segunda-feira, 4 de março de 2024

...e votar nele e se votassem lá lhes dava um bacalhau, um pão-de-ló, uma salsicha

PORTUGAL - ELEIÇÕES

Pedro Cordeiro. editor da Secção internacional | Expresso (curto)

Bom dia e boa semana!

Arranca a última semana do apelo ao voto para as legislativas de 10 de março, escreve o Expresso em manchete. Razão para as 17 candidaturas à Assembleia da República se esforçarem, país fora, pela eleição de um deputado, a constituição de um grupo parlamentar, um papel decisivo na formação do próximo Governo ou mesmo a sua chefia. Questão de escala, e essa damo-la nós, o povo. Alguns já o fizeram, pois ontem houve votação antecipada. Foi o caso do PR, lembra a Liliana Valente.

O fim de semana fez-se, pois, na estrada. O Diogo Cavaleiro seguiu Pedro Nuno Santos no Norte do país, onde ouviu dizer que o secretário-geral socialista “é muito simpático e não tem cara de mafioso”. À noite, em Braga, o comício do PS contou com um forte discurso de Isabel Soares. Horas antes, em Guimarães, a comitiva fora verberada por um casal cujo elemento masculino atirou vasos aos apoiantes de Pedro Nuno. Na véspera, fora a vez de o ainda primeiro-ministro António Costa fazer a sua parte.

Já a AD acusou o governante demissionário de “descaramento”, conta o João Diogo Correia. Luís Montenegro visitou mais um ex-líder do PSD, no caso Santana Lopes. Apoiado de fora pelo presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, e o antigo dirigente do CDS Adolfo Mesquita Nunes (que pelo meio ainda apoiou a Iniciativa Liberal), o chefe dos laranjas encabeça a maioria das sondagens, mas dentro da margem de erro. Já o seu partido foi recentemente visado por publicidade anónima nas redes sociais.

Mais à direita, lá para o extremo, o presidente do Chega ensaia uma teoria da conspiração em versão ‘tuga’ de Trump ou Bolsonaro. André Ventura aproveitou a piada parva e escusadíssima de um bloquista para dar gás a alegações já desmentidas pela Comissão Nacional de Eleições, pondo em causa a seriedade das legislativas. Pasme-se, chamou “incendiárias” a palavras do chefe de Estado sobre justiça e fez propostas que peritos ouvidos pelo Vítor Matos para o Expresso consideram inconstitucionais.

Também a Norte rumou a Iniciativa Liberal, que oscila entre a afirmação e a aproximação à AD, explica a Liliana Coelho. O voto útil é inimigo do partido de Rui Rocha, em maus lençóis num recente estudo de opinião. Animado talvez pelos números dessa sondagem, o secretário-geral do PCP encontrou-se em Lisboa com o antecessor Jerónimo de Sousa e lançou a pergunta aos que vaticinam a extinção a prazo do seu vetusto partido: “Isto é coisa de quem está a morrer?” A Margarida Coutinho esteve lá.

Igualmente em Lisboa, Mariana Mortágua alertou para ameaças, que vitimarão sempre e antes de mais as mulheres, as minorias, os mais pobres, os mais desprotegidos. A coordenadora do BE teve ao lado a anterior ocupante do cargo, Catarina Martins, escreve a Cláudia Monarca Almeida. Já o PAN lembrou as cheias de Algés e chamou a atenção para a falta de ordenamento do território, ao passo que o Livre criticou quem tenta desacreditar a democracia.

Os nossos colunistas vão seguindo a campanha. Daniel Oliveira nota o fracasso da tentativa de recentramento da AD (nisso tendo eco na concorrência, pelas plumas da Ana Sá Lopes ou da Maria Castello Branco) e critica a “fezada económica” da direita. Luísa Schmidt chama a atenção para o as questões ambientais, enquanto Manuela Ferreira Leite traça um retrato preocupante do país e confia na sabedoria do povo e Lourenço Pereira Coutinho analisa a propensão para se votar com a algibeira.

Outros escribas têm abordado temas internacionais que parecem pouco interessar aos candidatos. Teresa de Sousa dá razão a Emmanuel Macron quanto à Ucrânia, ao contrário de José Pedro Teixeira Fernandes. O assunto causa insónias a Teresa Violante e leva Miguel Monjardino a lastimar um inverno estratégico europeu ou Luís Marques a explorar as economias de guerra. Chamei esta gritante lacuna para assunto do pocast O Mundo a Seus Pés, em que ouvi Diana Soller e Hélder Gomes.

Outras notícias

MÃO CHEIA Hoje é bom dia para ser, por exemplo, um aniversariante sportinguista. O Benfica deixou-se atropelar no Dragão, onde levou cinco golos sem resposta, como conta o Diogo Pombo. Fica comprometida a luta pelo título e aumenta a contestação ao treinador Roger Schmidt. Sorriem os leões, que venceram o Farense em Alvalade.

DÉCIMO PRIMEIRO Esta segunda-feira é também mais um dia, o 11º seguido, de preços baixos no mercado ibérico de eletricidade, abaixo dos 10€ por MWh, escreve o Miguel Prado. Resta saber se vai refletir-se nas contas do fim do mês.

QUASE DUAS DEZENAS Marcelo Rebelo de Sousa falou de Justiça 19 dias antes do que prometera. Numa mensagem o Presidente da República exige rapidez, prontidão e eficácia ao Ministério Público e alerta para os perigos de judicialização da política e politização da justiça, escreve o Vítor Matos.

DÚZIA Estão encontrados os finalistas do Festival RTP da Canção, após uma segunda meia-final, sábado, onde se cruzaram candidatos a ir à Suécia representar Portugal com veteranas glórias (a minha parte preferida), num rol que incluiu Simone de Oliveira, Eládio Clímaco, Adelaide Ferreira, Herman José, Helena Isabel, José Nuno Martins ou Isabel Campelo. A festejar 60 anos, o concurso termina no próximo sábado, 9 de março, com a escolha da voz que irá a Malmo em maio. Até lá, ouça aqui as canções apuradas.

QUATRO São os arquipélagos que compõem a Macaronésia: os mui lusos Açores e Madeira, a espanhola Canárias e Cabo Verde (o único que é um Estado soberano), cujo primeiro-ministro esteve em Lisboa e deu uma entrevista à Manuela Goucha Soares. Ulisses Correia e Silva abordou assuntos como digitalização aplicada ao desenvolvimento e o esforço por reduzir a dependência alimentar, hídrica e energética do seu país, que garante ser o mais livre de África.

VINTE E UM Max Verstappen, que ganhou os últimos três campeonatos de Fórmula 1, chegou em primeiro lugar na prova inicial deste ano, no Bahrein, com 21 segundos de avanço sobre o segundo, Sergio Pérez. O piloto da Red Bull ganha asas, enquanto Lewis Hamilton, recém-contratado pela Ferrari, desilude ao ficar em sétimo.

OITOCENTOS E SETENTA
E CINCO Um agrupamento escolar da Amadora tem 875 alunos imigrantes, de 35 nacionalidades. A reportagem da Joana Pereira Bastos explica o paralelo de riqueza e dificuldade que isto implica e como se promove a integração com meios escassos.

Frases

“‘Fast Car’ conta a história de uma mulher negra que ainda se sentiu livre para ser o que queria ser, mas ficou presa a uma vida onde continua a ser caixa num supermercado para pagar as contas. Cantada por Tracy Chapman, que cresceu no meio dessas vidas, está carregada de género e de cor, de pobreza e de exclusão. Mas também trata de um tema universal. […] Pôr em causa que seja cantada por quem tem a pele mais branca é recusar esse espaço de encontro, precioso por mais pequeno que seja. É também dizer que a cor de uma pessoa a torna, necessariamente, uma espécie de estranha total para quem não tem a mesma cor, porque não podem partilhar as mesmas emoções.”

Eugénia Galvão Teles, num belíssimo artigo para o Expresso sobre os desmandos do conceito de apropriação cultural, tomando como mote a grande canção de Tracy Chapman que regressou nos prémios Grammy deste ano

“E há responsáveis por esta morte. Os primeiros são aqueles que não permitiram a entrada do acompanhante, incumprindo a lei e atropelando a dignidade humana, os segundos somos nós todos, a colectividade pacífica de revoltados tão bem descrita por Miguel Torga, que permite que práticas erradas se generalizem tanto que se tornam o normal.”

Carmen Garcia, no “Público”, sobre o triste caso de Avelina, senhora demente que desapareceu da urgência de um grande hospital de Lisboa onde não deixaram que o marido a acompanhasse e cujo corpo foi encontrado, passados dois meses e meio, em avançado estado de decomposição

Podcasts a não perder

Liberdade em Hong Kong é uma série de cinco episódios sobre a luta pela liberdade naquela região autónoma especial chinesa, onde o modelo ‘Um País, Dois Sistemas’ tem sido gradualmente substituído por repressão crescente. A jornalista Salomé Fernandes falou com protagonistas e entendidos na matéria sobre um combate de David contra Golias, em que para já prevalece o gigante.

O diretor-adjunto David Dinis esteve no Expresso da Manhã a conversar com o Paulo Baldaia sobre a reta final da campanha para as legislativas. Com o número de indecisos a significar que a vitória tanto pode sorrir ao PS como à AD, muito dependerá da eficácia do apelo ao voto útil.

O Bernardo Mendonça convidou Alexandra Lucas Coelho, cujo conhecimento do conflito israelo-palestiniano dificilmente tem par no jornalismo português, para o mais recente A Beleza das Pequenas Coisas. A propósito do relançamento atualizado do seu livro “Oriente Próximo”, falam sobre uma guerra sem fim à vista, cujo último surto aconteceu a 7 de outubro com o bárbaro ataque do Hamas contra o Estado judeu.

O que ando a ver, ouvir e ler

O fim de semana foi intenso na frente cultural. Começo por recomendar vivamente, sobretudo a quem tem filhos, “A madrugada que eu esperava”, musical que vai buscar para título um verso batido de Sophia para celebrar os 50 anos do 25 de Abril. Ao leme estão Carolina Deslandes e Bárbara Tinoco, que alternam nos dois papéis principais, lado a lado com Dinarte Branco ou Jorge Mourato, entre outros. História bem construída, canções com qualidade e muito boa disposição a tratar um assunto importante. Até final de abril no Teatro Maria Matos, em Lisboa e em seguida no Porto, é louvável empreitada pela preservação da memória. Nos palcos, a agenda próxima inclui “A paixão segundo o teatro” na Comuna, “Tempestade ainda” no Teatro Aberto e “A Senhora de Dubuque” no Trindade.

De memória fala também “Factum”, exposição de 170 fotografias de Eduardo Gageiro, na Cordoaria Nacional. Anda por ali a Revolução dos Cravos, com o emblemático retrato de Salgueiro Maia ou o regresso de Mário Soares do exílio, mas não só. Alfama, monges cartuxos, minas alentejanas, políticos (Eanes a fazer windsurf!) e artistas foram imortalizados pela câmara do quase nonagenário e muitíssimo simpático Gageiro, que tive o prazer de encontrar em plena mostra e apresentar à prole. Até 5 de maio.

Na música, anseio pelo regresso de Sérgio Godinho ao Coliseu dos Recreios, dias 20 e 21. O título deste Curto foi, de resto, fanado ao seu “Cuidado com as Imitações”, exortação muito pertinente em tempos de decisão política. O novo espetáculo, esgotado nas duas datas, chama-se “Liberdade 25”, para festejar a democracia conquistada há meio século. Salto geracional para conhecer, a 29 de abril, o novo álbum de Benjamim, “As Berlengas”, a apresentar em recital no Maria Matos.

Antes disso, a Gulbenkian convoca para delícias como a voz da soprano Joyce DiDonato, o Requiem de Mozart ou a Paixão segundo São João de Bach. Ali ouvi, sábado, o marroquino Driss el Maloumi com alaúde, voz e banda. Descoberta que aconselho.

Acabo com os livros, para voltar ao tema com que comecei o Curto e fechar o círculo. Ando a ler as “três cabeças” que a editora Zigurate lançou sobre os líderes dos três maiores partidos: Pedro Nuno Santos por Ana Sá Lopes, Luís Montenegro por Miguel Santos Carrapatoso, André Ventura por Vítor Matos. Já tive qualquer destes camaradas por companheiros de redação, mas creiam que não é a simpatia que me faz dizer que prestaram importante serviço público ao darem a conhecer de forma política e pessoal quem nos quer governar. Quem nunca nos governou mas faz cá falta é, entretanto, Francisco Lucas Pires, cuja biografia da autoria de Nuno Gonçalo Poças já encomendei. Chama-se “O príncipe da democracia”, o que é de inteira justeza, e recordou-me o excelente documentário que sobre o mesmo homem brilhante realizou Margarida Mercês de Mello, em 2019.

E assim me despeço, que há todo um jornal para ir fazer e o leitor terá trabalho ou lazer a que dedicar o seu tempo. Continue a acompanhar-nos por aqui. Até breve e até sempre!

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