sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Portugal. Jorge Lacão compara Francisco Assis a “ortodoxos de origem cubana” e cita Maquiavel



O dirigente socialista, escreve hoje, na edição em papel do "Diário de Notícias", uma carta aberta a Francisco Assis.

Jorge Lacão, dirigente socialista, escreve hoje, na edição em papel do "Diário de Notícias", uma carta aberta a Francisco Assis, opondo-se à posição crítica assumida pelo eurodeputado numa recente entrevista à RTP1 em relação ao processo de negociação do secretário-geral António Costa com os partidos à esquerda do PS para eventual formação de uma plataforma de Governo.
"Arrogância", "desistência", "abdicação", "subordinação aos ditames da direita" são qualificativos com que Lacão mima a posição assumida por Assis.

Recorde-se que na passada quarta-feira Francisco Assis, na "Grande Entrevista" a Vítor Gonçalves, na RTP1, mostrou-se contra um eventual Governo socialista, apoiado por Bloco de Esquerda e PCP, defendendo que cabe a Passos Coelho ser o próximo primeiro-ministro, e que este deveria esforçar-se para fazer entendimentos pontuais com os socialistas.

Reagindo a esta posição numa extensa carta aberta, Jorge Lacão, membro da Comissão Política do PS, critica Francisco Assis, dizendo que "a tua posição releva do manifesto preconceito que emana recorrentemente do pensamento doutrinário que perfilhas - o de que todo o posicionamento político formalmente à esquerda do PS decorre tendencialmente de uma atitude irresponsável".

Perante esta posição, Jorge Lacão questiona hoje: "para a esquerda ou, se preferires, para as esquerdas, é ou não legítimo e politicamente pertinente que se interroguem sobre a possibilidade de conferir corpo a uma alternativa de governo?".

Daí, o dirigente socialista parte para críticas mais fortes a Francisco Assis, acusando de "pertencer-te a ti a posição menos construtiva, face a um eleitorado que quis maioritariamente a mudança".

"Insustentável posição pelo que representa de desistência e de subordinação aos ditames da direita", acusa Jorge Lacão na mesma carta aberta a Francisco Assis.

"(...) Para fazer compromissos é necessário revelar maturidade e capacidade políticas. Acontece, meu caro Francisco Assis, que desta vez a arrogância, pelo menos à cabeça, está do teu lado quando inviabilizas qualquer esforço de superação de um dos maiores traumas da esquerda portuguesa, o seu desentendimento crónico", ataca Jorge Lacão.

Este membro histórico do PS entende que "fechar a porta a quem finalmente dá sinais de a querer abrir consistiria num erro histórico, salvaguardando as proporções e a longitude, semelhante ao dos ortodoxos de origem cubana que nos Estados Unidos se manifestam contra a abertura de Cuba e o fim do bloqueio, prisioneiros do passado e sem visão de futuro".

Jorge Lacão insiste: "Falemos com total franqueza: deixar de colocar essa possibilidade significa, à partida, uma abdicação".

Voltando a dirigir-se a Francisco Assis, o dirigente socialista considera que "o resultado das tuas opções é claro: no contexto histórico que vivemos, por efeito do teu pensamento, ao PS estaria aberta a ambição eleitoral (que, por agora, consideras falhada) de ser alternância de poder, mas nem pensar ter ambição de se constituir como alternativa de orientações políticas fundamentais para o país".

"Meu caro Assis, a motivação para te escrever esta carta aberta, para além da evidente divergência com a posição que vieste sustentar, no momento mais crítico dos processos negociais, que só pode ter contribuído para encorajar os adversários políticos do PS, radica ainda num aspecto pessoal, ligado à memória de ambos", evoca Jorge Lacão na referida carta aberta a Assis.

Jorge Lacão recorda que a primeira investidura de Francisco Assis na presidência do grupo parlamentar do PS "ocorreu na sequência imediata da minha demissão de tal cargo quando, incluindo sob a tua orientação, os deputados do grupo parlamentar foram pela direcção do partido dispensados de se pronunciar sobre o mérito do acordo de revisão constitucional por mim então assinado com o PSD e que viria a dar lugar à IV revisão constitucional, em 1997".

Depois de invocar este episódio, Jorge Lacão, "como corolário", cita Maquiavel: "as letras seguem as armas e os capitães seguem à frente dos filósofos".

"Hoje, como sabemos, os capitães são os da finança e da indústria. E os filósofos que os seguem quem serão, meu caro Francisco Assis?", interroga Jorge Lacão, assinando "teu camarada e amigo".

Nuno Miguel Silva - Económico

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