Há,
em Portugal, cidadãos que nunca poderão ser humilhados pela justiça como está a
ser José Sócrates: os magistrados.
António
Marinho Pinto – Correio da Manhã, opinião
A
detenção do antigo primeiro-ministro José Sócrates levanta questões de ordem
política, de ordem jurídica e de cidadania. Mais do que a politização da
justiça, ela alerta-nos para a judicialização da política que está em curso no
nosso país.
José
Sócrates acabou, enquanto primeiro-ministro, com alguns dos mais chocantes
privilégios que havia na sociedade portuguesa, sobretudo na política e na
justiça. Isso valeu-lhe ódios de morte. Foi ele quem, por exemplo, impediu o
atual Presidente da República de acumular as pensões de reforma com o
vencimento de presidente.
A
raiva com que alguns dirigentes sindicais dos juízes e dos procuradores se
referiam ao primeiro-ministro José Sócrates evidenciava uma coisa: a de que, se
um dia, ele caísse nas malhas da justiça iria pagar caro as suas audácias. Por
isso, tenho muitas dúvidas de que o antigo primeiro-ministro esteja a ser alvo
de um tratamento proporcional e adequado aos fins constitucionais da justiça
num estado civilizado.
É
mesmo necessário deter um cidadão, fora de flagrante delito e sem haver perigo
de fuga, para ser interrogado sobre os indícios dos crimes económicos de que é
suspeito? É mesmo necessário que ele, depois de detido, esteja um, dois, três
ou mais dias a aguardar a realização desse interrogatório?
Dir-me-ão
que é assim que todos os cidadãos são tratados pela justiça. Porém, mesmo que
fosse verdade, isso só ampliava o número de vítimas da humilhação. Mas não é
verdade. Há, em Portugal, cidadãos que nunca poderão ser humilhados pela
justiça como está a ser José Sócrates: os magistrados. Desde logo porque juízes
e procuradores nunca podem ser detidos fora de flagrante delito.
Em
Portugal, poucos, como eu, têm denunciado a corrupção. Mas, até por isso,
pergunto: seria assim tão escandaloso que um antigo primeiro-ministro de
Portugal tivesse garantias iguais às de um juiz ou de um procurador? Ou será
que estes, sim, pertencem a uma casta de privilegiados acima das leis que
implacavelmente aplicam aos outros cidadãos?
A
justiça não é vingança e a vingança não é justiça. Acredito que um dia, em
Portugal, a justiça penal irá ser administrada sem deixar quaisquer margens
para essa terrível suspeita.
Carlos
Alexandre - Está há vários anos no Tribunal Central de Instrução Criminal
e por lá ficará o tempo que quiser, pois os juízes são inamovíveis. Tempos
houve em que um juiz não podia permanecer num tribunal mais do que seis anos
(era a regra do sexénio) e, por isso, recebia um subsídio para a habitação.
Porém, desses tempos, só resta, hoje, o dito subsídio, bem superior, aliás, ao
salário mínimo nacional e totalmente isento de impostos.
Duarte
Marques - Este deputado do PSD veio manifestar publicamente júbilo pela
detenção e humilhação pública de Sócrates, com o célebre ‘aleluia’. Era
evitável a primária manifestação de ódio quando até a ministra da Justiça nos
poupou ao habitual oportunismo político. Talvez mais cedo do que tarde se
cumpra a sentença de Ezequiel: "Os humildes serão exaltados, e os
exaltados serão humilhados."
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