sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Angola | O Corredor e a Conversa Vazia -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O Corredor do Lobito está mesmo muito concorrido em “parceiros”, milhares de milhões e umas quantas distracções. O senhor ministro de Estado para a Coordenação Económica, José de Lima Massano, acaba de nos dizer que ao longo do canal ferroviário vão ser desenvolvidas actividades económicas “segundo os padrões europeus e norte-americanos”. E como é fatal, anunciou estudos. Estão sempre a exibir o mesmo filme.

 Francisco Queiroz, quando era ministro do sector, torrou milhões em estudos aéreos para elaborar o mapa geológico de Angola. Eu tenho livros escritos por geólogos e outros técnicos que são as “cartas geológicas” de todos os distritos de Angola, desde Cabinda à Huíla porque na época ainda não existia o distrito do Cunene. O Serviço de Geologia e Minas em Angola era de excelência. Os Serviços Geográficos e Cadastrais, igualmente. O Laboratório de Engenharia de Angola, o máximo. Este foi “ninho” de nacionalistas que lutavam pela Independência Nacional. Hermínio Escórcio era o coordenador dessas células revolucionárias.

O senhor ministro Massano não sabe mas no mais puro espírito de colaboração (combater a ignorância é um dever de qualquer patriota) informo que no “caderno de encargos” da concessão do Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB) estava inscrito o povoamento ao longo do canal ferroviário entre o Lobito e o Luau. E foi feito, com assinalável sucesso. Basta olhar para os silos que existem ao longo das estações e que estavam sempre repletos de cereais.

O povoamento foi feito com “europeus” e não apenas portugueses. O primeiro módulo tem nome: Grupo de Colonização do Cuma e começou em 1934. Os colonos tinham 11 anos para mostrarem o que valiam. E todos provaram na agricultura e criação de gado. Já volto aos colonos. O CFB, em cumprimento do caderno de encargos, contratou engenheiros para apoiarem as actividades agrícolas e florestais. Foram criados, ao longo dos anos, entre Lobito e Luau, dezenas de perímetros florestais, A espécie escolhida foi o eucalipto.

Ainda dentro do caderno de encargos, o CFB comprometeu-se a garantir serviços de saúde a todos os trabalhadores (15.000) e aos colonatos que surgiram ao longo do canal ferroviário. Manecas Balonas, filho do Huambo, foi médico da companhia. Andava no comboio e parava nas estações onde era necessário prestar assistência médica, Em 1975 era o único médico anestesista no Hospital de São Paulo (Américo Boavida). Vivia nas instalações hospitalares.

 O povoamento do CFB foi regulado pelo Decreto 25027 de 9 de Fevereiro de 1945. O seu Artigo 1º dá ao governador-geral de Angola o poder de demarcar o território “para fixação dos colonos europeus”. Mais os lotes para cultivo e pastagens com “superfície não inferior a 400 hectares”. Cada lote era dividido em talhões com 200 hectares ou múltiplos desse número. A concessão era provisória. Só passava a definitiva ao fim de 11 anos, a contar do dia em que o colono tomava posse da terra. O CFB tinha a obrigação de desbravar a terra e a sua preparação “para hortas em condições de fornecer os principais géneros hortícolas de alimentação”.

O CFB tinha a obrigação de preparar as sementeiras das searas e “construir uma habitação provisória de pau a pique suficiente para o colono e sua família. Instalações para recolha das colheitas, guarda das alfais e ferramentas agrícolas que o colono recebe por inventário no momento da posse do talhão”. Os colonos indicados pelo CFB tinham transportes gratuitos, para eles e suas famílias, desde o ponto de partida até ao porto do Lobito. Eis os primeiros quatro “felizes contemplados” todos de Portugal: António Pereira Marques, João Pereira Marques e Francisco Constantino Lopes, agricultores. Teodorico de Oliveira, serralheiro de máquinas agrícolas. Os primeiros lotes foram entregues aos colonos que semearam oito hectares de milho, arroz dois, feijão um hectare, trigo um, grão um e soja meio hectare. Cada casa foi mobiliada com duas camas, uma mesa, quatro bancos e um armário.

Cada colono recebeu oito bois de trabalho, duas vacas, cinco cabres e um bode, cinco ovelhas e um carneiro, duas porcas e um porco, 20 galinhas, seis patos, 20 pombos, seis coelhos. Duas charruas, duas grades, dez enxadas, duas pás, duas forquilhas, dois ancinhos, duas foices, dois machados, duas catanas, uma tesoura de podar, um serrote, um martelo e uma enxó. Os primeiros colonos embarcaram em Lisboa no dia 14 de Março ano de 1936. Foram instalados em Chenga (Ucuma). O CFB criou, a partir deste núcleo, as “fazendas padrão”. Basta olhar para os silos construídos entre a Ganda e Camacupa para se fazer um a ideia dos milhões de toneladas colhidos. Consultem os relatórios do Grémio do Milho.

Senhor ministro Massano, no Alto Catumbela nasceu uma indústria de celulose. Na Zona Industrial do Huambo foram instaladas dezenas de indústrias. O Leste de Angola viu prosperar a actividade madeireira. Os Flechas da PIDE e os da UNITA protegiam os madeireiros. Está tudo estudado. Só é preciso executar. Conversa não enche barriga, pau podre não mata cobra e saco vazio não fica em pé. 

Sua excelência o ministro Masssano disse que o dinheiro investido pelos “parceiros” do Corredor do Lobito não é dívida do Estado. Era só mesmo o que faltava. Tomem lá tudo de borla e nós ainda vos pagamos. Estas coisas têm de ser tratadas de uma forma séria. O senhor ministro não ganha nada em tratar-nos como burros. E devia ter presente que só é ministro porque milhares de “burros” lutaram pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial. Felizmente, não dizem disparates nem enganam o Povo.

Aldraberto da Costa Júnior, o aldrabão compulsivo, está preocupado com o Poder Judicial. Porque diverge cada vez mais da Justiça da Jamba. Em Angola ninguém é condenado a morrer nas fogueiras, enterrado vivo (como foi Dona Isabel Paulino), à paulada na cabeça ou em execuções cruéis praticadas pelos esbirros do criminoso de guerra Jonas Savimbi, entre os quais Abílio Camalata Numa. 

Os políticos não podem interferir no Poder Judicial. Mas os sicários da UNITA estão sempre a pisar esse risco. Puseram os seus serventes a publicar, nas redes sociais e nos “clubes” pagos pela Irmandade Africâner e a CIA, denúncias de corrupção praticadas por magistrados judiciais e conselheiros dos Tribunais Superiores. Provas? Zero. Para  o aldrabão compulsivo que lidera a UNITA basta conversa. Nocúmulo do abuso, Aldraberto reclama a “revisão da Lei que atribui competências aos Conselhos Superiores da Magistratura Judicial e do Ministério Público”. Loucura ou incompetência! Em inúmeros países democráticos é assim. Quem preside aos Conselhos Superiores são os presidentes dos Tribunais Supremos e os Procuradores-Gerais da República. A UNITA quer tudo à maneira da Jamba. 

* Jornalista

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