Reginaldo
Silva – Rede Angola, opinião
Foi,
claramente, o primeiro grande e inequívoco aviso à navegação, a condenação esta
semana em Cabinda de Marcos Mavungo a um pesado degredo de seis anos, do qual
as pessoas que conhecem bem as suas fragilidades físicas têm algumas dúvidas
que ele conseguirá regressar são e salvo para os braços da sua esposa e filhos
e para o convívio de todos nós.
Esta
é, evidentemente, a perspectiva mais pessimista que ensombra nesta altura o
presente e o futuro do activista cívico, mas que não pode de forma alguma ser
ignorada, pois todos conhecemos mal ou bem qual é o (des)nível da nossa
“hotelaria penitenciária”.
E
por favor, não me venham dizer que há países onde, no domínio carcerário, a
situação é bem pior que a nossa, pois eu sei que há, mas também sei que quando
se comparam equipamentos sociais, o nivelamento nunca deve ser feito por baixo.
O
aviso dado segunda-feira em Cabinda pelo poder judicial é ostensivamente
político e não permite duas leituras, mesmo admitindo a hipótese que, em sede
de recurso, a pena de Marcos Mavungo venha a ser reduzida para seis meses, que
é o tempo de preventiva que ele já cumpriu, o que lhe possibilitaria sair
imediatamente da masmorra onde tem estado a vegetar este meio ano.
Não
modificarei da mesma maneira a leitura deste aviso, mesmo que o Supremo venha a
absolver Mavungo ou que posteriormente em caso de fracasso, o Constitucional
ainda possa dar razão aos argumentos da defesa.
Dizemos
isto numa altura em que ainda pairam no ar sérias dúvidas, a confirmar-se a
aceitação do requerimento de recurso, que ele venha a ser decidido dentro de um
prazo razoável para quem tem tanta sede de justiça e de liberdade.
Não
sendo em parte nenhuma do mundo a justiça um poder infalível, nem pouco mais ou
menos, há no caso de Marcos Mavungo cada vez menos dúvidas sobre os factos, por
mais que os queiramos distorcer ou manipular.
Terá
sido pois com alguma consolação que as pessoas que não duvidam da sua
inocência, ouviram o representante da UE em Angola que foi a Cabinda assistir o
julgamento dizer, ou deixar entender, que a única coisa que ficou provado neste
caso é que Marcos Mavungo é um activista cívico e que queria organizar uma
manifestação.
É
aqui que o aviso à navegação feito em Cabinda ganha todo o seu significado e
abrangência, pois Mavungo foi mesmo condenado por ser uma voz politicamente
incómoda e com alguma capacidade de mobilização social.
O
exemplo da condenação só poderá ser para quem a “carapuça servir”.
Mavungo
foi condenado por razões políticas, sendo tudo o resto o enredo de um complicado
processo de intenções que o atingiu de forma brutal, mas que está longe de se
esgotar na sua pessoa.
O
aviso é claramente para o conjunto da navegação que em todo o país se tem feito
nos últimos tempos ao sabor de correntes mais críticas em relação ao desempenho
do Executivo.
O
propósito é demasiado evidente para estarmos aqui a perder mais tempo a
trocá-lo por miúdos, exercício que pode, inclusivamente, até ser ofensivo para
a inteligência de pessoas mais sensíveis.
É
um aviso que tem ainda uma particularidade muito especial pois também quer
deixar bem claro que em Angola mais importante que a independência do poder
judicial em relação ao poder político é a solidariedade institucional entre os
dois poderes, com sendo a nova pedra basilar e convergente da arquitectura
desta República.
Depois
deste primeiro aviso, as atenções estão agora voltadas para o julgamento dos
próximos réus que são os “révus”, numa altura em que continua a não haver
acusação formalizada, o que quer dizer que ainda não há qualquer previsão para
o inicio da audiência.
Em
matéria de avisos, deste segundo processo não se esperam grandes novidades
tendo como referência o que acaba de acontecer a Marcos Mavungo, pelo que em
principio será mais do mesmo, a não ser que neste entretanto aconteça algum
desenvolvimento espectacular que possa fazer alterar a determinação do “rolo
compressor” posto em marcha.
Como
este nível, a nossa bolinha de cristal não está a ver nada que possa fazer
alterar o rumo traçado agora em Cabinda.
Antes
pelo contrário, considerando o “efeito Ana Gomes”, que poderá aconselhar a um
maior endurecimento do tom para evitar qualquer leitura mais favorável ao seu
impacto sobre o Executivo na sequência das recomendações feitas pela Resolução
do Parlamento Europeu.
Seja
como for e como primeiro impacto mais positivo, o “efeito Ana Gomes” já
conseguiu levar a TPA a organizar um inédito e acalorado debate político
contraditório em directo que juntou a mesma mesa duas figuras de proa da
oposição política num frente-a-frente com outras cinco afectas ao MPLA.
Apesar
do evidente desequilíbrio do painel, o debate revelou-se bastante produtivo e
esclarecedor da opinião pública sobre os últimos factos da actualidade, ficando
por saber se esta excepção vai ou não converter-se na regra de próximas
iniciativas idênticas do canal estatal na área do debate político.
A
ter em conta uma certa euforia que se apoderou das redes sociais, sobretudo na
valorização positiva do desempenho da dupla oposicionista, é muito difícil admitir
que a dose venha a ser repetida nos próximos tempos.
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