De
uma maneira geral, o novo Código Penal moçambicano tem muitos aspetos
positivos, considera Custódio Duma, presidente da Comissão Nacional dos
Direitos Humanos. Mas vários pontos não tiveram o devido tratamento, diz.
Por
exemplo, explica o jurista Custódio Duma, o Código Penal prevê penas para
violações de menores até aos 12 anos, quando a Carta Africana dos Direitos
Humanos considera menores pessoas com menos de 18 anos.
O
aspeto mais controverso da nova lei é precisamente a forma como trata como menores
apenas as crianças até aos 12 anos em vários crimes como a violação sexual.
Assim, quem violar um menor de 12 anos incorre na pena máxima de 24 anos, mas
se a vítima tiver menos de 16 o castigo baixa para oito anos.
Em
entrevista à DW África, o presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos
(CNDH) começou por falar dos pontos positivos do instrumento legal em vigor
desde 1 de julho de 2015 e que revoga um texto de 1886, quando Moçambique ainda
estava sob o jugo colonial português.
DW África: Que aspectos positivos apresenta o novo Código Penal?
DW África: Que aspectos positivos apresenta o novo Código Penal?
De
uma maneira geral, o novo Código Penal moçambicano tem muitos aspetos
positivos, considera Custódio Duma.
Custódio
Duma (CD): O primeiro grande ponto positivo é a entrada em vigor do
código. Na verdade, já estávamos com o código há mais de duas centenas de anos.
Por isso, Moçambique está de parabéns por ter quebrado um pouco este espírito
criminal de há dois séculos atrás e que estava imbuído de princípios religiosos
católicos e outros que já não se adequavam aos tempos modernos.
Em
segundo lugar, um aspeto importante também é a introdução de penas alternativas
à prisão. Hoje em dia, a prisão é contestada em vários círculos de pensamento
de discussão de assuntos criminais. E há outras medidas para que as pessoas
paguem pelos seus erros dignificando a sua própria pessoa e a sociedade que
eventualmente terá ofendido. A introdução dessas novas penas alternativas à
pena de prisão é positiva. Mostra uma evolução por parte do nosso direito
penal.
DW
África: Por outro lado, o novo Código Penal também pode ser considerado um
retrocesso se considerarmos a atual tendência de redução de penas. Porque o
Código prevê aumento de penas para algumas situações.
CD: De
facto, é um pouco contraditório. No geral, ele introduziu penas alternativas à
prisão, que é uma ideia que não quer eliminar a prisão em si, mas tornar a
prisão menos onerosa, tanto para aquele que está a cumprir a pena como para o
Estado. E introduz-se penas alternativas à prisão porque essas pessoas muitas
vezes continuam na sua própria casa e alimentam-se com aquilo que vão ganhando,
prestando serviços à comunidade. E o Estado deixa de investir muito nas
prisões.
Mas,
por outro lado, também agrava as penas que tínhamos de 24 anos e que agora
passam para 30, 40 anos. É um pouco contra-senso. Não é um contra-senso com o
próprio Código, mas com a evolução do direito criminal no mundo nos tempos
modernos. Quer dizer, para não dignificar o ser humano e esse será o grande
problema deste Código Penal.
DW
África: Que valor concreto tem a remoção de artigos que previam, por exemplo, a
criminalização do aborto e da homossexualidade, uma vez que não há relatos de
penalizações até hoje, apesar de o anterior Código ter vigorado por mais de cem
anos?
CD: Na
verdade, o valor é mais simbólico. Em primeiro lugar, os tais artigos não
criminalizavam, embora existisse um artigo que aplicava medidas de segurança,
mas não como se estivesse a praticar um ato doloso ou criminoso, como se
pretende dizer. Em Moçambique, essa questão ligada à homossexualidade tocava
numa situação de sensibilidade, porque o artigo mencionava atos contrários à
natureza, sem definir que atos contrários à natureza.
O
debate é o facto desse artigo, que pode criar confusão entre os juízes, ser
retirado do Código Penal. O Estado moçambicano está a emitir mensagens de mais
inclusão na sociedade moçambicana.
DW
África: O novo Código Penal estabelece uma pena para violações de crianças até
aos 12 anos, quando a Carta Africana dos Direitos Humanos prevê que são menores
pessoas com menos de 18 anos. Isso significa que muitos violadores continuarão
impunes?
CD: Cada
Estado acaba por determinar de forma legal quais são as idades das suas
crianças. Por isso é que temos muitas idades para designar criança ou menor.
Esta também é uma questão de harmonização legislativa na questão das idades e
da responsabilização ligada ao crime. Este nosso Código Penal , em algum
momento, não foi muito bem discutido em matérias como essa. São as lacunas que
o Código Penal deixou. Mas tínhamos uma oportunidade soberana de rectificar
isso no Código. E o legislador praticamente não deu muito espaço para discutir
isso. É uma matéria com a qual teremos de lidar e, se calhar, tem que ser
aprovada uma norma para poder conciliar esta questão das idades.
Nádia
Issufo – Deutsche Welle
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