Carvalho da Silva –
Jornal de Notícias, opinião
O Governo impõe
cortes nos salários, nas pensões de reforma, na proteção dos desempregados, na
saúde, no ensino, na proteção social em geral, sempre com a invocação da falta
de dinheiro. Aumentam os impostos, deixam morrer empregos, não há investimento,
sempre sob a tese de que não há dinheiro.
Há dinheiro e
muito! No plano europeu e mundial há tanto dinheiro disponível que até dá para
comprarem dívida pública soberana de países a juros negativos, como fazem com a
Alemanha. E existem aquisições de outros produtos financeiros privados feitos
da mesma forma.
Nos offshores, nos
capitais de grandes grupos económicos, em grandes clubes de futebol e noutras
grandes agremiações de vária origem, e até em "prestigiadas"
instituições filantrópicas, movimentam-se impunemente e fugindo ao fisco
volumes impressionantes de dinheiro.
A criminalidade
económica germinou com força na Europa, os governos dão-lhe cobertura e estão
cada vez mais degradados os processos de controle e combate. A Europa,
incluindo o espaço da União Europeia, tornou-se o maior centro de lavagem de
dinheiro do mundo. A chamada democratização de vários países do Leste Europeu
deu um triste contributo a este escabroso processo. Mas não há diferença de
práticas entre os países do Leste, do Centro ou do Ocidente europeu.
Por outro lado, a
economia paralela e seus sucedâneos movimentam, só em Portugal, 43 mil milhões
de euros que fogem ao fisco.
Entretanto vem a
troica, o governo externo a que estamos sujeitos e, em nome dos interesses dos
nossos credores, alguns metidos até à medula naqueles processos, faz-nos um
empréstimo a juros elevados que se destina apenas a dois objetivos: Portugal
pagar aos seus credores internacionais; recapitalizar a banca. Não há qualquer
disponibilização de verbas para o país promover investimento, criar emprego,
desenvolver-se. Isto é inconcebível!
Porque não se
discute uma utilização útil, racional, que permita investimento público e
privado a partir dos milhares de milhões de euros destinados à banca, que até
agora não têm utilização? O dinheiro está a ser guardado para ir tapar novos
buracos provocados por apropriação exagerada de lucros ou por roubos tipo BPN?
E o que se passa
com a utilização do dinheiro do Quadro de Referência Estratégico Nacional
(QREN)?
Quem analisa a
gestão do QREN constata fundamentalmente quatro coisas: I) a reprogramação
feita é orientada para substituir financiamento público nacional por
financiamento comunitário, só com o objetivo de reduzir a despesa; II) o
ajustamento estrutural anunciado nessa reprogramação não é mais do que um
processo de destruição de atividades produtivas e emprego, de redução de
despesa em áreas como a educação/formação e a ciência; III) imperam objetivos
imediatos, em geral perniciosos, e não existe nenhum debate político
estratégico sobre como rentabilizar os recursos, quando todas as aprovações de
projetos têm de ser feitas em 2013; IV) estão por utilizar mais de 10 mil
milhões de euros.
Os fundos
disponíveis do QREN têm de ser aproveitados para investimento produtivo, para
dinamizar as atividades económicas geradoras de emprego e colmatar défices
estruturais da economia.
Todos sabemos que o
principal problema da maior parte das empresas é a falta de liquidez e que os
bancos hoje têm como objetivo cumprir os rácios de capital e não fornecer
crédito à economia.
É preciso forçar os
bancos privados a usar os recursos disponíveis, ou então negociar com a troica
o acesso da CGD (banco público) a esses fundos existentes, para que a Caixa
possa geri-los em favor da economia.
Sem investimento
não há criação de emprego, sem emprego não há procura, sem procura não há
retorno, sem retorno não há investimento. Há que romper com este ciclo vicioso
de empobrecimento e miséria e contrapor o ciclo virtuoso de investir, criar
emprego, melhorar os rendimentos das pessoas. Isso pode fazer-se com opções
políticas de boa utilização do dinheiro existente e com um governo que mereça
confiança e mobilize os portugueses.
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