O
vice presidente da República, Manuel Vicente, o ministro da Casa de Segurança,
Manuel Helder Vieira Dias Kopelipa, são donos dos pujantes supermercados Kero e
da Pumangol e, agora, para gozar com a nossa cara, a filha do Presidente da
República, uma vez mais, para demonstrar que a crise é só para o pobre, vai
criar outra cadeia de supermercados, que vai crescer como cogumelos. Viva a
monarquia.
Miguel
Osório, um ex-quadro de topo da Sonae, é o administrador do novo projecto de
retalho em Angola, da empresária Isabel dos Santos e que vai operar a rede de
hipermercados “Candando”, representando o fim da parceria com aquele grupo português.
O
grupo Contidis, que vai operar sob a marca “Candando” (abraço), foi
apresentado em Luanda, em conferência de imprensa, na semana passada,
precisamente por Miguel Osório, que confirmou tratar-se uma empresa detida a
100% pela filha do presidente da República, prevendo um investimento de 400
milhões de dólares (356 milhões de euros) nos próximos cinco anos.
Anteriormente
tinha sido anunciada uma parceria entre Isabel dos Santos e o grupo Sonae
para a introdução de uma rede de hipermercados em Angola.
A
abertura da primeira loja “Candando”, de um total previsto de dez ao longo de
cinco anos, deverá acontecer no primeiro semestre de 2016, em Luanda, anunciou
Miguel Osório. Com 10.000 metros quadrados, esta primeira loja ficará instalada
no Shopping Avenida, em Luanda.
Tal
como o Folha 8 profusamente noticiou, Isabel dos Santos consumou agora o
divórcio com o grupo Sonae. Mau grado ser a accionista maioritária, Isabel
dos Santos comportava-se como única dona da empresa, exigindo que este negócio
fosse desenvolvido à imagem e semelhança dos ditames do regime. Isto é, ao
estilo “quero, posso e mando”.
Como
a Sonae, apesar de várias tentativas, não conseguiu digerir as regras peculiares
a quem, com a cobertura do seu pai, não olha a meios para atingir os (seus)
fins, Isabel dos Santos chamou a si a criação de mais uma empresa exclusivamente
sua e assim nasce a cadeia de hipermercados “Candando”.
Para
a dirigir foi buscar Miguel Osório que, indiferente às regras éticas de
reserva perante a entidade patronal em que trabalhava, a Sonae, abriu o jogo a
Isabel dos Santos. A empresária agradeceu. E como nos negócios em geral, e nos
com Angola em particular, não há ética nem reserva, ai está mais uma vitória
para o clã Eduardo dos Santos.
Miguel
Osório deu, em Luanda, uma conferência de imprensa em que anunciou a criação do
grupo Contidis (100% propriedade de Isabel dos Santos) que, a partir de agora,
vai pôr no terreno tudo o que a Sonae previra e estudara, mas com a marca
“Candando”.
De
acordo com Miguel Osório, Isabel dos Santos planeia investir 256 milhões de
euros durante os próximos cinco anos. O primeiro híper deverá ser inaugurado
no primeiro semestre de 2016, em Talatona, no shopping Avenida que – por mero
acaso – também é propriedade da filha do presidente vitalício de Angola.
Miguel
Osório, CEO da Conditis, afirma “que o novo ‘player’ vai apostar na crescente
exigência do consumidor angolano, considerando que ainda existe, no mercado da
distribuição moderna, um ‘défice de metro quadrado por habitante”.
Fazendo
uso do que diria se estivesse a falar da marca “Continente”, Miguel Osório diz
que a Conditis será uma referência no sector, e que a sua relação com os
produtores nacionais e a montagem de “infra-estruturas logísticas farão a diferença”.
Era
só uma questão de… poder
Sob
o título “Divórcio litigioso, por mútuo acordo ou (re)conciliação?”, o Folha 8
escrevia no dia 26 de Abril de 2015: “A possibilidade, que em grande parte era
uma realidade, da entrada dos hipermercados Continente em Angola parece ter a
certidão de óbito assinada. A Sonae e a Condis vão divorciar-se. Por mútuo
acordo? Talvez não.”
Não
mesmo. Isabel dos Santos, bem ao estilo democrático do seu pai, só acredita na
reconciliação desde que a outra parte faça o que ela quer. Simples.
Para
avançar com o projecto, uma cópia fiel do Continente e que foi surripiada à
Sonae, nomeadamente através da contratação de dois pesos-pesados (Miguel
Osório e João Seara) da equipa de Paulo Azevedo, Isabel dos Santos criou a
empresa Contidis.
Contidis?
Exactamente. A anterior, a que fora constituída em 2011 em parceria com a
Sonae, chamava-se Condis. De há muito que a Sonae sabia que, a qualquer
momento, Isabel dos Santos iria dar o golpe fatal à parceria. Acreditava,
contudo, que o faria de forma ortodoxa. Estava enganada. Nos negócios, a
filha do presidente vitalício de Angola, não olha a meios para atingir os
(seus) fins. É ela nos negócios e o pai na domínio do país.
Até
mesmo quando, em Março passado, viu dois dos seus quadros de topo zarpar para
Luanda, Paulo Azevedo ainda alimentou a esperança (já ténue) de que Isabel dos
Santos explicasse o que se passava. Esperou sentado.
A
equipa de Paulo Azevedo verificou que que rainha santa Isabel (dos Santos) –
dona de Angola (e de parte de Portugal) em parceria com o seu pai – apunhalou a
Sonae pelas costas ao contratar esses dois quadros de topo da área de retalho
que trabalhavam nesta parceria, Miguel Osório e João Seara.
A
dona da Condis nunca se preocupou com isso. É para o lado que dorme melhor.
Aprendeu isso no berço. Com os milhões que tem, a que junta os milhões que
precisar, Isabel dos Santos não dá ponto sem nó.
Chegou
a falar-se que o Continente estaria de portas abertas no nosso país no Verão
de 2015. A Sonae apostou forte. Constituiu uma equipa para acompanhar a abertura
dos hipermercados mas, é claro, primeiro foi necessário engolir uns tantos
sapos, o que fez esgotar os stocks de “alka seltzer” das próprias lojas.
Depois seguiram-se doses industriais de hóstias para tirar o pecado de
negociar com um dos regimes mais corruptos do mundo.
Nada
resultou. A estratégia de Isabel dos Santos foi seguida com todo o rigor. O
dinheiro compra tudo. E então quando o dinheiro não custou a ganhar…
O
projecto que marcaria a entrada do maior empregador privado português no território
angolano seria fruto de uma parceria estabelecida entre o grupo e, como não
poderia deixar de ser e corresponde à Lei da Probidade do nosso país, a
empresária e não se sabe quantas vezes milionária Isabel dos Santos.
A
Sonae não pode alegar ignorância. Melhor do que ninguém, Paulo Azevedo sabia
que quem sai aos seus não degenera. José Eduardo dos Santos é, para além de
chefe do Governo, o presidente de Angola desde 1979, sem nunca ter sido
nominalmente eleito, bem como do MPLA (partido que está no poder desde a
independência).
Hipermercados,
supermercados, lojas de conveniência, lojas de proximidade, restauração,
para-farmácias, livrarias, vestuário, desporto, electrónica, centros comerciais,
administração de imóveis, investimentos financeiros, telecomunicações,
software e sistemas de informação e media são as áreas do império fundado por
Belmiro de Azevedo, a Sonae.
Mas
como tudo na vida, Belmiro de Azevedo é muito diferente do seu sucessor
dinástico, o filho Paulo Azevedo. O pai, que nem ao domingo descansava, dizia a
mesma coisa em qualquer dia de semana. Hoje a estratégia é diferente. O filho
diz às segundas, quartas e sextas uma coisa, às terças quintas e sábados outra
coisa. E ao domingo vai à missa.
O
acordo com a Condis – detida maioritariamente, como também não poderia deixar
de ser e sempre respeitando o espírito e a letra da tal Lei da probidade, por
Isabel dos Santos – aconteceu ainda em 2011, sendo que o projecto previa a
abertura de uma rede de hipermercados Continente nosso país.
João
Seara era o homem forte do grupo para este projecto, sendo que deveria ocupar
o cargo de director executivo. A empresa nunca adiantou grandes pormenores,
dizendo apenas que “não estava definida nenhuma data em concreto, mas tanto a
Sonae como a Condis estão a envidar todos os esforços para proceder à abertura
da primeira unidade o mais breve possível”.
Neste
típico ziguezaguear chegou-se a uma previsão que parecia ter fundamento:
Verão de 2015. No terceiro trimestre do ano passado já se falava de equipas
mandatadas para começar a definir as gamas de produtos que seriam enviados para
Luanda e que se juntariam a outros aqui produzidos. A própria Condis tinha em
marcha a construção de uma infra-estrutura que acolheria as instalações do hipermercado.
A entrada da Sonae em Angola sofreu alguns contratempos, explicando-se assim a
relutância do grupo português em avançar com uma data concreta. A
internacionalização da empresa para o nosso país está em desenvolvimento desde
2012, ano em que a Sonae e a ANIP assinaram um contrato de investimento no
valor de 100 milhões de dólares, com vista à abertura de cinco hipermercados.
Todos
os atrasos poderiam ter a ver com o facto de, durante algum tempo, a Sonae ter
tido dificuldades em engolir as regras da corrupção angolana. Daí as coisas
não terem corrido tão bem como o inicialmente previsto, isto porque Paulo
Azevedo anunciara a 17 de Março de 2011 que a entrada da empresa no mercado
angolano poderia acontecer já nesse ano.
Fernando
Ulrich, presidente do BPI, banco presente em Angola desde 1996, poderá ter
tido um papel importante ao garantir a pés juntos que em Angola não há
corrupção. Ao ouvi-lo dizer que “o BPI nunca pagou nada a ninguém para obter
nada em troca como nem nunca ninguém nos pediu nada para fazer o que quer que
fosse em troca”, Paulo Azevedo (Belmiro não foi nessa) sorriu e mandou
avançar as suas tropas.
Em
abono da tese de Fernando Ulrich, recorde-se que o procurador português que
em tempos investigava o caso “BES Angola” ingressou no Banco Internacional de
Crédito (BIC), presidido pelo cavaquista Luís Mira Amaral, uma instituição de
capitais luso-angolanos que, mais uma vez, é dominada pela tal impoluta cidadã
Isabel dos Santos, que é filha do não menos impoluto cidadão José Eduardo dos
Santos.
Paulo
Azevedo reeditou a velha teoria de rapidamente e em força para… Angola.
Falhou na rota.
É
pena. Como muitos angolanos (muitos mesmo) vivem na miséria e raramente sabem
o que é uma refeição, estavam à espera de fazer incursões ao Continente, ou
melhor, aos caixotes do lixo do Continente, e lá encontrar restos quase novos
de comida.
A
Sonae assumiu que não é uma empresa filantrópica e, por isso, negoceia com os
donos do poder e, no caso de Angola, do país. E, como sempre, é muito mais
fácil negociar com dirigentes vitalícios do que com os que resultam de uma vida
democrática. Aliás, a família Azevedo gosta muito de viver em democracia. Já
se os outros vivem em ditadura, o problema é deles. O que importa é haver
gente com muitos dólares. E o regime tem fartura dessa espécie.
Folha
8 digital, 03 outubro 2015
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