segunda-feira, 30 de novembro de 2015

40 ANOS DA INDEPENDÊNCIA. FRETILIN, O MOTOR DA LUTA NACIONALISTA TIMORENSE



Fretilin evitou guerra civil em 2006 - Lu-Olo

Díli, 30 nov (Lusa) - Timor-Leste poderia ter entrado numa guerra civil se em 2006 a Fretilin tivesse "reagido em força" à situação que levou à destituição de Mari Alkatiri como primeiro-ministro, disse à Lusa o presidente do partido, Lu-Olo.

"Poderíamos ter entrado sim. A Fretilin não quis isso", disse em entrevista à Lusa, explicando que ele próprio e Mari Alkatiri (secretário-geral da Frente revolucionária do Timor-Leste Independente [Fretilin] e na altura chefe do Governo) travaram a entrada em Díli de 30 mil militantes que estavam concentrados nos arredores da cidade.

"Fomos ao encontro dos nossos militantes e acalmámos um bocadinho os ânimos e estivemos reunidos com eles até de madrugada do dia seguinte para depois entrar em Díli. E quando entram em Díli entraram mais calmamente e não fizeram cair nenhum fio de cabelo a ninguém", acrescentou.

Para o líder da Fretilin, ex-presidente do Parlamento Nacional, a situação foi uma demonstração "de um profundo sentido de Estado dos militantes da Fretilin e da sua liderança" e um reconhecimento "profundo da necessidade de garantir a paz e a estabilidade do nosso país.

Os contornos exatos do que ocorreu em 2006 continuam por ser detalhados, com vários dos intervenientes a permanecerem calados sobre muitos dos aspetos do que ocorreu ou a remeterem para mais tarde as suas declarações.

Uma complexidade que envolveu manifestações lideradas pelo bispo de Díli contra a intenção do Governo não tornar a religião e moral obrigatória na escola, uma movimentação política forte contra o executivo liderado por Mari Alkatiri e conflitos e tensão no seio das forças de defesa (F-FDTL) e entre estas e a polícia (PNTL).

Um barril de pólvora em que se intensificou um conflito mais antigo, entre o então Presidente Xanana Gusmão e Mari Alkatiri e que ficou marcado pela deserção do então comandante da Polícia Militar, Alfredo Reinado, e a aproximação deste a Gastão Salsinha, ex-tenente das F-FDTL, que também entrou em choque com a hierarquia militar.

Alguns falam de um quase golpe ao Governo, outros dizem que a guerra civil esteve próxima, com críticas ao papel da Austrália, ao embaixador americano em Díli e de outros intervenientes políticos nacionais e estrangeiros.

Lu-Olo insiste que nessa altura havia "muitas pressões" internas e externas sobre Xanana Gusmão, por descontentamento de muitos que, desde a primeira hora tentaram derrubar o Governo da Fretilin.

"Quando a Fretilin começou a governar este país enfrentava manifestações, quase todos os dias, em frente ao palácio. Isso não estava a dar certo, como não conseguiram derrubar politicamente o primeiro-ministro tiveram de fazer aquilo", afirmou.

"Tinham que optar por aquela forma para derrubar o governo da Fretilin, destituindo Mari Alkatiri do cargo de primeiro-ministro", disse.

Questionado sobre o papel da Xanana Gusmão na altura, Lu-Olo considera que foi "uma decisão mal tomada" ter dado "aval" a que Alkatiri fosse destituído, um "erro que Xanana Gusmão já reconheceu publicamente".

Sobre a sua relação com Xanana Gusmão, Lu-Olo explica que há "dois pratos", um do período da resistência em que tem "muito respeito" e outro, já depois da independência onde explicar haver "alguma diferenças, às vezes profundas" nos temas da governação.

E rejeita comentários dos que pensam que Xanana Gusmão "comprou" as pazes com Mari Alkatiri com os projetos da Região Administrativa Especial de Oecusse, criada quando o primeiro era chefe do Governo e que é agora dirigida pelo segundo.

Considera que a imagem de Xanana Gusmão foi prejudicada "pelos que o rodeiam" e que a entrega de Oecusse a Mari Alkatiri pretende criar "um ponto de referência para o desenvolvimento do país".

Sobre o futuro, se a Fretilin continuará ou não a trabalhar com o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), partido liderado por Xanana Gusmão e que é atualmente o mais votado, Lu-Olo não exclui qualquer hipótese.

Mas considera que "no governo, ou na oposição a Fretilin já deu provas de que se deve dar o contributo necessário para estabilizar e desenvolver o país" e de que é importante o esforço atual de unir esforços.

"Devemos maximizar os recursos que Timor-Leste tem. Não falo apenas de recursos minerais. Volto outra vez para as pessoas que nós temos. Temos que maximizar isso, o mais importante é saber onde colocar as pessoas para fazer alguma coisa de jeito para o nosso país", disse.

As eleições são uma oportunidade da população fazer as suas escolhas mas a governação do país, considerou, deve procurar reunir talentos, sem "negar a ninguém a capacidade de participar na governação do país".

Lu-Olo rejeita ainda os que criticam a cooperação entre a Fretilin e o Governo e os que exigem mais oposição, insistindo que o seu partido quer colaborar para ajudar a melhorar a governação.

"Essa cooperação que estamos a dar ao Governo não nega à Fretilin a capacidade de fazer críticas ao próprio Governo. Isso é o que os outros não compreendem. Dizem que estamos a pactuar com o Governo, que estamos no mesmo saco. Não estamos no mesmo saco, estamos a propor soluções, estamos a dizer que devem governar da melhor forma possível", frisou.

ASP // EL

"Se a Fretilin pedir desculpas, quem pede desculpas à Fretilin?"

Díli, 30 nov (Lusa) - O presidente da Fretilin, Lu-Olo, defendeu hoje o papel histórico do seu partido em Timor-Leste afirmando que não tem que pedir desculpas e que se não fosse a proclamação da independência, em 1975, dificilmente o país seria independente.

"Acho que seria muito difícil. Se não fosse a independência proclamada pela Fretilin (Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente) a 28 de novembro de 1975, ninguém estaria em condições de oferecer uma resistência durante 24 anos contra a ocupação militar indonésia e nem as Falintil existiam", disse em entrevista à Lusa.

A Fretilin, afirmou, foi "a força principal que lutou contra a invasão militar indonésia", e o seu braço armado lutava para defender essa independência pelo que, se não tivesse sido proclamada, não haveria um objetivo a defender, explicou.

Questionado sobre se a Fretilin tem ou não que pedir desculpas por eventuais exageros cometidos no passado, Lu-Olo, responde com uma pergunta, defendendo o partido a que preside desde 2001: "Pedir desculpa a quem? A quem é que a Fretilin vai pedir desculpas, quando a própria Fretilin é que lutou para termos a independência? E pergunto também: quem é que vai pedir desculpa à Fretilin?" questionou.

"Nós lutámos por um objetivo e conseguimos cumpri-lo, apesar da Fretilin passar por muitas, muitas vicissitudes. Mesmo assim aguentou com todos os rigores da luta e ganhou a luta", afirmou.

Sobre exageros cometidos no período da guerra civil ou posteriormente, Lu-Olo afirma que a liderança "não partiu desse pressuposto" ainda que "numa guerra possa ter havido sempre qualquer coisa", e considera que a Fretilin "tinha os melhores métodos de resolução dos problemas".

Ao mesmo tempo, relembra, Timor-Leste viveu uma situação diferente da de Angola e Moçambique, países onde se "prepararam todas as condições políticas para passarem a uma resistência armada".

"No caso de Timor-Leste não. Uma independência, uma política, uma independência seguida de uma invasão, tudo muito rápido. Mas tivemos, como disse, uma instituição político-partidária que estava a dirigir e a orientar a resistência no seu todo. Sem isso era difícil", defendeu.

Quanto ao processo de despartidarização da luta, Lu-Olo considera que foi "necessário na altura", acabando por dar "a imagem da unidade dos timorenses, na luta contra a ocupação militar indonésia" o que teve um impacto mais positivo na arena internacional.

Mas esse processo, disse, partiu da própria Fretilin que "era liderada por Xanana Gusmão, como comissário político e comandante das Falintil" pelo que foi o partido "quem propôs essa solução negocial do conflito".

Os que eventualmente considerem essa decisão de Xanana Gusmão uma traição à Fretilin, afirmou, "não compreendem, nem conhecem quem é Xanana Gusmão", homem que fez tudo para libertar Timor-Leste.

"Ele foi meu comandante e eu devo dizer como guerrilheiro, como quadro político que estive na resistência armada durante 24 anos eu devo muito a esse grande comandante que se chama Xanana Gusmão e o povo de Timor-Leste ainda deve muito a este grande homem", salientou.

"Ele fez tudo para libertar o país até ao último momento em que foi capturado. Muitos estavam desiludidos, muitos até lhe chamaram nomes. Mas nós lá no mato não nos assustámos com isso", afirmou.

Perante as reações de desilusão dos seus companheiros no mato, aquando da prisão de Xanana Gusmão em 1992, Lu-Olo recorda o que disse na altura: "a Indonésia levantou uma pedra, mas vai deixar essa pedra cair sobre a sua própria cabeça".

"Mais vale ele ser capturado para ganharmos a guerra do que ser morto como herói nas montanhas e foi o que Xanana fez durante o processo todo", disse.

"Quando o tribunal indonésio julgou Xanana Gusmão, ele virou-se para os indonésios e disse: Eu sou um cidadão português e o tribunal indonésio não tem legitimidade para me julgar", vincou.

ASP // EL

Radicalismo foi necessário para disciplinar a luta timorense - Lu-Olo

Díli, 30 nov (Lusa) - O radicalismo foi necessário para dar força e disciplinar a luta timorense contra a ocupação indonésia, já que adotar uma postura mais flexível teria enfraquecido a capacidade da resistência, disse à Lusa o presidente da Fretilin.

Na entrevista à Lusa, o ex-presidente do Parlamento Nacional - que passou toda a ocupação indonésia no mato integrado nas Falintil, o braço armado da resistência - recordou que o mundo "estava dividido em dois" e que era necessário fazer escolhas.

"O radicalismo era necessário para dar força, para lutar contra a Indonésia. Qualquer luta de libertação nacional tinha de fazer escolhas", disse, considerando que o mais importante era defender a independência que foi proclamada pela Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) em 28 de novembro de 1975.

"E então temos que radicalizar, digo radicalizar entre aspas. O mais importante é tomar posições duras em relação a uma guerra que estava a ser imposta ao povo timorense. Se nós optássemos por uma posição mais flexível, dificilmente conseguiríamos chegar a essa vitória que conseguimos", explicou.

Lu-Olo, 60 anos, que como presidente da Assembleia Constituinte proclamou, a 20 de maio de 2002 a restauração da independência timorense, insiste que esse radicalismo "trouxe disciplina e orientou de certa forma a conduta do povo do Timor-Leste" para "oferecer resistência contra a ocupação militar indonésia".

Mas a desigualdade de forças tornou a luta contra a Indonésia "realmente complicada", com os guerrilheiros timorenses a verem ser destruídas, "uma por uma", as bolsas de resistência criadas nos primeiros anos da guerra, recordou.

Uma situação que levou a resistência a alterar, por duas vezes a sua forma de atuar, passando de uma guerra convencional, de posição - nos primeiros anos da ocupação indonésia, que começou a 07 de dezembro de 1975 - para a guerrilha e depois para a guerrilha urbana.

Lu-Olo recorda o ataque cerrado que a Indonésia fez às "bolsas de resistência" que a Fretilin montou, com a população que levou para o interior.

"Estava dividido em vários sectores e as forças estavam enquadradas dentro dessa divisão territorial a oferecer resistência, juntamente com a população. Posso dizer que o guerrilheiro que estava a combater as forças indonésias levava o seu filho e a sua esposa. Tínhamos que fazer esse tipo de guerra para defender a nossa posição e não deixar a nossa população cair nas mãos do inimigo", recordou.

"Havia também um motivo político, porque a indonésia na altura controlava 5% da população, na altura. 95% da população estava nas montanhas com a Fretilin a oferecer resistência. O que a Indonésia queria era apanhar o maior número da população possível para dizer ao mundo a integração era um facto consumado, que a população tinha escolhido livremente, sem pressão nenhuma a integração de Timor-Leste na Indonésia", afirmou.

As várias bolsas de resistência (fonteira norte e sul, centro norte e sul e leste) foram destruídas "uma por uma pelo inimigo até à ponta leste" onde os guerrilheiros timorenses tentaram até ao último momento resistir aos ataques constantes.

"Na altura os bombardeamentos eram intensos e por dia morriam quase 200 civis. Já não estávamos a aguentar essa situação e tivemos de romper com o cerco", recordou.

A situação tornou-se insustentável e as Falintil, braço armado primeiro da Fretilin e posteriormente de toda a resistência, tiveram que mudar de estratégia, "entregando" a população e passando para "a guerrilha propriamente dita".

"Foi muito complicado realmente. Nós não tínhamos nenhum apoio militar de nenhum país. Estou a falar de apoio militar, não do apoio político e moral que tínhamos de vários países, designadamente de Portugal. Mas apoio militar nunca houve", insiste.

No arranque da resistência as Falintil contavam com as armas deixadas pelos portugueses, "metralhadores, morteiros, G3 mas rapidamente esse material se tornou insuficiente, com muitas deterioradas ou inutilizadas por falta de munições.

"Portanto, no plano militar só tínhamos uma solução. A única maneira de conservar as nossas próprias forças era aniquilar o inimigo em cada combate, capturar as suas armas e munições para continuar a resistir", afirmou.

Quanto a Indonésia invadiu Timor-Leste, a 07 de dezembro de 1975, 10 dias depois da proclamação unilateral da independência, Lu-Olo estava já no mato, na região de Ossú - integrado no pelotão comandado por Lino Olokassa, no Monte Perdido.

Tornou-se um dos poucos guerrilheiros timorenses que passou toda a ocupação indonésia no mato, integrado nas Falintil, o braço armado da resistência timorense, descendo "à vila" em raras ocasiões até à saída do último soldado indonésio em outubro de 1999.

"Fui muito jovem para as montanhas, nessa altura com 20, 21 anos de idade e, pronto, foi a escolha que eu fiz, na minha adolescência e então pronto lá fiquei no mato a resistir contra a ocupação militar da Indonésia, até ao fim da guerra", recordou.

Um período difícil em que Timor-Leste, sublinha, viveu uma "experiência única, muito diferente da experiência da guerra de libertação" de países como Angola, Moçambique ou Guiné-Bissau, que tinham tido alguma formação de quadros ou até a preparação de jovens para a resistência à presença colonial.

Jovem na altura em que os partidos políticos começaram a dar os seus primeiros passos, Lu-Olo recorda os debates dentro do Comité Central da Fretilin onde "já estavam a falar da independência de Timor-Leste e que era melhor que Timor-Leste ficasse independente, a gerir o seu próprio destino".

"Eu, como era jovem e apesar de não ter experiencia política, fiquei inspirado com aquilo que eles diziam na altura. E pronto isso ajudou-me bastante na escolha da minha vida, da resistência contra a ocupação militar indonésia", afirmou.

Depois da guerra, relembra, sobravam pouco mais de uma centena de guerrilheiros que tinham lutado desde 1975 até 1999, motivo pelo qual considera "um engano", um "erro" haver dezenas de milhares de pessoas que hoje, em Timor-Leste, recebem pensões de veteranos.

"Se tivéssemos esse número de veteranos na resistência armada tínhamos escorraçado os indonésios em metade do dia, não precisávamos de 24 anos para resistir contra a ocupação militar indonésia", afirmou.

"Portanto, essas pessoas que receberam medalhas, que estão a recebendo pensões, algumas são verdadeiras, poucas são verdadeiras. Muitas são pessoas falsas e isso está a gerar um problema", disse, considerando que é uma política que "menospreza os verdadeiros veteranos".

ASP // EL

*Título PG - Na foto: Lu-Olo guerrilheiro. Luta de mais de duas décadas pela independência timorense

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