terça-feira, 12 de agosto de 2014

Portugal: ALTA TENSÃO CONSTITUCIONAL



Eduardo Oliveira Silva – jornal i, editorial

As pressões para o Tribunal Constitucional aprovar cortes nas pensões e na função pública contribuem para a imagem externa negativa de Portugal

Na quinta-feira o Tribunal Constitucional vai anunciar a sua decisão sobre a proposta do governo que corta definitivamente as pensões em nome da sua alegada sustentabilidade e restabelece os cortes na função pública introduzidos no tempo de Sócrates.

Seja qual for a decisão, haverá duas coisas a fazer por parte das forças políticas e dos parceiros sociais. Em primeiro lugar, respeitar o que o Tribunal determinar e, por parte da maioria, não voltar a tentar tornear a deliberação com recurso a habilidades políticas. Em segundo lugar, não transformar a decisão do Tribunal, seja ela qual for, num pretexto para incendiar a vida política, rompendo a estabilidade em que vamos vivendo, desde o sobressalto grave de há um ano com a crise aberta por Paulo Portas e que Passos dominou.

Não foram por isso particularmente felizes as declarações de Luís Montenegro, o líder parlamentar do PSD, no fim-de-semana, em que, sem o admitir expressamente, não deixou de abrir a porta a um encurtamento da legislatura, se o Tribunal Constitucional não viabilizar o plano governamental. Um plano que conta, aliás, com um claro beneplácito de Cavaco Silva, que fez a vontade ao executivo ao mandar os diplomas para fiscalização preventiva.

Mesmo assim, é bem possível que no todo ou em parte as propostas não sejam consideradas. Aproveitar essa eventualidade para criar uma crise política antecipando eleições seria certamente um acto suicida da maioria PSD/CDS. Desde logo, uma convulsão levaria a eleições em Novembro ou Dezembro desarranjando o Orçamento do Estado, e além disso seria uma fantástica prenda de Natal para os partidos da oposição, nomeadamente para o PS, que não poderia desejar nada de melhor a seguir à resolução da sua disputa interna, independentemente de a vitória sorrir a Seguro ou a Costa.

Conhecendo-se a resiliência de Passos Coelho e a forma como tem resistido às crises sem nunca atirar a toalha ao chão, seria pouco provável que desta vez optasse por mergulhar o país num processo eleitoral caso o Tribunal Constitucional não lhe desse razão. Isto apesar de as hostes da maioria persistirem em proclamar que a única alternativa a um entrave oriundo do Tribunal Constitucional é um aumento de impostos.

Voltando às declarações de Luís Montenegro e às que se sucederão pela boca de outros até quinta-feira, haverá que encará-las como lamentáveis episódios de um jogo político grosseiro e primário, destinadas a pressionar um órgão de soberania que já demonstrou várias vezes que não é propriamente previsível nem sensível a esse tipo de práticas, venham elas de onde vierem.

Mas uma coisa é certa: esta alta tensão política criada a dias da decisão final do Tribunal Constitucional fica mal a quem a faz e dá de Portugal, um país já afectado por um conjunto de problemas que se projectam no exterior, uma lamentável ideia de instabilidade e incompetência, a acrescentar à projecção nefasta da crise do BES mencionada por todo o mundo.

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