Luís
Rosa e Sílvia Caneco – jornal i
Ricardo
Salgado e Amílcar Morais Pires são considerados suspeitos de práticas
contra-ordenacionais. Ex-líder do BES arrisca-se a não poder ser banqueiro
durante dez anos
Desde
12 de Agosto que uma equipa de 50 pessoas da Deloitte, sete membros do Banco de
Portugal (BdP) e elementos da CMVM (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários)
estão concentrados em analisar os actos de gestão e olhar para a contabilidade
do Banco Espírito Santo (BES). Foram recolhidos milhares de documentos, ouvidas
dezenas de pessoas e endereçadas cartas-convite a todos os elementos da
comissão executiva do BES para que prestem esclarecimentos até à próxima
sexta-feira.
Até
ao momento já foram concluídas quatro das cinco linhas de investigação. A
auditoria confirma muitas das desconfianças que já eram públicas e traz também
revelações. Em causa estão suspeitas de quatro ilícitos contra-ordenacionais
especialmente graves, não só em Portugal, como no Panamá, Suíça, Luxemburgo e
Angola.
Ricardo
Salgado arrisca-se à pena máxima de inibição de funções no sector bancário
durante dez anos. Os trabalhos até agora desenvolvidos na auditoria apontam
para indícios de que alguns dos elementos da anterior comissão executiva do
BES, liderada por Salgado, terá praticado actos dolosos de gestão ruinosa, em
detrimento de depositantes, investidores e demais credores; falsificado a
contabilidade; desobedecido a determinações do Banco de Portugal (BdP) e
prestado informações falsas ou incompletas ao supervisor. Todas são infracções
especialmente graves, previstas no Regime Geral das Instituições de Crédito e
Sociedades Financeiras. Ao que o i apurou, os auditores da Deloitte recolheram
fortes indícios contra Ricardo Salgado e o seu número dois, Amílcar Morais
Pires.
No
exercício que ficou conhecido como auditoria forense – apesar de na verdade se
chamar auditoria especial para apuramento de irregularidades –, já foram
concluídas as investigações sobre a alegada utilização da Eurofin para
descapitalizar o banco nas últimas semanas do mandato da anterior administração,
a violação das determinações do Banco de Portugal, a colocação de dívida do
Grupo Espírito Santo (GES) nos clientes do BES e nos clientes ESAF, e a relação
entre o BES e o BES Angola (BESA), nomeadamente a nível do apuramento de
responsabilidades dos administradores do BES.
A
sociedade suíça Eurofin Securities está no centro de um esquema que, como o i
explicou em Outubro, terá permitido tirar pelo menos 800 milhões de euros do
BES numa altura em que os Espírito Santo já tinham todas as indicações de que
iriam ser afastados do banco. Quatro sociedades-veículo criadas pela Eurofin –
mas que se suspeita serem controladas pelo BES – terão sido usadas para pagar
dívida do grupo mas há também a convicção de que parte do dinheiro retirado ao
banco nas últimas semanas não foi parar ao grupo, mas a parte incerta.
Como
a “SIC” adiantou este domingo, milhares de euros terão saído para contas cujos
beneficiários são ainda desconhecidos: só a cooperação internacional, numa
primeira fase com os supervisores bancários de outros países, permitirá
responder à pergunta: para onde foi este dinheiro?
Ao
que o i averiguou, o dolo da comissão executiva do BES está em risco de ser
especialmente agravado porque se suspeita que a engenharia financeira que
passava pela sociedade suíça especializada em investimentos financeiros já
tinha sido usada por altos quadros do BES e não apenas em 2014, numa manobra
alegadamente controlada pelo administrador Amílcar Morais Pires e pela
directora financeira Isabel Almeida, do Departamento Financeiro de Mercados e
Estudos do BES.
O
esquema da Eurofin cruza-se ainda com a suspeita da colocação de dívida do GES
nos clientes do BES. Como estava proibido de emitir dívida directamente junto
dos clientes, no âmbito do chamado plano de “ring fencing” imposto pelo Banco
de Portugal em Dezembro de 2013 (o BES não podia ser contaminado pelos
problemas financeiros do GES), o grupo terá recorrido à Eurofin, a quatro
sociedades-offshore (entre elas a EG Premium, com sede nas ilhas virgens
britânicas) e a outras instituições financeiras para colocar dívida em clientes
do banco com gestão discricionária de carteiras, disfarçando a sua origem.
As
relações entre o BES, o GES e a Eurofin determinaram um registo de perdas nas
contas do banco no valor total de 1249 milhões de euros. Este é um dos pontos
em que se suspeita ter havido violação directa das determinações do Banco de
Portugal. Há ainda outra operação que obrigou ao reconhecimento de perdas nas
contas semestrais do banco no valor de 267 milhões de euros e que terá sido
feito à revelia do supervisor: a emissão de duas cartas-conforto, que
funcionavam como garantias a investidores institucionais venezuelanos que terão
investido em papel comercial de holdings do ramo não financeiro do GES.
A
relação entre o BES e o BES Angola foi também passada a pente fino pelos
auditores da Deloitte. Em causa está uma avaliação sobre se existiu exposição
directa ou indirecta do grupo financeiro e dos seus clientes ao banco angolano
e quais os eventuais delitos que a administração do BES terá cometido na sua
relação com a subsidiária.
O
que acontecerá agora? A data de 14 de Novembro nunca esteve em cima da mesa
para apresentação das conclusões e ainda não há uma data prevista para o
desfecho. A fase de recolha de prova está terminada mas falta produzir os
relatórios. Quando forem encerrados, os relatórios da Deloitte irão integrar os
processos de contraordenação que estão a decorrer no BdP e as suspeitas de
práticas criminais – que irão ser desenvolvidas no último capítulo de cada
relatório – serão enviadas para o Ministério Público.
A
necessidade de cooperação internacional para averiguar eventuais práticas
ilícitas que passaram pelo Luxemburgo, Suíça, Panamá e Angola é agora o maior
entrave às investigações, sendo expectável que a Suíça e o Luxemburgo sejam os
países mais cooperantes por também precisarem de informações para as
investigações que já dirigem contra holdings do Grupo Espírito Santo.
Foto:
António Pedro Santos
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