segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Ativistas temem que novo ministro indonésio da Defesa afete relação com Timor-Leste




Jacarta, 02 nov (Lusa) - Organizações não-governamentais (ONG) de direitos humanos receiam que o novo ministro indonésio da Defesa, Ryamizard Ryacudu, um antigo chefe do Estado Maior do Exército envolvido em polémica, prejudique a cooperação entre a Indonésia e Timor-Leste.

Rafendi Djamin, diretor executivo do Grupo de Trabalho dos Direitos Humanos (HRWG, na sigla inglesa), que congrega várias ONG indonésias, alerta que a boa cooperação entre os dois países na área da defesa "tem de ser acompanhada de perto", porque potencialmente Ryamizard Ryacudu "irá interromper essa relação".

Timor-Leste tem cooperado com o país vizinho em várias áreas, incluindo na formação das forças armadas, e comprado material bélico à Indonésia, mas os dois países ainda têm questões fronteiriças terrestres e marítimas por resolver.

"É uma questão de mentalidade, que é difícil de mudar", justifica Rafendi Djamin, esclarecendo que o novo governante "lamenta profundamente" que a antiga província de "Timor-Timur", onde combateu, tenha conquistado a independência e é alguém que receia a "infiltração de interesses estrangeiros" na Indonésia.

John Miller, da Rede de Ação para a Indonésia e Timor-Leste (ETAN, na sigla inglesa), prevê uma cooperação pragmática entre os exércitos dos dois países, embora admita que, se fizesse parte do governo timorense, estaria "um pouco preocupado, não quanto à atitude do Presidente, mas em relação à atitude do ministro da Defesa".

O ativista considera que "ter uma boa relação com Timor-Leste é uma forma de o governo indonésio mostrar o quanto eles mudaram", mas lembra que a atividade militar aquando do referendo de 1999, que ditou a independência timorense e que culminou numa onda de violência que fez mil mortos, "não foi algo que o [então] Presidente Habibie quisesse".

Já Rizal Darma Putra, do Instituto Indonésio para Estudos Estratégicos e de Defesa (Lesperssi, na sigla indonésia), acredita que a cooperação militar "ainda será possível no futuro" e extensível a outros campos, sugerindo uma definição de "como implementar a aplicação da lei, especialmente na fronteira entre Timor-Leste e a Indonésia".

Porém, o analista entende que, devido às alegações de violações de direitos humanos que recaem sobre Ryamizard Ryacudu, a Indonésia "terá dificuldade" em cooperar com a Austrália na área da segurança.

Ativistas de direitos humanos acusam o exército indonésio sob liderança de Ryamizard Ryacudu de ter cometido abusos contra grupos separatistas de Aceh, na ilha de Sumatra, e da Papua Ocidental.

Em 2003, o ex-general apelidou de heróis os soldados detidos por terem morto um líder da Papua Ocidental favorável à independência daquela província.

Ryamizard Ryacudu, com quem a Lusa tentou falar sem sucesso, negou recentemente ter cometido qualquer violação de direitos humanos durante os 35 anos em que esteve nas forças militares.

A escolha do novo ministro da Defesa é vista por vários analistas como uma cedência política do Presidente eleito, Joko Widodo, ao Partido Democrático Indonésio da Luta (PDI-P), liderado pela antiga presidente do país, Megawati Sukarnoputri, que também se opôs à independência timorense.

O novo Presidente indonésio, que não conta com o apoio da maioria no Parlamento, defende uma aposta no mar no âmbito da sua política para desenvolver o país, sendo para tal prioritária a resolução de questões fronteiriças e de segurança.

John Miller, da ETAN, considerou "muito estranha" a escolha de um ministro da Defesa proveniente do setor militar, frisando que "uma das principais reformas" da democracia indonésia tem sido "indicar civis para ministros da Defesa".

Embora não acredite que as forças armadas venham a recuperar o poder político de que gozaram outrora, Rafendi Djamin, da HRWG, receia que a reforma do código penal militar indonésio continue "por acabar" e denuncia casos de "impunidade" em crimes cometidos por militares.

Vários ativistas entendem que Joko Widodo terá "dificuldade" em fazer cumprir as promessas eleitorais de abordar as violações de direitos humanos ocorridas no passado.

Rizal Darma Putra, do Lesperssi, lembra mesmo que o Presidente indonésio conta com o apoio de vários ex-generais cujos nomes foram associados a violações de direitos humanos em Timor-Leste, como Wiranto.

AYN// APN - Lusa

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