Carvalho
da Silva – Jornal de Notícias, opinião
Portugal
pode receber da União Europeia (UE) nos próximos sete anos, contados
teoricamente desde janeiro passado, cerca de 25,8 mil milhões de euros.
Entretanto, o sr. Juncker anunciou esta semana que a UE vai reunir 315 mil
milhões de euros para um novo fundo europeu para o Investimento Estratégico.
Neste cenário, com um país anestesiado por sucessivos casos de negócios sujos e
fraudes, casos de perda de memória de governantes ou de suspeita de corrupção,
o Governo acelera a sementeira de ilusões junto do povo.
Os
portugueses têm direito a ser informados sobre tudo o que os fundos europeus
envolvem e significam.
Devemos
saber quanto Portugal vai contribuir para a UE neste período, para além dos
milhares de milhões de euros a pagar em juros em resultado do programa que nos
impuseram. Em segundo lugar, é preciso ter presente que para fazer a aplicação
dos 25,8 mil milhões o país tem de dispor de verbas próprias, pois a aplicação
dos fundos europeus impõe investimentos nacionais. Ora, o serviço da dívida e
as imposições do Tratado Orçamental, a não se alterarem, vão colocar-nos na
penúria em pouco tempo. Em terceiro lugar, há que definir uma estratégia de
desenvolvimento para o país que tenha em conta a sua condição de membro da UE,
mas que não se deixe aprisionar nela.
Despejar
dinheiro público nos bolsos de uns quantos empresários não resolve os problemas
estruturais da economia e muito menos é solução para criar emprego. Em 2013, em
contexto de crise, o investimento privado ultrapassou os 22 mil milhões. O que
significam alguns milhares de milhões em sete anos? O fundamental do
investimento privado tem de ser feito pelo sistema financeiro, mas este está
atolado em contradições e fragilidades (foi causa de descapitalização e
atrofiamento de muitas empresas), voltado para favorecer o enriquecimento de
alguns pela via da especulação financeira e de negócios de ocasião e não para
apoiar a produção de bens e serviços que criem valor.
O
país precisa de investimento com retorno em emprego sustentável, o que deve levar-nos
a uma discussão muito séria sobre os programas a adotar, as formas de aplicação
do dinheiro disponível e a monitorização dos resultados. Processos de
camuflagem do desemprego, ou a colocação de estagiários trabalhando
gratuitamente nas empresas privadas em substituição de trabalhadores
permanentes, têm de ser postos de lado.
Os
principais problemas estruturais de Portugal são as baixas qualificações de
parte dos trabalhadores e de muitos empresários - no quadro de uma estrutura
produtiva frágil que não consegue acolher trabalhadores qualificados -, a
pobreza e as desigualdades, o abandono escolar precoce, a fraqueza e a
instabilidade do Estado social.
O
Governo tem-se servido de fundos europeus para desorçamentar o Ministério da
Educação e prepara-se para aprofundar esta via. Com que educação e formação
ficaremos quando acabarem os fundos? Na Segurança Social querem pegar em cerca
de 1,5 mil milhões de euros e consolidar uma "Reforma Estrutural" de
passagem dos serviços sociais para as ONG (em particular IPSS ),
desorçamentando-a perigosamente; fazer recuar o país da solidariedade social
para a caridade assistencialista, aumentando as promiscuidades público/privado
e o caciquismo.
Quanto
às expectativas do fundo do sr. Juncker não haja ilusões. Citando José Castro
Caldas, digo que se trata de uma "engenharia catastrófica" e de uma
"gigantesca PPP", na qual o dinheiro dos privados que entrar no
financiamento da operação ficará sempre a coberto de seguras garantias públicas
(que o povo pagará se necessário) e com chorudos resultados garantidos.
Dizem-nos
que o Banco Central Europeu (BCE) não pode ser "máquina de fazer
dinheiro" quando reclamamos que financie diretamente o investimento. Mas
pode ser máquina de fazer dinheiro para garantir negócios chorudos aos
acionistas parasitários dos bancos e instituições privadas, ou para lhes
comprar lixo tóxico. Dizem-se e contradizem-se com toda a desfaçatez.
Exijamos
ética, transparência e verdade.
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