terça-feira, 17 de março de 2015

O ANO DA GRANDE VIRAGEM PARA ANGOLA – I


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Martinho Júnior, Luanda 

1 – A “Associação Tchiweca de Documentação”, tirando partido dum longo trabalho que tem vindo a realizar, desde alguns anos também em frutuosa colaboração com o “Novo Jornal”, a 12 de março de 2015 e no auditório do Museu Militar em Luanda, lançou o livro “1961 – Memória dum ano decisivo”.

A iniciativa, que integrou a sinalização dos 50 anos do início da Luta Armada em prol da independência de Angola (2011) e dos 40 anos da Independência (2015), é por si um passo que preenche bastas lacunas sobre o conhecimento histórico em relação a Angola, de tal maneira bem concebido que a sua leitura pode permitir também abordagens antropológicas, sociológicas e psicológicas indispensáveis para a compreensão dos fenómenos que se referem a 1961 como “o ano da grande viragem para Angola”.

A “Associação Tchiweca de Documentação” consegue transportar o feliz leitor ou estudioso do compêndio, ao ambiente da época no interior e no exterior de Angola, sempre com o foco no início da Luta de Libertação, com uma cuidadosa objectividade, podendo ser considerado nesse aspecto como um trabalho vanguardista no que à história diz respeito, tendo em conta a existência de tantas sensibilidades! 

2 – À capacidade que a ATD possui de utilização de muita documentação, está-se a juntar um trabalho que resulta do esforço de elaboração do tema “Angola nos Trilhos da Independência”, traduzido na recolha oral e na 1ª pessoa de muitos depoimentos sobre a Luta de Libertação em África, recolha essa acompanhada de visitas reportadas aos locais de muitos acontecimentos relevantes e dum acervo documental em crescendo, acompanhado de fotos raras, que testemunham a saga dos africanos e de Angola, em prol da justa Luta de Libertação contra o colonialismo em África (e também na Ásia, tendo em conta o caso da derrota do Estado Novo na Índia, de que este compêndio também se refere, com notável sentido de objectividade histórica).

Nesse aspecto o compêndio “1961 – Memória dum ano decisivo”, consegue ir além dos livros já publicados pela ATD, ao transmitir-nos mais elementos sobre o ambiente da época, ao conferir vida à expressão da torrente daqueles que um dia partiram para a Luta por que nada mais havia a fazer perante a teimosia alucinante do fascismo e da colonização.

É impressionante a decisão de tantos milhares e milhares de jovens de então, que tornaram a fuga ao colonialismo como um dos seus primeiros actos patrióticos e revolucionários, o que por si só é ainda hoje muito oportuno lembrar, perante alguns que procuram “lavar a história” e o papel do Estado Novo na opressão que se abatia sobre milhões de africanos… em pleno século XX!
  
3 – Os três acontecimentos que marcam o início da Luta Armada de Libertação Nacional em Angola, são lembrados todos os anos e por isso abrem o livro: o 4 de janeiro, que se refere à revolta camponesa da Baixa do Cassange, o 4 de fevereiro, que destaca a revolta urbana em Luanda e o 15 de março, que lembra a explosão camponesa que se fez sentir em todo o norte de Angola.

O livro reúne numa primeira parte esses acontecimentos, para depois se debruçar sobre a Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas (“CONCP”), a União Nacional dos Trabalhadores Angolanos (“UNTA”), o Pan-Africanismo e Solidariedade com Angola, o caminho da Luta, o Corpo Voluntário Angolano de Assistência aos Refugiados (“CVAAR”), as organizações estudantis, os primeiros esforços no sentido de armar a Luta, uma síntese do percurso desde então aberto e terminando com algo que muito raramente é lembrado, mas tem completo cabimento: a “maka” de Goa e as ligações afro-asiáticas!
  
4 – É evidente que o livro não esgota o tema, também por causa do foco que foi considerado, que é justo, ou seja, a todo o transe não se perder a memória histórica que recolhe a experiência de tantos intervenientes, na 1ª pessoa e apesar de se passarem já tantos anos em suas vidas.

Por exemplo, há um imenso trabalho de pesquisa em relação a todos os que no exterior, duma forma ou de outra, se relacionaram com o fenómeno do início da Luta Armada nas então colónias portuguesas, desde arquivos individuais, aos de várias organizações, aos de muitos estados, incluindo dos seus serviços de inteligência.

Há também toda uma perspectiva de luta de classes, a partir duma esteira sócio-económica, a um dia dar uma melhor atenção…

Os depoimentos expressos denotam um trabalho de rigor, que não dá margem à subjectividade, podendo-se considerar que o trabalho que nos transmite a universidade da vida da geração jovem dos anos 60 do século passado, está de tal maneira sensível no compêndio, que interessa aos universitários de África duma forma geral e, muito em particular, àqueles que se debruçam sobre a história contemporânea e ao papel do Movimento de Libertação, com reflexos nos nossos dias e no futuro!

É por esta e por outras que Angola se me afigura, apesar dos tremendos obstáculos, riscos, sacrifícios e vulnerabilidades de toda a ordem, inequivocamente um país com rumo!!!

Foto da capa do compêndio “1961 – Memória dum ano decisivo”.

Consultas obrigatórias:
- “Associação Tchiweca de Documentação” – ATD – https://sites.google.com/site/tchiweka/
- “Angola nos Trilhos para a Independência” – http://projectotrilhos.com/pt/home
- “Novo Jornal” – http://www.novojornal.co.ao/

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