gibraltar chegaram a Cabo Verde em meados do século XIX após a abolição da escravatura e de um acordo entre Portugal e a Inglaterra. Eles dedicaram-se predominantemente ao comércio internacional, à navegação e à administração pública. Entretanto, foi assinalada uma presença anterior ao século XIX que é, no entanto difícil de documentar, pois eram judeus convertidos ao cristianismo, os chamados “cristãos novos”, como sustenta a pesquisadora Carol Castiel que lidera o projecto de Preservação da Herança Judaica em Cabo Verde.

A presença contínua de judeus  sefarditas na costa oeste da África continental no século XIX  estendeu-se a partir de pontos intermédios localizados nos arquipélagos dos Açores, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe em direcção às antigas colónias de Angola ( com entrepostos ou filiais comerciais em Banana e Goma, (actual RDC) e Moçambique, atraídos por uma florescente actividade mercantil que lhes permitia, com os seus conhecimentos e aptidões, rapidamente  obter fontes de sustento longe dos seus países de origem onde eram alvo de  perseguição.

Ao longo dos séculos XVI-XVIII já pululavam pelo actual território de Angola os chamados cristãos-novos misturados com os traficantes, contratadores e armadores envolvidos no tráfico negreiro Atlântico como referem vários autores. Em 1492, entre 120 a 150 mil judeus espanhóis foram expulsos pelos reis católicos (Isabel a Sangrenta)  para Portugal, onde se juntaram aos 100 mil judeus portugueses, numa altura em que Portugal tinha um milhão de habitantes (www.comunidadesdeisrael.com.br, acessado em Novembro de 2013). 

 Pressionado pela vizinha Espanha, o rei de Portugal ordenou por Decreto a conversão em massa de judeus que, não tendo outro local para onde ir  aderiram ao catolicismo, formando os “cristão novos”. Segundo a pesquisadora brasileira Anita Novinsky num trabalho sobre o passado judaico no Brasil (Os cristãos Novos da Baía, Editora Perspectiva, 1972) a conversão à força dos cristãos novos, o ou injuriosamente designados por marranos por não comerem carne de porco, não correspondeu aos padrões do chamado cripto-judaísmo, conformado numa prática sincrética de cristianismo e judaísmo (oculto) utilizada posteriormente pelos judeus brasileiros.

Por não ter sido registada, ao contrário do que acontecia noutras colónias, a saga em Angola é considerada pouco visível se comparada à dimensão registada em outras áreas geográficas da diáspora judaica, como refere Aida Freudenthal, colaboradora do Centro de Estudos Africanos e Asiáticos do Instituto de Investigação Científica Tropical no livro “Judeus em Angola-séculos XIX e XX”. Pela sua incontornável referencialidade a ela recorreremos sistematicamente ao longo da nossa abordagem, bem como à indispensável “Enciclopédia Judaica, Jerusalém, 1971” editada por Cecil Roth e G. Wigoder,  “Os judeus em Moçambique, Angola e Cabo Verde, Lisboa, 1975” de Alberto Iria e ainda  “Survival and adaptacion. The portuguese jewish diaspora in Europe, África and the new world, New-York, 2002” de Joseph Levi  entre outros que citaremos no final.


EM BUSCA DA PROLE SEFARDITA

Há cerca de 20 anos assumi a responsabilidade de abordar a questão dos judeus de Angola, a pedido de uma fundação hebraica brasileira que me contactou através da estação de rádio LAC.  Falei com o escritor Raul David, a quem expus as linhas do meu projecto. Raul aceitou trabalhar comigo. Na altura, o veterano escritor angolano que eu escolhera como parceiro  contava mais de 80 anos. No entanto, gozava de uma saúde juvenil e era privilegiado com uma memória de elefante. Ele conhecera pessoalmente muitos judeus espalhados por Angola desde as primeiras décadas do século XX. Eram esses homens o nosso alvo e a quem iríamos seguir o rasto até aos seus descendentes.

Sabia-se de antemão que, com a necessidade de integração social, foi frequente  a união entre judeus sefarditas e “filhas da terra” o que tinha dado origem a agregados familiares com  numerosa prole mestiça. A proveniência urbana dos sefarditas marroquinos ou gibraltinos tê-los-ia imunizado contra as teses racistas (Aida Freudental, idem) o que provavelmente na prática terá facilitado esses relacionamentos. Contudo, punha-se a questão de os cânones hebraicos não considerarem judeus os filhos nascidos de uniões mistas, quaisquer que sejam. A tradição normativa religiosa do hebraísmo, a Halachá (Lei tradicional da Torá) define que uma pessoa nascida de mãe judia é um judeu (www.chabas.org.br acessado em 30 de Janeiro de 2014) qualquer que seja a sua cor ou nacionalidade. Um não-judeu pode converter-se somente de acordo com as condições haláchicas e a aceitação de todos os mandamentos da Torá. De acordo com tais critérios, os casamentos mistos e a assimilação afastam o povo judeu das suas raízes. Para a Torá, todo o judeu tem valor intrínseco e é um componente essencial do povo judeu, sem o qual a nação inteira não pode realizar o seu pleno potencial” (idem). Todavia, contrariando as considerações “haláchicas” são considerados factores seculares, políticos e identificações ancestrais que definem quem é judeu de forma mais abrangente. Deixamos a questão em aberto.

A procura de traços identitários de uma possível comunidade de descendentes judeus em Angola chegou a interessar também à Dra. Tamar Golan que ocupou o cargo de primeira embaixadora plenipotenciária de Israel em Luanda entre 1995 a 2001. Ela ficaria em Angola até 2003. Tamar tinha projectos culturais interessantes que não chegaram a concretizar-se. Em diversas momentos  procurou encontrar os descendentes dos judeus sefarditas de Angola. Chegou a convidar-me para algumas celebrações judaicas em Luanda. Lembro-me de na única ocasião em que por lá apareci, ter visto pessoas conhecidas de famílias angolanas descendentes. Quando faleceu a minha  tia  Isabel Azulay, a embaixadora enviou-me uma fraterna mensagem de condolências. Contudo, tudo ficaria por ali. Tamar Golan viria a falecer no dia 30 de Março de 2011.

Com o escritor Raul David tínhamos garantido um filão para explorar com o qual sustentaríamos  as conclusões da pesquisa. Entretanto, observa-se o  recrudescer da guerra em Angola ao longo de toda a década de 90. Pouco tempo mais tarde o inesperado acontece:  Raul David morreu em Benguela. O duro golpe e a situação de beligerância armada vigente no país  levar-me-ia a arquivar o projecto por absoluta falta de motivação. Receava pela integridade de um dos poucos testemunhos materiais indispensáveis a qualquer pesquisa sobre o assunto. Os  vestígios dos túmulos judeus no cemitério de Benguela corriam o risco de desaparecer ou serem profanados, conforme várias pessoas alertavam.

Tal como eu tinha inicialmente projectado com Raul David, o desafio consistia em investigar a saga de umas dezenas de judeus sefarditas que chegaram dispersos às então colónias portuguesas de Cabo Verde, Moçambique e Angola no regurgitar da actividade comercial no século XIX. Depois disso, os judeus da África Ocidental ou os seus descendentes ficaram esquecidos durante mais de um século. Sabia-se, isso sim, que tinham constituído famílias angolanas não só em Luanda e Benguela mas também no sertão, como na vila de Longonjo, onde por volta de 1930 os irmãos Benoliel instalaram uma  cerâmica e com uma relativa prosperidade ficaram muito  conhecidos em toda a região centro. Até hoje lá se encontram bem visíveis  as ruinas da fábrica.

Aida Freudenthal considerou prematuro definir uma identidade judaica sefardita em Angola, em razão da sua condição de minoria dispersa na vastidão do território. Os judeus acolhidos pela sociedade  colonial nos séculos XIX e XX não tiveram a possibilidade de constituir uma comunidade coesa arreigada numa identidade própria, capaz de preservar os factores aglutinadores comuns que os judeus mantiveram noutras áreas geográficas da sua conturbada diáspora.

Para a pesquisadora angolana (foi professora do ensino secundário em Angola) os dados até agora reunidos não permitem a elaboração do seu  perfil sociológico, nem a sua identificação em judeus ricos e pobres, de assimilados, liberais e ortodoxos. Contudo,   tratando-se de indivíduos provenientes da região africana do Magrebe com uma vivência cultural resultante da estrutura social judaico-marroquina “não é absurdo supor que partilhavam uma História e uma Cultura comuns”.

Aida Freudenthal aludia para além da religião, à peculiar forma como os judeus se alimentam, se vestem, as suas músicas e u uso do dialecto haquitia que integrava elementos do hebraico, espanhol e árabe, para além das línguas inglesa e francesa que dominavam em função das suas proveniências. Muitos tinham a cidadania inglesa obtida em Gibraltar ou portuguesa concedida por mercê régia. Ao longo do séc. XIX (J. M. Abecassis, Genealogia Hebraica, Portugal e Gibraltar, Lisboa, 1990).

Portanto, não existem evidências em Angola de práticas religiosas comuns entre os judeus sefarditas (vide Aida, ibidem, pág 257). Quanto a nós, parece-nos que o facto se explica devido ao reduzido número de membros. Havia  dificuldade em conseguir reunir o núcleo designado por myniam que é constituído por um mínimo de 10  homens, indispensável nas práticas litúrgicas.

Aida Freudenthal sustenta que o declínio do comércio na colónia de Angola, com a crise de 1929 devido à redução das transações afectou muitas firmas comerciais, o que poderá ter motivado em parte o retorno de vários comerciantes sefarditas cujos negócios tinham ramificações em vários países da europa. O declínio do comércio colonial trouxe alterações profundas que provocaram a diminuição da comunidade sefardita e a consequente  integração dos seus descendentes na sociedade colonial. Para os que ficaram “assimilar era a palavra de ordem, daí ter sido um facto a aculturação dos judeus sefarditas” concluiu a pesquisadora.

A questão que emerge até  hoje é descobrir quantos são e em que localidades se encontram a viver os descendentes dos emigrantes oriundos do Magrebe africano e da Europa que se quedaram por Angola mesmo depois da crise de 1929. De certeza que não se tinham pura e simplesmente eclipsado, daí existir uma grande curiosidade perante certas dúvidas. Seria que ainda viviam em Angola? Com que matrizes se caracterizavam? Manteriam em comunidade os traços  da milenar religiosidade e cultura judaicas ou se tinham simplesmente convertido ao cristianismo como acontecera com os marranos (cristãos novos)? Ou ainda seria que tinham diluído as suas manifestações ancestrais nas práticas sincréticas dos cultos africanos?

Havia também a considerar a delicada questão de saber se os angolanos detentores de ascendência judaica estariam na disposição de aceitarem em público o facto de serem eles, também, judeus descendentes? Após a independência de Angola em 11 de Novembro de 1975, muitos deles tinham conseguido ascender a lugares de destaque na hierarquia do poder. Outros se tinham integrado nas forças armadas e tinham lutado nas guerras angolanas sem que alguém os tivesse impedido, um dia sequer, de lutarem pela sua pátria pelo facto de terem a correr nas suas veias resquícios de sangue judeu e, por ignorância ou má-fé muitos confundem isso com a política do Estado de Israel na luta contra os árabes e palestinos em particular. 

Actualmente, na sua totalidade, estes indivíduos encontram-se profundamente inseridos na matriz sócio-cultural angolana. São detentores das inerentes qualidades de nacionalidade e cidadania como os demais. Para muitos deles talvez não haja interesse em exporem as suas raízes judaicas. Preferirão, provavelmente evitar mal-entendidos e a eventualidade da acção nefasta de maldizentes adeptos do politicamente correcto arreigados aos seus atávicos preconceitos anti-semitas.

JACQUES ATTALI E O FRASCO DE ENXOFRE

Eis que novamente tenho em mãos o assunto dos judeus em Angola após o mesmo ter hibernado por longo tempo no baú do esquecimento. Não obstante os anos o tabu permanece. Não restam dúvidas que se trata de abordagem complexa e provavelmente polémica por eventuais conexões que se lhes podem aduzir.

Experimento a mesma sensação que arrasou Henry Sobel quando  escreveu o prefácio da edição brasileira de um livro fascinante e perturbador de Jacques Attali que analisa de forma brilhante e extensa  as possíveis razões históricas, sociais e teológicas que permitiram que os judeus se catapultassem para o domínio das finanças internacionais, municiando em contraponto, o tradicional leque de inimigos e detractores anti-semitas que vão desde os cristãos que acusaram os judeus de “terem sugado o sangue de Cristo” até o acicatar das versões mais perversas do fundamentalismo Islâmico.

Jacques Attali era um judeu francês de ascendência argelina, um  Guru em matéria de banca e finanças. Funcionou no Eliseu como conselheiro especial do presidente François Miterrand durante dez anos, na década de 80. Actuamente é um dos intelectuais mais respeitados no seu país, a França. Publicou dezenas de obras  literárias, entre as quais o polémico “ Les juifs, le monde et lárgent” publicado no Brasil em 2011 pela Editora Saraiva com tradução literal do sugestivo título original: “Os judeus, o dinheiro e o mundo”.

No prefácio, Henry I. Sobel que é o  presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista disse, num sincero assomo de desencanto e  perplexidade:  “preferia que tal obra jamais tivesse sido escrita”. E por ali não ficou. Não suportou o irreprimível  melindre pelo facto de J. Attali, o autor,  ter esmiuçado a relação “supostamente obsessiva”  entre os judeus e o dinheiro desde tempos remotos. “Não entendo - frisou o rabino - porque uma pessoa esclarecida queira retomar o assunto logo agora, numa época em que o anti-semitismo dá sérios sinais de recrudescimento no mundo inteiro”.

 O único conforto nas palavras escritas pelo rabino de São Paulo é que o autor, já na etapa final do livro, por intermédio de novas interpretações de factos já conhecidos, conseguiu comprovar a salvadora tese, segundo a qual  o propalado apego dos judeus ao dinheiro não resultou de uma “opção”, mas sim de uma “imposição” de factores circunstanciais. É consequência dos seculares exílios, das perseguições e da dispersão desde as viagens dos patriarcas com a peregrinação pelo deserto do Sinai a caminho da Terra Prometida. Resultou destas circunstâncias que  “o dinheiro foi o único bem portátil dos judeus e o seu privilegiado instrumento de sobrevivência”.

De facto, tal como sucedera com Henry Sobel, a bola viria  a sobrar irremediavelmente para mim, desde o momento em que o jornalista Itamar Souza publicou na edição de Julho de 2013 da revista “África 21” um artigo com o título “Judeus, o destino passou por Benguela” no qual  alude a um  projecto de instalação de uma colónia de 600 mil   judeus  em Angola, empreitada  sonhada por um grupo de intelectuais judeus, entre os quais Alfredo Bensaúde, Jacob Teitel, Wolf Terló e Israel Zangwill, isso no início do século XX.  No entanto, os 159 colonatos previstos nunca chegariam a ser instalado nas terras férteis vale do Cavaco, no litoral de Benguela, onde “não existiam  árabes palestinianos” (www.fmsoares.pt/aeb/crono/id?id=01855 acessado em 15/05/2013). 

A verdade, porém, é que nunca se viria a  verificar uma migração em massa de judeus  da Europa e do Norte de África, rumo à colónia portuguesa de Angola, com o fito de ali se instalarem, conforme  pretenderam Alfredo Bensaúde e seus pares.

As gerações de angolanos que existem actualmente com sangue judaico descendem dos judeus sefarditas que chegaram esparsamente a Angola na segunda metade do século XIX. Aida Freudenthal menciona uma reduzida  lista com os nomes de famílias entre as quais despontam Amzalak,   Ashai, Azulay, Bendrao, Benchimol, Benoliel e Cohen. Estes foram judeus que nada tinham a ver com os planos de Israel Zangwil e Alfredo Bensaúde.

Individualmente ou em pequenos grupos familiares aqueles  se foram estabelecendo progressivamente entre Benguela e Luanda, factos aliás, já referenciados por Aida Fredenthal no livro “Judeus em Angola-séculos XIX-XX” que vimos referindo amiúde e no qual  é analisada a diáspora sefardita na mais importante colónia lusitana de África.

 Não estão descuradas interpretações grosseiras nem o evoluir de premeditados preconceitos de que seja intenção do autor reconstituir árvores genealógicas com potencial suficiente para fazer ressurgir na sociedade angolana uma categoria de pessoas diferenciadas. Na verdade assistem-nos razões justificadas pela  investigação científica ao pegarmos em mãos a abordagem da questão, ainda que com a estranha sensação de estar destapando uma vasilha de enxofre no meio de um público imprevisível que, a qualquer momento, pode fazer-nos sentir o desconforto do estigma. Referimo-nos a pessoas que cultivam preconceitos e esperam simplesmente oportunidades, quaisquer que sejam, para destilá-los de forma hostil contra os judeus, tido por povo errante desde a antiguidade, condenado à dispersão e ao exílio permanente sofrendo na carne e no espírito ignomínias e uma infinidade de crimes horrendos que a História registou nos seus anais.

À guisa de conclusão, pelos factos apontados não pode ser posta  em causa a existência de uma herança judaica em Angola. Contudo, concordamos com Aida Freudenthal quando formula que na actualidade não existe no país uma comunidade judaica como tal, formada por descendentes dos judeus sefarditas, provida de sinais identitários exteriores comuns. Portanto,  os descendentes já não praticam a religião dos seus antepassados. 

Nas pesquisas sobre a presença de Judeus em Angola nunca foram encontrados sinais ou relatos credíveis da edificação no território de uma sinagoga ou outro templo para servir de  lugar de culto mesmo nos locais de maior concentração como Catumbela e Benguela. Em Moçambique foi construída uma sinagoga e judeus abastados saíam de Angola para a colónia do Índico a fim de cumprirem os rituais judaicos, como atestam os historiadores.

Ao longo de século e meio, as  sucessivas gerações foram assimilando os aspectos da cultura local e nela se integraram naturalmente como mais uma peça do mosaico  angolano de tal sorte que para se conhecer a dimensão e composição da prole deixada pelos judeus sefarditas exige trabalho apurado.

Do que se investigou até hoje, para além dos nomes e sobrenomes de raiz hebraica que se mantiveram intactos, os vestígios materiais da herança judaica em Angola resumem-se nas nove sepulturas alinhadas com inscrições em hebraico e português  no cemitério municipal de Benguela ao lado de campas cristãs.  São referidas outras 13 na vila da Catumbela (Alberto Iria, idem) e umas poucas na antiga vila de Bela Vista, hoje chamada Catchiungo, na província central do Huambo.
 
*Advogado e Jornalista

Este texto de Naime Azulayu consta dos meus arquivos. Quando rebenta uma guerra entre Israelitas e palestinos o anti-semetismo ganha força o que é crime de ódio. Racismo. Com a devida vénia ao autor, hoje faço a sua divulgação porque ajuda a compreender melhor o Povo de Israel.

Ida Freudenthal fez referência a várias famílias angolanas oriundas dos Judeus Sefarditas. Não referiu a família Dukarsky, um simpático casal que fundou em Luanda a Charcutaria Francesa. Seu filho, Dario Marcos Isaguí Dukaesky, luandense, foi meu colega no Liceu Salvador Correia.

*Artur Queiroz, jornalista

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