Pedro
Marques Lopes – Diário de Notícias, opinião
No
espaço de dois dias, duas deputadas do PSD fizeram declarações sobre o último
acórdão do Tribunal Constitucional e o conflito institucional que o Governo e
alguns sectores do PSD pretendem criar.
No
passado domingo, Francisca Almeida, no Expresso, escreveu um artigo em que
critica a deliberação do TC duma forma equilibrada, sustentada, com argumentos
sérios e pertinentes, mas sem nunca pôr em causa a instituição, nem o seu papel
na arquitetura do nosso Estado de direito, nem os juízes. No mesmo texto interpela
o primeiro-ministro perguntando "a quem serve e de que serve juntar aos
constrangimentos da decisão constitucional um conflito institucional?",
põe em causa as infelicíssimas declarações de Passos Coelho sobre a suposta
falta de legitimidade democrática dos juízes (dando-lhe uma lição sobre a forma
como são escolhidos), explica que certos princípios que estarão sempre
presentes em Constituições de países democráticos serão sempre alvo de
interpretação subjetiva e que a inclinação partidária não é, evidentemente e
felizmente, garantia de decisão neste ou naquele sentido.
Na
terça-feira, Teresa Leal Coelho, em entrevista ao Público, faz o mais
descabelado, ignorante e vergonhoso ataque ao TC de que há memória.
A
deputada, entre outros despropósitos, sugere sanções jurídicas "para os
casos em que os poderes que são distribuídos, incluindo ao TC, são
extravasados". Trocando por miúdos: Teresa Leal Coelho quer sanções
jurídicas ao TC, sempre que este não delibere segundo a sua interpretação da
Constituição ou sempre que ela pense que exista usurpação de poderes -
provavelmente a deputada não saberá, mas é do que acusa o TC . Entretanto,
esquece-se, claro está, de esclarecer que tribunal julgaria o TC ou se ela mesmo
se encarregaria dessa tarefa.
A
senhora também lamenta que alguns juízes tenham iludido quem os escolheu.
Portanto, segundo a professora de direito Teresa Leal Coelho, os malandros dos
juízes iludiram os atuais responsáveis do PSD. A prova disso é que até os
designados com a sua ajuda não decidem segundo a "visão
filosófica-política que seria compatível com aquilo que é o projeto reformista
que temos para o País", diz a deputada. Em termos simples: os bons juízes
são os que respeitarem sempre as propostas legislativas de quem os indicou.
Isso do respeito pela Constituição, pela lei, pela independência dos juízes
serão detalhes, talvez mesmo sinais de falta de "maturidade
política", que segundo Teresa Leal Coelho parece faltar aos senhores e
senhoras do TC. Mas, se assim fosse, para que serviria o TC? Punham--se uns
fantoches no Palácio Ratton e estava o assunto resolvido, até se poupava
dinheiro.
Tivesse
o PSD ao seu leme gente que respeitasse o legado do partido e percebesse que
acima das lutas políticas conjunturais estão princípios básicos da democracia
liberal e do Estado de direito, e Teresa Leal Coelho seria imediatamente
destituída de vice-presidente do partido e não mais falaria pelo PSD. Mas,
claro está, quando é o próprio líder do partido e do Governo a pôr em causa um
pilar do Estado de direito, é de esperar ver acólitos, para quem a fidelidade
pessoal é mais importante que as responsabilidades com a comunidade, a serem
mais fundamentalistas que o chefe.
Declarações
do teor das da vice-presidente do PSD são indignas de alguém que é
representante do povo e devia pugnar pela defesa do Estado de direito acima de
tudo. Claramente, é essa a dimensão mais grave dos dislates que proferiu. Mas
são, por isso mesmo, também um insulto à história do PSD e aos princípios que o
partido sempre defendeu. Um partido defensor das instituições, um partido
reformador, não esta caricatura de movimento revolucionário que se permite ter
gente que cospe na herança e nos contributos do partido para a evolução do
País, como fez o inefável Bruno Maçães, qual Trostski de trazer por casa, ou,
agora, Teresa Leal Coelho, qual nova Passionaria.
Francisca
Almeida, com 31 anos de idade e sem responsabilidades de monta no PSD, está
mais consciente do que deve ser a postura institucional dum Governo, mais
alinhada com o papel de defesa das instituições típica dum partido de
centro-direita e mais lembrada do conjunto de valores e princípios que o PSD
sempre defendeu do que uma vice-presidente do partido e do que o próprio
primeiro-ministro. Há, de facto, outro PSD que não este que não percebe o
Estado de direito e que não hesita em pôr em causa o equilíbrio institucional
por medíocres objetivos táticos. O PSD em que, estou firmemente convicto, os
seus eleitores tradicionais se reveem.
E
não, os políticos não são todos iguais. Há políticos que envergonham esse nome
e há outros que merecem esse tão nobre título.
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