domingo, 4 de agosto de 2013

Negociação de paz no Oriente Médio traz mesmos temas, mas situação política diferente



Guila Flint, Tel Aviv - Opera Mundi

Para especialistas israelenses e palestinos, chances de acordo aumentam devido às mudanças na região e nos territórios

A retomada das negociações entre israelenses e palestinos, depois de três anos de congelamento do diálogo, é vista com ceticismo nos dois lados do conflito. Isso porque ambos os povos estão cansados e incrédulos depois de 20 anos de tentativas fracassadas.

No entanto, analistas locais apontam mudanças que ocorreram na região e na situação tanto dos palestinos como dos israelenses, que podem agilizar o que muitos consideram impossivel: um acordo de paz dentro de seis a nove meses que inclua a criação de um Estado Palestino ao lado de Israel. Esse foi o objetivo anunciado pelo secretário de Estado norte-americano, John Kerry.

A turbulência no mundo árabe, que gerou instabilidade nos principais países da região, principalmente Siria e Egito, fortalece o interesse estratégico dos Estados Unidos em um acordo entre israelenses e palestinos.

Daí se origina o aumento da motivação norte-americana para obter um acordo, vide a insistência de Kerry, que nos últimos quatro meses viajou seis vezes para o Oriente Médio e conversou dezenas de horas com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu e com o presidente da ANP (Autoridade Nacional Palestina), Mahmoud Abbas, até conseguir convencê-los a retomar as negociações.

A reviravolta no mundo árabe, que levou recentemente à queda do governo de Mohamed Morsi no Egito, enfraquece o Hamas e fortalece a ANP. Na última segunda feira (29/07), Abbas realizou sua primeira visita ao Egito desde a queda de Hosni Mobarak, e foi recebido pelo novo governo militar. Durante o governo da Irmandade Muçulmana, que tem profunda afinidade ideológica com o Hamas, o grupo islâmico que controla a Faixa de Gaza viveu um ano de relativa prosperidade, principalmente com a abertura parcial da fronteira entre o Egito e o territorio palestino.

No entanto, após a queda de Morsi, o Hamas tornou-se "órfão". Depois de se desligar da Siria e do Irã, havia apostado todas as suas cartas na Irmandade Muçulmana egípcia. Com o enfraquecimento do Hamas, Abbas teria que enfrentar menos oposição interna a um acordo com Israel.

Boicote europeu

Israel também enfrenta pressão da União Europeia, que recentemente anunciou o boicote a qualquer tipo de negócio que envolva os assentamentos israelenses localizados nos territorios palestinos ocupados durante a guerra de 1967.

Segundo economistas, o bloqueio pode ter um efeito desastroso para a economia israelense, pois as maiores empresas do país, inclusive os grandes bancos, têm envolvimento em locais que ficam nos assentamentos, como agências bancárias.

O estremecimento das relações econômicas com a Europa, que hoje em dia é o maior parceiro comercial de Israel, pode ter consequências graves para a economia do país.

Novos mecanismos

Para Nimrod Novik, um dos arquitetos do Acordo de Oslo, Kerry adotou novos mecanismos que podem ajudá-lo a convencer os dois lados a fazerem concessões. "Kerry conseguiu identificar o calcanhar de Aquiles de Abbas e Netanyahu", disse em entrevista à radio israelense Kol Israel.

"O ponto fraco de Abbas é o temor de não ter respaldo do mundo árabe para as possíveis concessões que ele terá que fazer", afirmou, "e a questão que mais preocupa Netanyahu é a segurança de Israel após a retirada das tropas dos territórios ocupados".

Kerry também criou um mecanismo para amenizar os temores do premiê israelense, nomeando o general John Allen ao cargo de emissário especial para questões de segurança nas negociações israelenses-palestinas.

A missão do general Allen, ex-comandante das forças norte-americanas no Afganistão, será trabalhar com os israelenses para elaborar um plano que garanta a segurança depois da retirada.

Velhos temas, novas circunstâncias

Nos 20 anos que se passaram desde o Acordo de Oslo, assinado por Itzhak Rabin e Yasser Arafat em 1993, as circunstâncias politicas passaram por transformações profundas, mas os temas a serem negociados entre as partes não mudaram.

Como em 1993, israelenses e palestinos ainda têm que resolver questões extremamente espinhosas: as fronteiras futuras entre os dois Estados, o destino dos refugiados palestinos, o status de Jerusalém, o futuro dos assentamentos israelenses e a divisão de recursos naturais – principalmente da água.

Nesses 20 anos pelo menos quatro secretários de Estado já se alternaram na missão de mediar um acordo entre israelenses e palestinos, e fracassaram. Foram eles: Madeleine Albright, Colin Powel, Condoleezza Rice e Hillary Clinton. O mesmo foi o destino de dois emissários especiais para o Oriente Médio: Dennis Ross (enviado por Bill Clinton) e George Mitchell (nomeação de Barack Obama).

Há uma unanimidade entre os analistas de que, em todos os temas a serem negociados, o máximo que Netanyahu quer e pode oferecer está muito distante do mínimo que Abbas estará disposto a aceitar. Sufian Abu Zaida, um dos lideres do Fatah (partido de Abbas), disse que "os israelenses ainda não entenderam que, do ponto de vista da liderança palestina, já fizemos uma enorme concessão ao aceitar o principio das fronteiras anteriores à guerra de 1967, o que significa que o Estado Palestino será estabelecido em apenas 22% da área da Palestina histórica".

No entanto, segundo o premiê Netanyahu, as fronteiras de 1967 são "indefensáveis" e ele exige que, após o acordo, tropas israelenses permaneçam no Vale do Jordão (leste da Cisjordânia). Os palestinos querem estabelecer a capital de seu futuro Estado na parte oriental de Jerusalém, já para o governo israelense a cidade é a "capital eterna e indivisível de Israel".

Resta saber qual será o efeito das novas circunstâncias sobre as negociações.

Na foto: Kerry assiste a aperto de mão entre o negociador palestino Saeb Erekat e a ministra da Justiça israelense Tzipi Livni - Efe


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