Rafael
Barbosa – Jornal de Notícias, opinião
1
- De acordo com a propaganda governamental, o país já está a virar a página. O
desemprego já desce (o que não é sinónimo de emprego a crescer), o défice
público cumpre-se (ainda que isso se fique a dever à sobrecarga de impostos
sobre trabalhadores e consumidores), o Produto Interno Bruto já sobe (ainda que
com valores mais anémicos a cada mês que passa). Sempre que alguns destes
indicadores dão uma ajuda, não faltam candidatos a deitar foguetes e apanhar as
canas. A começar por Passos Coelho e Paulo Portas.
Pena
que nenhum deles pareça interessado em comentar o último relatório da OCDE
sobre o impacto da crise no ensino e no acesso ao mercado de trabalho. O que se
passou até ao final de 2012 resume-se nisto: disparou para quase 17% o número
de jovens entre os 15 e os 29 anos que não estudam, nem trabalham (são os
jovens da geração nem-nem); disparou para mais de 11% o número de desempregados
licenciados; o investimento em educação, bem como o custo por aluno no Ensino
Superior, caiu para o fundo da tabela dos países desenvolvidos; os salários dos
professores desceram 16%; as baixas qualificações dos portugueses continuam a
bater recordes. Convém lembrar que 2013 conseguiu ser um ano mais negro do que
2012. E que em 2014 se manteve o miserabilismo. Se este relatório da OCDE já
deveria ser suficiente para fazer corar de vergonha os nossos governantes, o do
próximo ano arrisca-se a revelar uma realidade catastrófica. Infelizmente já
não para o futuro do Governo, mas para o futuro do país.
2
- Bastou uma sondagem a dar como certa a vitória do "sim" à
independência da Escócia e os ingleses entraram em pânico. Ou melhor, a
"City" (centro financeiro global sediado em Londres) e o regime
político entraram em
pânico. Afinal de contas, os escoceses não são apenas conhecidos
pelos kilts de padrões coloridos, consoante o clã. É também do seu Mar do Norte
que se extrai uma considerável quantidade de petróleo. Ainda por cima
"brent", aquele tipo de petróleo de boa qualidade que serve de
referência para fixar preços a nível mundial. Os líderes dos partidos do
"arco do poder" britânico (lá como cá) esqueceram divergências e
foram em peregrinação coletiva para lá da muralha de Adriano. Ainda que
resulte, não deverá ser apenas mais do que um adiamento. O enfraquecimento dos
estados é um fenómeno imparável. Haverá de seguir-se a Catalunha, como o País
Basco, da mesma forma que a Valónia e a Flandres (Bélgica) são já praticamente
dois países diferentes. Sendo que nenhum destes povos é suicida: reclamam
autogoverno (a força do local) com a mesma convicção que reclamam manter-se na
União Europeia (a força do global). Esperemos que mais cedo do que tarde esta
discussão regresse também a Portugal. A do autogoverno regional, não
necessariamente a da independência.
Sem comentários:
Enviar um comentário