quinta-feira, 2 de julho de 2015

Académico moçambicano defende diversificação da base económica do país




O economista moçambicano Carlos Nuno Castel-Branco defendeu hoje a diversificação da base económica de Moçambique, considerando que o modelo atual centra-se na "especulação de expetativas" sobre o setor energético, nomeadamente o gás natural recentemente descoberto no país.

"Nós precisamos mudar a nossa maneira de pensar à volta da economia e daquilo que são as nossas vantagens e desvantagens. Nós concentramo-nos muito a falar de recursos e dizemos que somos ricos porque temos gás e carvão, mas eu acho esse não é o ponto e, pelo contrário, a nossa economia é rica em problemas", disse à Lusa Carlos Nuno Castel-Branco, à margem da Conferência da Sociedade Civil sobre o Setor Extrativo em Moçambique, que terminou hoje em Maputo.

Para o académico, também diretor de Investigação do Instituto de Estudos Sociais e Económicos, em qualquer Estado, o motor da economia são os problemas, que variam consoante o contexto específico de cada realidade social.

"Dentro de Moçambique há problemas diferentes, colocados por diferentes grupos sociais em função do seu posicionamento relativamente aos processos de produção e apropriação de excedentes na economia. Essa sim é a nossa riqueza económica", declarou académico moçambicano.

De acordo com os dados apresentados pelo pesquisador, 75% da taxa do crescimento do Produto Interno Moçambicano (PIB) é desenvolvido à volta do núcleo do setor extrativo e 95% das exportações vêm também da mesma área, que emprega pouco mais de 40 mil pessoas.

"É óbvio que esta não é uma base de luta contra a pobreza como se diz, pelo contrário, essa base não emprega e nem cria nível de vida crescente para o grosso da população", afirmou Carlos Nuno Castel-Branco, considerando que Moçambique vive uma fase de acumulação primitiva de capital, liderada pelos capitalistas "domésticos", elites políticas internas que vivem na base do capital externo.

"Este capital desenvolve-se com dependência de fluxos de capitais externos e acesso barato a recursos naturais por via da expropriação do Estado", afirmou o académico, que alerta para a crescente privatização dos serviços públicos no país.

Para Carlos Nuno Castel-Branco, o Governo precisa definir prioridades sociais para uso do dinheiro público a partir de uma análise das necessidades imediatas do povo moçambicano, destacando, a título de exemplo, o atual problema de transporte.

"De ponto de vista imobiliário, os grandes projetos são importantes, mas eles não resolvem o problema do transporte, da qualidade da educação, do acesso ao emprego e nem da saúde", adiantou o pesquisador moçambicano.

Com advento da indústria extrativa em Moçambique, um novo debate surgiu, relativo à necessidade de formação de quadros para responderem à demanda do setor extrativo, o que levou instituições de ensino moçambicanas a introduzirem novos cursos da área dos recursos minerais e que são atualmente muito concorridos pelos estudantes devido a possíveis oportunidades de emprego.

"Atenção, quando nós focamos a educação em torno de áreas extremamente afuniladas da economia, como estas, reproduzimos este afunilamento a longo prazo", alertou, assinalando a necessidade de se diversificar a formação, como forma de abrir novas alternativas económicas no futuro.

Por seu turno, o também economista moçambicano João Mosca, durante a sua intervenção, voltou ao discurso que vem defendendo sobre a necessidade de reformulação das estratégias macroeconómicas, considerando que o modelo económico do país atualmente beneficia apenas elites moçambicanas e as multinacionais.

" O problema é que, no fundo, o modelo económico que nós temos persiste, o Estado moçambicano dá terra barata e benefícios fiscais exagerados aos investidores, e os moçambicanos dão mão-de-obra barata", lamentou João Mosca.

Cético quanto à rentabilidade dos recursos minerais, João Mosca entende que o país devia valorizar o setor agrário, reformulando as suas políticas e adotando estratégias macroeconómicas que beneficiem a agricultura, principalmente nas zonas rurais.

"Nós temos de atacar as raízes do problema e o problema está no modelo que adotamos", afirmou o professor da Universidade A Politécnica de Moçambique, exortando para a participação de toda sociedade civil nos processos de monitorização da atuação do Governo e das multinacionais no país.

Sob o lema "Por uma Governação Participativa, Transparente e Responsável dos Recursos Mineiras, a conferência de dois dias em Maputo juntou várias organizações moçambicanas e internacionais, académicos, empresários e estudantes.

Lusa, em Notícias ao Minuto

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