domingo, 28 de setembro de 2014

Portugal: PASSOS, RIO, SEGURO, COSTA E O PAÍS



Paulo Ferreira – Jornal de Notícias, opinião

A importância do que hoje se joga nas eleições primárias do PS está muito para lá da mera escolha do novo líder socialista e futuro candidato a primeiro-ministro. Vença quem vencer, o dia seguinte nascerá com duas inevitabilidades. O sangue das navalhadas dadas durante este combate começará a correr em abundância. Até agora, a coisa foi-se amenizando com curativos; a partir de agora, estará exposto um partido em carne viva, carregado de feridas muito difíceis de curar. Por outro lado, as pedras colocadas no xadrez político começarão a mover-se bastante mais às claras e com bastante mais vontade de ganhar posição, sobretudo dentro do PSD.

A turbulência será maior se vencer António Costa. Por duas razões. O PSD sabe que o atual presidente da Câmara de Lisboa é, por estes dias, o mais forte íman do descontentamento: é para ele que olham os que, tendo poder e influência, desejam uma alternativa a Passos Coelho; é para ele que olham os portugueses que gostam de vozes encantatórias, aquelas que, para o bem ou para o mal, enfeitiçam o povo, por serem facilmente audíveis e entendíveis.

Por outro lado, Costa garante mais depressa do que Seguro uma candidatura de António Guterres à presidência da República. O partido deseja ardentemente o regresso de Guterres. O tempo, o notável trabalho que tem feito como Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados e a afabilidade do ex-primeiro-ministro são suficientes para que o passado seja relevado pelo povo eleitor.

A dupla Costa-Guterres é eleitoralmente poderosa. É por isso que no topo da pirâmide social-democrata se desenham e definem cenários para enfrentar o que aí vem. Há em (quase) todos eles um nome comum: Rui Rio. Para quem está perto de Passos, o ideal seria uma candidatura a Belém do ex-autarca do Porto. Para quem está mais afastado, Rio é um trunfo essencial para apear Passos, chegue, ou não, a legislatura ao fim.

Sucede que Rui Rio é, a cada dia que passa, mais um problema do que uma solução. Por causa de tanta cautela, seja ela tática ou não, Rio arrisca-se a ficar sozinho, sem tropas nem apoiantes de topo, definitivamente longe de cumprir o sonho de revirar o regime. Nessa altura talvez se arrependa de ter andado a brincar às conferências, de ter escrito biografias em registo narcísico, de ter incentivado guerras inúteis com Rui Moreira, de esperar por uma vaga de fundo que, afinal, nunca chegou. Ter-se-á perdido, quiçá, um grande estadista...

Aceitando que o país teria a ganhar com uma coligação Costa-Rio, não é indiferente chegar à mesa da negociação na qualidade de vencedor ou perdedor. O ex-presidente da Câmara do Porto sabe disso. O PSD também. E é precisamente por isso que, depois de conhecidos os resultados das primárias, é chegada a hora de Rio dizer o que quer. Ou não quer.

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