sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Angola. Presos Políticos. VIGÍLIA POR LUATY BEIRÃO JUNTA CERCA DE 200 PESSOAS



Nenhum partido político se fez representar oficialmente no acto em solidariedade com o activista, em greve de fome há 18 dias.

Eram 18 horas quando os primeiros participantes chegaram junto da igreja da Sagrada Família, em Luanda. O ambiente estava calmo. Nas horas seguintes o grupo aumentou bastante (ao longo da vigília deve ter ultrapassado as 200 pessoas), cada participante pegou numa vela, acendeu-a e a partir dali sobrou a solidariedade e as palavras de ordem. Liberdade já – foi este o repto lançado às autoridades judiciais do país. Luaty Beirão luta pela vida após 18 dias em greve de fome.

O grupo de cidadãos incluía familiares e amigos de Luaty Beirão e dos restantes detidos, gente anónima, activistas dos direitos humanos, jornalistas e alguns nomes ligados à política, como Nélson Pestana “Bonavena”, Alexandra Simeão ou Justino Pinto de Andrade. Nenhum membro de algum partido político se fez representar oficialmente. Nem mesmo os partidos da oposição se associaram à vigília. Também não foram vistas outras figuras públicas.

Segundo Pedro Beirão, irmão de Luaty, que se foi desdobrando e ouvindo as pessoas presentes, a saúde do activista e rapper (também conhecido no meio artístico por Ikonoclasta ou Brigadeiro Mata Frakuz) está a deteriorar-se e “até beber água o faz sentir-se mal”.

A reunião, que tinha sido originalmente marcada para o Largo 1.º de Maio, em Luanda, foi à última hora transferida para a Sagrada Família. Às 17h45m já a Polícia tinha encerrado os acessos à praça central do Largo 1.º de Maio. Vários agentes fardados controlavam o acesso ao interior e ninguém circulava no perímetro junto à estátua de Agostinho Neto.

Já na Sagrada Família o cenário estava completamente livre. Normal. A igreja funcionava na sua liturgia católica, por vezes estridente, por vezes alheia ao que se passava cá fora, preocupada apenas com os seus pecados e com as suas virtudes. Na vigília também se entoaram preces, rezas católicas e universais, cantou-se o hino nacional e o poder popular. E gritou-se “Liberdade já e agora”. E as velas levantaram-se e os presentes repetiram em uníssono na noite escura. “Liberdade já e agora”.

Os 15+1 activistas estão detidos desde 20 de Junho, na sua maioria, enquanto Rosa Conde e Laurinda Gouveia, entretanto constituídas arguidas no mesmo processo, aguardam julgamento em liberdade. Nas últimas duas semanas, vários presos assumiram o início de uma greve de fome, em protesto pelo excesso de prisão preventiva (já passaram mais de 100 dias em cativeiro quando a lei apenas prevê um máximo de 90 dias, sem acusação formada). Mas, neste momento, apenas Luaty Beirão continua a manter a decisão de não aceitar quaisquer alimentos.

O despacho de acusação (que o Rede Angola consultou) foi, entretanto, enviado às partes interessadas. Mesmo que não cumpra os prazos previstos na lei, o Ministério Público (MP) acusa os activistas de “actos preparatórios de golpe de Estado”. Segundo a acusação, a reunião numa casa do bairro Vila Alice (era a sexta vez que realizavam este tipo de encontros), em Luanda, tinha como objectivo final a criação de um clima de instabilidade no país, rumo à destituição de José Eduardo dos Santos.

As provas apresentadas pelo MP cingem-se a uma suposta falsificação de documentos por alguns dos detidos (Nito Alves e Luaty Beirão), ao livro do autor norte-americano Gene Sharp com o título Da ditadura à democracia e a uma suposta associação da obra aos eventos da Primavera Árabe. Os advogados e familiares dos detidos continuam a afirmar que a suspeita não é motivo suficiente para a privação da liberdade por mais de 100 dias. E afirmam que todo o processo poderia ser instruído com os suspeitos em liberdade.

A vigília mantinha-se com muitos participantes agrupados, com velas na mão, junto à entrada principal da igreja da Sagrada Família, em Luanda, até depois das 22h.

Miguel Gomes Rede Angola – Foto Ampe Rogério/RA

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