Guila Flint, Tel
Aviv - Opera Mundi
Para especialistas
israelenses e palestinos, chances de acordo aumentam devido às mudanças na
região e nos territórios
A retomada das
negociações entre israelenses e palestinos, depois de três anos de congelamento
do diálogo, é vista com ceticismo nos dois lados do conflito. Isso porque ambos
os povos estão cansados e incrédulos depois de 20 anos de tentativas fracassadas.
No entanto,
analistas locais apontam mudanças que ocorreram na região e na situação tanto
dos palestinos como dos israelenses, que podem agilizar o que muitos consideram
impossivel: um acordo de paz dentro de seis a nove meses que inclua a criação
de um Estado Palestino ao lado de Israel. Esse foi o objetivo anunciado pelo
secretário de Estado norte-americano, John Kerry.
A turbulência no mundo árabe, que gerou instabilidade nos principais países da
região, principalmente Siria e Egito, fortalece o interesse estratégico dos
Estados Unidos em um acordo entre israelenses e palestinos.
Daí se origina o aumento da motivação norte-americana para obter um acordo,
vide a insistência de Kerry, que nos últimos quatro meses viajou seis vezes
para o Oriente Médio e conversou dezenas de horas com o primeiro-ministro de
Israel, Benjamin Netanyahu e com o presidente da ANP (Autoridade Nacional
Palestina), Mahmoud Abbas, até conseguir convencê-los a retomar as negociações.
A reviravolta no mundo árabe, que levou recentemente à queda do governo de
Mohamed Morsi no Egito, enfraquece o Hamas e fortalece a ANP. Na última segunda
feira (29/07), Abbas realizou sua primeira visita ao Egito desde a queda de
Hosni Mobarak, e foi recebido pelo novo governo militar. Durante o governo da
Irmandade Muçulmana, que tem profunda afinidade ideológica com o Hamas, o grupo
islâmico que controla a Faixa de Gaza viveu um ano de relativa prosperidade,
principalmente com a abertura parcial da fronteira entre o Egito e o territorio
palestino.
No entanto, após a
queda de Morsi, o Hamas tornou-se "órfão". Depois de se desligar da
Siria e do Irã, havia apostado todas as suas cartas na Irmandade Muçulmana
egípcia. Com o enfraquecimento do Hamas, Abbas teria que enfrentar menos
oposição interna a um acordo com Israel.
Boicote europeu
Israel também enfrenta pressão da União Europeia, que recentemente anunciou o
boicote a qualquer tipo de negócio que envolva os assentamentos israelenses
localizados nos territorios palestinos ocupados durante a guerra de 1967.
Segundo economistas, o bloqueio pode ter um efeito desastroso para a economia
israelense, pois as maiores empresas do país, inclusive os grandes bancos, têm
envolvimento em locais que ficam nos assentamentos, como agências bancárias.
O estremecimento das relações econômicas com a Europa, que hoje em dia é o
maior parceiro comercial de Israel, pode ter consequências graves para a
economia do país.
Novos mecanismos
Para Nimrod Novik, um dos arquitetos do Acordo de Oslo, Kerry adotou novos
mecanismos que podem ajudá-lo a convencer os dois lados a fazerem concessões.
"Kerry conseguiu identificar o calcanhar de Aquiles de Abbas e
Netanyahu", disse em entrevista à radio israelense Kol Israel.
"O ponto fraco de Abbas é o temor de não ter respaldo do mundo árabe para
as possíveis concessões que ele terá que fazer", afirmou, "e a
questão que mais preocupa Netanyahu é a segurança de Israel após a retirada das
tropas dos territórios ocupados".
Kerry também criou
um mecanismo para amenizar os temores do premiê israelense, nomeando o general
John Allen ao cargo de emissário especial para questões de segurança nas
negociações israelenses-palestinas.
A missão do general Allen, ex-comandante das forças norte-americanas no
Afganistão, será trabalhar com os israelenses para elaborar um plano que
garanta a segurança depois da retirada.
Velhos temas, novas circunstâncias
Nos 20 anos que se passaram desde o Acordo de Oslo, assinado por Itzhak Rabin e
Yasser Arafat em 1993, as circunstâncias politicas passaram por transformações
profundas, mas os temas a serem negociados entre as partes não mudaram.
Como em 1993, israelenses e palestinos ainda têm que resolver questões
extremamente espinhosas: as fronteiras futuras entre os dois Estados, o destino
dos refugiados palestinos, o status de Jerusalém, o futuro dos assentamentos
israelenses e a divisão de recursos naturais – principalmente da água.
Nesses 20 anos pelo menos quatro secretários de Estado já se alternaram na
missão de mediar um acordo entre israelenses e palestinos, e fracassaram. Foram
eles: Madeleine Albright, Colin Powel, Condoleezza Rice e Hillary
Clinton. O mesmo foi o destino de dois emissários especiais para o Oriente
Médio: Dennis Ross (enviado por Bill Clinton) e George Mitchell (nomeação de
Barack Obama).
Há uma unanimidade entre os analistas de que, em todos os temas a serem
negociados, o máximo que Netanyahu quer e pode oferecer está muito distante do
mínimo que Abbas estará disposto a aceitar. Sufian Abu Zaida, um dos lideres do
Fatah (partido de Abbas), disse que "os israelenses ainda não entenderam
que, do ponto de vista da liderança palestina, já fizemos uma enorme concessão
ao aceitar o principio das fronteiras anteriores à guerra de 1967, o que
significa que o Estado Palestino será estabelecido em apenas 22% da área da
Palestina histórica".
No entanto, segundo o premiê Netanyahu, as fronteiras de 1967 são
"indefensáveis" e ele exige que, após o acordo, tropas israelenses
permaneçam no Vale do Jordão (leste da Cisjordânia). Os palestinos querem
estabelecer a capital de seu futuro Estado na parte oriental de Jerusalém, já
para o governo israelense a cidade é a "capital eterna e indivisível de
Israel".
Resta saber qual será o efeito das novas circunstâncias sobre as negociações.
Na foto: Kerry
assiste a aperto de mão entre o negociador palestino Saeb Erekat e a ministra
da Justiça israelense Tzipi Livni - Efe
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série de reportagens especiais sobre Israel – em Opera Mundi
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