Ana
Sá Lopes – jornal i, editorial
Se
o Estado não quer regular o sistema financeiro, a culpa não é do banco
Reler
o prospecto do último aumento de capital do BES à luz dos últimos
acontecimentos é um exercício de choque e pavor, agravado evidentemente para
todos os que decidiram investir e hoje estão remetidos ao “banco mau”.
A
operação teve o aval da Comissão de Mercados de Valores Mobiliários mas, ainda
que a CMVM seja obrigada a aprovar o prospecto – “verificar a sua conformidade
com as exigências de completude, veracidade [...] e licitude da informação”,
segundo o n.o 5 do art.o 118.o do Código de Valores Mobiliários, isso não
significa que seja responsável pelas mesmas coisas logo dois artigos depois.
Ora veja-se o n.o 7 do art. 118.o, que estabelece que “a aprovação do prospecto
não envolve “qualquer garantia quanto ao conteúdo da informação, à situação
económica ou financeira do oferente [...] à viabilidade da oferta ou à
qualidade dos valores mobiliários”. Assim, a CMVM garantiu a “veracidade” e a
“licitude da informação”, mas não tem de dar qualquer garantia do “conteúdo da
informação” e pelos vistos muito menos relativamente da “qualidade dos valores
mobiliários”. Isto é o que está na lei. A aprovação da CMVM é igual ao litro e
Carlos Tavares pode lavar as suas mãos, porque ninguém neste país regula lá
muito bem. Foi com a total impunidade que o BES foi vendido àqueles que seriam
os seus últimos “bons” accionistas como o banco exemplar da economia portuguesa
nas barbas da CMVM e do Banco de Portugal que neste processo estão a fazer de
anjinhos.
Mais
grave: na tentativa de salvar a pele, Carlos Costa veio informar os portugueses
que tinha detectado fraudes no BES em Setembro de 2013. Vai fazer um ano. Se
assim foi, Carlos Costa tem de explicar aos portugueses o que andou a fazer
este tempo todo. Aparentemente não andou a regular bem.
Os pequenos accionistas que foram ao aumento de capital e agora ficam arrasados
no “banco mau” também são contribuintes e confiaram na palavra dos reguladores,
que sempre apresentaram o banco como o divino Espírito Santo. A catástrofe
Espírito Santo é um caso de polícia, naturalmente, cheio de lições sobre a
ganância financeira, a irresponsabilidade da banca, a inacreditável relação de
abuso e confiança com o poder político e com empresas amigas. Mas é mais uma
vez a prova de que em Portugal não se regula bem. E se o sistema financeiro não
consegue regular bem, o problema não está nos banqueiros – é um problema de
exclusiva responsabilidade política.
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