quinta-feira, 11 de junho de 2015

UMA LUZ ENTRE AS TREVAS




1 – A reunião cimeira Comunidade de Estados Latino Americanos e Caribenhos (CELAC) – União Europeia (UE), realizou-se num momento distinto para a humanidade:

- As tensões globais de essência capitalista agudizam-se entre os que se propõem ao exercício duma hegemonia unipolar e os emergentes que cuidam de seguir a trilha da multipolarização, recorrendo a painéis filosófico-doutrinário-ideológico-políticos e geo estratégicos distintos;

- As culturas orientadas para a hegemonia unipolar, socorrem-se de capacidades que se inscrevem em processos neo liberais e especulativos, fórmulas exacerbadas que acabam por subverter os parâmetros de liberdade, de democracia e até de vida;

- As culturas orientadas para a emergência, cultivam duma forma geral e com algumas excepções assumidamente socialistas, orientações de carácter capitalista (de economia de mercado), com amortecedores para as suas políticas sociais e estímulos visando maior justiça e equilíbrio nos relacionamentos internacionais, abrindo-se à participação alargada de cada vez mais organizações sociais de base;

- As situações respectivas entre os componentes da CELAC e da União Europeia, reflectem também essas tensões e essa dicotomia de processos, com a CELAC a integrar o campo dos emergentes (multipolarização) e a União Europeia a ser cada vez mais condicionada ao “diktat” da hegemonia unipolar.

- As cimeiras entre ambas as organizações regionais (eta é a segunda), elevam assim a fasquia do diálogo norte-sul a um nível que antes seria muito difícil alcançar, até por que a emergência só pode ocorrer em função das recíprocas correias de transmissão e a consequente perda de potencialidade daqueles que se propõem ao domínio absoluto de 1% sobre o resto da humanidade, algo que obriga ao risco dos relacionamentos poderem não avançarem de forma pacífica e recorrendo ao diálogo e à concertação.

Há contudo uma plataforma comum para todos eles, sem apesar disso se constituir numa síntese definitiva entre contrários: a aceitação de que vastas regiões do globo fazem valer-se mais por via das organizações regionais reconhecidas internacionalmente, do que por via individual de cada país, o que cria um espectro inovador de responsabilidades, pois tacitamente todos vão aceitando a irreversibilidade da globalização.
  
2 – Com a CELAC a América Latina deu um passo mais no sentido duma integração que está intimamente associada à independência e soberania duma região com capacitação sócio-cultural comum cada vez mais forte, próximo do ponto ideal (e utópico) de não retorno, 200 anos depois das independências formais, “de bandeira”.

As culturas latino americanas têm por via da CELAC, uma excelente fórmula de afirmação de sua unidade, o que distingue mesmo a região em relação a outras organizações regionais de emergentes e a coloca numa posição singular no contexto global.

Com uma base sócio-cultural e histórica comum que se vai fortalecendo, integrando um pacote de organizações de espectro similar, a CELAC é uma das organizações que pode assim, a sul, assumir um papel mais progressista em termos da própria emergência, algo que está inteligentemente a ser aproveitado pelos seus dirigentes mais lúcidos, destacando-se nesse aspecto os componentes da ALBA, a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América.

A CELAC (e particularmente os progressistas que reflectem as posições de vanguarda dos membros da ALBA) está portanto disposta a defender a Venezuela e o seu amplo projecto Bolivariano como um dos seus mais esclarecidos fundamentos, ao mesmo tempo que procura assegurar a distensão em relação a Cuba, assim como a questão de justiça devida para com toda a América Latina, tudo sem esquecer as reparações históricas que a UE deve assumir para com as pequenas nações insulares das Caraíbas, tornadas há séculos acantonamento de escravos de origem africana, condenadas ainda hoje ao subdesenvolvimento típico das periferias e, por esse modo, à dependência.
  
3 – Com a União Europeia seguiu-se uma trilha de capitalismo neo liberal que valorizou a concentração exponencial de capital (incluindo o capital financeiro especulativo), subvalorizando cada vez mais as conquistas sociais dos seus povos, uma trilha agravada pela deslocalização de investimentos e de indústrias que, se não for urgentemente reequacionada, poderá influir no sentido da crise que entretanto nesse campo se instalou.

Por essa razão, a essa trilha não resta outra alternativa senão procurar concertações que nada tendo a ver com os relacionamentos passados, enfrentam emergentes cada vez mais decisórios no carácter polarizado da globalização e, no caso do relacionamento com a CELAC, uma organização que assume sob os pontos de vista ético, moral, sócio-cultural e sócio-político, um papel inconfundível e já incontornável no contexto global.

Na base dos fundamentos da UE, está uma história de construção de impérios que não se podendo mais ressuscitar, marcam no subconsciente humano as trilhas a que jamais se poderá voltar, o que pode pesar negativamente nas possibilidades de diálogo com outras organizações regionais, ou com as potências maiores ao nível dos Estados Unidos, da China, ou mesmo da Federação Russa transcontinental.

Para quem se submete, ou se avassala, aos processos típicos do campo da hegemonia unipolar, a deriva conservadora e ultra conservadora do poder das oligarquias pesa também nas possibilidades desse diálogo e da necessidade de incessante busca de consensos; não ocorrem por acaso as “revoluções coloridas”, nem as “primaveras árabes”, muito menos o “abcesso” capitalista levado ao extremo na Ucrânia.
  
4 – A cimeira CELAC-UE traz-nos assim redobradas expectativas:

- Até que ponto a América Latina, auto declarada “zona de paz, cooperação em matéria demeio ambiente, desarme nuclear, tráfico de drogas e migrações”, poderá fazer valer, em socorro duma UE que representa de certo modo o ocaso dos impérios, as enormes potencialidades de sua emergência, que recorre à história, à densidade de processos sócio-culturais cada vez mais homogéneos e a uma cada vez mais ampla participação democrática popular?

- Até que ponto se poderá equacionar maior equilíbrio entre uns e outros, alcançar maior justiça humana, mais educação, mais saúde e maior respeito pelo Planeta, hoje em dia um conjunto enorme de soluções tão indispensáveis para a vida da e na Mãe Terra?

A União Europeia debate-se intestinamente na velha fórmula shakespiriana, do “to be, or not to be”e é a América Latina que assume a luz entre as trevas:

… É dela que se esperam as melhores opções e soluções, que todavia terão de perseguir os caminhos da inclusão e afastar os da exclusão; por isso é nela e a partir dela que recaem as mais construtivas expectativas, em nome de toda a humanidade, apesar das trocas comerciais entre as duas regiões estarem longe de serem significativas!

Ainda com a CELAC a vanguarda cubana está disposta a “não ter medo de conversar sobre qualquer assunto” manifestado por qualquer das partes: é ainda Cuba que dá a maior potência ao enfoque da luz sobre as trevas!
  
Foto: El Presidente de la Comisión Europea, Jean-Claude Juncker, izquierda, y el presidente del Consejo Europeo, Donald Tusk, derecha, dan la bienvenida al Primer Vicepresidente de Cuba Miguel-Canel Bermúdez a su llegada a la Cumbre UE-CELAC en Bruselas el miércoles 10 de junio de 2015. Foto: Virginia Mayo/ AP - http://www.cubadebate.cu/noticias/2015/06/10/alta-representante-de-la-union-europea-recibio-a-diaz-canel/#.VXh77BvbJy0

A EUROPA BRINCA À BEIRA DO ABISMO - Stiglitz




Exigências absurdas à Grécia revelam governantes incapazes tanto de agir solidariamente quanto de compreender riscos de sua ambição e cegueira

Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia – Outras Palavras - Tradução: Antonio Martins

Os governantes da União Europeia continuam a brincar à beira do abismo com a Grécia. Atenas atendeu a bem mais da metade das demandas de seus credores. Mas os governos da Alemanha e de outros países continuam a exigir que Atenas assine um programa que comprovadamente fracassou, e que poucos economistas acreditam que poderia, deveria ou seria implementado.

A mudança na situação fiscal da Grécia, de um grande déficit primário para um superávit, foi quase inédita, mas a exigência de que o país obtivesse o superávit primário de 4,5% do PIB foi insana. Infelizmente, no momento em que a “troika” – Comissão Europeia, Banco Central Europeu-BCE e Fundo Monetário Internacional – incluíram esta reivindicação irresponsável no programa de financiamento internacional para a Grécia, as autoridades do país não tinham escolha, exceto aceitá-la.

A loucura de continuar perseguindo este programa é particularmente aguda agora, depois que o PIB da Grécia declinou 25% desde o início da crise. A troika avaliou muito mal os efeitos macroeconômicos do programa que impôs. Segundo suas previsões oficiais, acreditavam que, após a redução de salários e outras medidas de austeridade, as exportações gregas cresceriam e o país logo retomaria o crescimento. Também supunham que a primeira reestruturação dos débitos levaria a uma dívida sustentávavel.

As previsões da troika fracassaram repetidamente. E não por pouco, mas por uma margem enorme. Os eleitores gregos estavam certos quando exigiram uma mudança de trajetória, e seu governo está certo quando se recusa a assinar um programa profundamente falho.

Isso dito, é importante lembrar que há espaço para um acordo. A Grécia deixou clara sua vontade de realizar reformas e saudou o possível apoio da Europa na implementação de algumas delas. Uma dose de realismo por parte dos credores – sobre o que é alcançável e sobre as consequências macroeconômicas de diferentes tipos de reforma fiscal e estrutural – poderia criar as bases para um acordo bom não apenas para a Grécia, mas para toda a Europa.

Mas na Europa, e especialmente na Alemanha, alguns parecem indiferentes quanto a uma possível saída da Grécia da zona do euro. O mercado, dizem eles, “já precificou” tal ruptura. Alguns até sugerem que ela seria útil à união monetária.

Estou convencido que tais pontos de vista subestimam gravemente os riscos envolvidos – tanto presentes, quanto futuros. Um grau similar de alienação era evidente nos Estados Unidos, antes do colapso do banco Lehman Brothers, em setembro de 2008. A fragilidade dos bancos norte-americanos era conhecida há muito – ao menos desde a quebra do Bear Stearns, meses antes. Mas, dada a falta de transparência (devida em parte à frágil regulação), tanto os mercados quanto os políticos não enxergaram completamente os laços e o risco de contágio entre as instituições financeiras.

Ocorre que o sistema financeiro mundial ainda sofre os choques derivados do colapso do Lehman. Os bancos permanecem opacos, e portanto sob risco. Não sabemos a extensão real dos vínculos entre as instituições financeiras, inclusive aquelas mergulhadas em derivativos e operações de troca de dívida vencida não transparentes.

Na Europa, já é possível ver algumas das consequências da regulação inadequada e do desenho torto da própria zona do euro. Sabemos que a estrutura da eurozona encoraja a divergência, não a convergência: quando o capital e pessoas talentosas deixam as economias atingidas por crises, estes países tornam-se menos capazes de pagar suas dívidas. Quando os mercados percebem que uma espiral descendente viciosa está estruturalmente associada ao euro, as consequências da próximacrise tornam-se profundas. E outra crise é inevitável: isso está na própria natureza do capitalismo.

O truque de confiança do presidente do BCE, Mario Draghi – na forma de sua declaração de 2012, segundo a qual as autoridades monetárias farão “o que fosse necessário” para preservar o euro – funcionou até agora. Mas a percepção de que preservar a eurozona nãoé um compromisso pétreo, entre seus membros, tornará este truque muito mais frágil, da próxima vez. Os juros impostos aos títulos dos países devedores poderiam disparar, e nenhuma declaração de conforto do BCE ou dos líderes europeus seria suficiente para baixá-los de níveis estratosféricos, porque o mundo agora saberia que tais autoridades não farão “o que for necessário”. O exemplo grego teria demonstrado que elas farão o que os cálculos de curto prazo da política eleitoral demandarem…

Temo que a consequência mais importante seja o enfraquecimento da solidariedade europeia. Esperava-se que o euro pudesse fortalecê-la. Ele provocou o efeito oposto.

Não é de interesse da Europa – ou do mundo – afastar um país periférico europeu de seus vizinhos, especialmente agora, quando a instabilidade política é tão evidente. O Oriente Médio está em chamas. O Ocidente tenta conter a Rússia. A China, já hoje a maior fonte mundial de poupança, o país com maior comercio externo e a maior economia (se levado em conta o poder de compra das moedas) confronta o Ocidente com novas realidades econômicas e estratégicas. Não é hora de uma Desunião Europeia.

Os líderes europeus viam a si mesmos como visionários, quando criaram o euro. Pensavam enxergar além das demandas de curto prazo que normalmente ocupam os líderes políticos.

Infelizmente, sua compreensão sobre Economia foi menor que sua ambição; e a política daquele momento não permitiu criar uma estrutura institucional que tivesse permitido ao euro funcionar como se esperava. Embora se acreditasse que a moeda única traria prosperidade inédita, é difícil detectar um efeito positivo para a zona do euro como um todo, no período anterior à crise. Quando ela sobreveio, os efeitos adversos foram enormes.

O futuro da Europa e do euro depende agora de uma pergunta. Seus governantes serão capazes de combinar algum entendimento de Economia com sentido visionário e preocupação com a solidariedade europeia? Provavelmente, começaremos a descobrir a resposta desta questão existencial nas próximas semanas.

* Joseph Stiglitz é professor na Universidade de Colúmbia, Prêmio Nobel de Economia (2001) e autor, entre outros, de O Mundo em Queda Livre (Companhia das Letras).

GOVERNO GUINEENSE ANUNCIA CRIAÇÃO DA COMPANHIA AIR GUINÉ-BISSAU




O Governo guineense anunciou hoje a criação de uma companhia de bandeira do país designada Air Guiné-Bissau num consórcio com o grupo romeno Tender que disponibilizará os aviões.

O secretário de Estado guineense para o sector dos Transportes e Comunicações, João Bernardo Vieira, apresentou a nova companhia numa unidade hoteleira da capital e referiu que o grupo português Euroatlantic poderá vir a juntar-se ao consórcio.

A Air Guiné-Bissau terá dois aviões, a serem disponibilizados pela Tender até final deste ano, e ligações de Bissau para o Senegal, Cabo Verde, Portugal e França.

Está previsto que um ano depois haja também ligações de Bissau para o Brasil, indicou o secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

De acordo com Bernardo Vieira, a companhia portuguesa Euroatlantic, que faz ligações diretas entre Bissau e Lisboa, pediu tempo para analisar "alguns pontos" do protocolo de acordo para criação da Air Guiné-Bissau.

Para já, a companhia de bandeira da Guiné-Bissau será detida em 40% pelo Estado guineense e em 60% pelo grupo Tender.

João Bernardo Vieira afirmou que a criação da companhia de aviação civil "vai ao encontro das necessidades dos guineenses" em resposta aos desafios do país.

O secretário de Estado dos Transportes e Comunicações, que em fevereiro classificou a criação da companhia nacional como um desafio pessoal, salientou "o clima de entendimento" registado nas negociações tripartidas (Governo, grupo Tender e Euroatlantic) que decorrem desde quarta-feira em Bissau para augurar "um bom futuro" para a Air Guiné-Bissau.

As três partes devem voltar a encontrar-se nas próximas semanas em Bucareste (Roménia) e em Lisboa, momento em que João Bernardo Vieira espera obter uma posição final do grupo português.

Nos anos 1990, chegaram a ser criados os Transportes Aéreos da Guiné-Bissau, mas a companhia acabaria por falir.

Lusa, em Notícias ao Minuto

Liberdade de circulação na CPLP é quase impossível mas Estados têm margem para mais




Lisboa, 11 jun (Lusa) -- A liberdade de circulação no espaço lusófono "é quase impossível", sobretudo devido ao vínculo de Portugal à União Europeia, mas tal não significa que os Estados não tenham margem para mais, realçam dois peritos.

"Há várias formas de conseguir, na prática, uma maior liberdade de circulação", por exemplo na gestão das atribuições de residência, que cada país pode fazer diferentemente consoante as suas "áreas de influência", assinala o professor e investigador na área das migrações Rui Pena Pires, em declarações à Lusa a propósito dos 30 anos da assinatura do Acordo de Schengen.

"A procura de um controlo muito rígido da fronteira externa torna difícil a criação de um espaço de livre circulação no âmbito da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa], mas há instrumentos que permitem" uma "política mais aberta, desde que os países estejam interessados nela", considera.

Independentemente dos grupos a que pertencem, os Estados mantêm "margem para firmar acordos para certas categorias de pessoas, desde conferencistas a profissionais especializados, a artistas e estudantes", corrobora José Leitão, advogado e ex-alto comissário para a imigração.

Sublinhando que cidadania e circulação são questões distintas, José Leitão considera que alguns países lusófonos têm tido "gestos unilaterais" para "avançar" na primeira.

"Um Estado, independentemente de existir ou não um acordo multilateral, unilateralmente pode afirmar o seu empenhamento", recorda o advogado, autor, em 2009, de "Estudo sobre cidadania e circulação no espaço da CPLP".

"A cidadania lusófona tem tido avanços, não tantos ao ritmo que seria desejável", reconhece, frisando que tal "depende muito dos impulsos dos Estados" e que "não basta" a vontade do Secretariado Executivo da CPLP.

"A cidadania na CPLP não é só a liberdade de circulação, é o reconhecimento de diplomas, é a portabilidade de direitos sociais, é a possibilidade de exercer direitos políticos", enumera.

SBR // EL

Moçambique. Renamo anuncia criação de polícia e reorganização militar




A Renamo, maior partido da oposição em Moçambique, anunciou hoje que vai forçar a criação das autarquias provinciais no centro e norte do país, através da criação de uma polícia e da redistribuição do seu efetivo militar.

José Manteigas, porta-voz da V sessão do Conselho Nacional da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), disse que o quórum reunido na cidade da Beira aprovou a criação, "a bem ou a mal", das autarquias provinciais, incluindo o uso da ala militar do partido, que será redistribuída para responder a eventuais ataques do Governo.

"Todos nós sabemos que a Frelimo (partido no poder em Moçambique) tem usado a polícia para impor a sua vontade, por via disso a Renamo, porque não pode desaparecer e não deve, irá também criar as suas forças, para autodefender-se nas situações em que for atacada", declarou José Manteigas, recusando a ideia de que estas decisões sejam lidas como uma declaração de guerra.

O Conselho Nacional da Renamo decidiu também estender os trabalhos por mais um dia, até sexta-feira, para aprofundar o debate sobre a estrutura das autarquias provinciais que pretende criar em Manica, Sofala, Tete, Zambézia (centro) e Niassa e Nampula (norte), como forma de ultrapassar o que alega ter sido uma fraude nas eleições gerais de 15 de outubro do ano passado.

A Renamo submeteu um anteprojeto de lei ao parlamento, preconizando a criação desta nova figura administrativa, mas a proposta foi rejeitada pela maioria da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique).

Lusa, em Notícias ao Minuto

Moçambique quer reformar formação profissional para qualificar jovens




A ministra moçambicana do Trabalho Emprego e Segurança Social, Vitória Dias Diogo, considerou hoje em Genebra, que a formação profissional é uma das prioridades do país, principalmente para combater o desemprego jovem

"Uma das minhas grandes metas é fazer reformas na área da formação profissional, especialmente para a juventude, para responder à procura", disse a ministra que participa na 104.ª Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra, Suíça.

Para Vitória Dias Diogo, a industrialização gradual do país requer pessoas capacitadas, à altura de responder aos desafios do mercado. "Este é o meu grande desafio", disse.

Neste sentido, a governante disse que está a colocar os jovens no centro das suas preocupações para que possam ter a capacidade, competências, conhecimentos e habilidades técnicas adequadas para enfrentar o mercado e desenvolver o país.

A ministra salientou ainda que, um dos segredos para o futuro do país passa pela sua própria capacidade de redistribuir a riqueza, através de postos laborais para que "a juventude possa vingar no sentido positivo no mercado de trabalho".

Ainda há vários desafios para Moçambique, reconheceu a governante. No entanto, a economia está criar condições para mais empregos, disse a ministra.

Além disso, a governante moçambicana ainda destacou a importância da colaboração com a OIT no domínio de estudos analíticos, de avaliações, de formulação de políticas estratégicas assim como na capacitação dos recursos humanos.

"Nós podemos ter todas as condições em termos de natureza, mas se não tivéramos conhecimento e não apostarmos no conhecimento não vamos conseguir vencer", salientou.

Lusa, em Notícias ao Minuto

AGUALUSA DEFENDE MAIS DEBATES EM ANGOLA EM NOME DA DEMOCRACIA




José Eduardo Agualusa apela a sociedade civil a promover mais debates a nível interno sobre o rumo da democracia em Angola. Na Feira do Livro de Lisboa, o escritor angolano acaba de lançar "O Livro dos Camaleões".

A violação constante dos Direitos Humanos em Angola não é ficção. É uma realidade infeliz que continua a inquietar o escritor angolano, José Eduardo Agualusa.

O julgamento e a condenação a seis meses de prisão do ativista e jornalista, Rafael Marques, e o caso Julino Kalupeteca, entre outros, são exemplos disso: "Infelizmente, há sempre casos... o caso do monte Sumi também, que é muito preocupante, porque o Governo não esclareceu completamente o que se passou ali. E agora com o Rafael é uma situação também estranha, parece um tiro no pé. Creio que este tipo de situação só prejudica o próprio regime."

Défice de democracia

A estes factos junta-se a situação em Cabinda que, segundo a expressão do escritor, "nunca foi famosa".

"Eu acho que tudo isso tem a ver com o défice de democracia. Todas essas questões não teriam acontecido num contexto democrático. Então, acho que tem a ver com a mesma realidade, que é o problema de falta de democracia".

No enclave de Cabinda, o caso mais recente prende-se com a situação crítica de José Marcos Mavungo, detido desde 14 de março. Para Eduardo Agualusa, a sociedade civil, que cresceu nos últimos anos, tem alertado para esta realidade, "mas, mesmo a sociedade está presa ao próprio atraso que a ausência de democracia gerou no país", considera também o escritor.

Na perspetiva de Agualusa, os livros são território de pensamento e de debate, que também podem contribuir para elevar o grau de democracia em Angola: "E tudo o que possa conduzir ao debate é bom para o país, para produzir mais democracia, para melhorar a democracia. Então, tudo o que seja debate é bom. Tem acontecido, mas ainda precisa acontecer mais. Ainda há falta de debate."

Os Camaleões de Agualusa

A DW África entrevistou o escritor angolano no intervalo de uma sessão de autógrafos na Feira do Livro de Lisboa, poucos dias depois do lançamento nas livrarias portuguesas do seu novo título, "O Livro dos Camaleões".

"'Os Camaleões" tem a ver com o facto de quase todos os personagens que surgem neste livro, ou uma boa parte deles, serem pessoas em trânsito de identidade, à procura de identidade em geografias diversas e tempos diversos. Não têm diretamente a ver com uma realidade concreta. Nesse sentido, são homens camaleões."

E o escritor prossegue: "Os contos são muito diferentes entre si, há contos passados em épocas históricas muito diversas e com personagens muito diferentes também, há personagens tiradas da realidade e outras não."

Este novo livro reúne vários contos inéditos, à mistura com algum humor, que, por exemplo, dão a conhecer ao leitor um ditador africano muito respeitado em Portugal, que escreve a sua própria biografia.

Ou ainda sobre um famoso marinheiro maltês, que visita São Tomé, depois de passar por um lugar onde o tempo não passa. Além de várias épocas, a obra percorre também diversas geografias, das savanas do sul de Angola às ruidosas ruas do Rio de Janeiro, no Brasil.

Agualusa revela que "tem contos passados em Angola na época contemporânea, mas também no séc. XIX, tem um conto passado em São Tomé, no Brasil... São épocas diferentes e geografias diferentes."

Além de Lisboa e Luanda, Rio de Janeiro e São Paulo têm sido paragens constantes de José Eduardo Agualusa nos últimos anos, onde apresentou recentemente o livro "A Rainha Ginga". Agualusa é um dos autores dos países de língua portuguesa presentes na Feira do Livro de Lisboa, que termina no próximo domingo (14.06).

João Carlos (Lisboa) – Deutsche Welle

“ANGOLA VAI PASSAR POR UM BOM BOCADO”




Quem o diz é Precioso Domingos, um dos autores de um relatório anual de referência sobre a economia de Angola. E mais: a crise está para durar e os que mais sofrem são os que menos têm.

Em Luanda foram apresentados relatórios críticos sobre a situação económica e social de Angola, supostamente um dos países mais ricos de África. Os autores independentes do Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola, publicado na quinta-feira, 11 de junho de 2015, chegam a conclusões pouco abonatórias para o Governo do Presidente José Eduardo dos Santos. E prevêm um prolongamento da presente crise que prejudica, sobretudo, os mais pobres, como conferem os relatórios.

A DW África falou com um dos autores dos documentos, o economista Precioso Domingos:

DW África: Porquê esta projeção pouco otimista ?

Precioso Domingos (PD): É que o crescimento económico de Angola até aqui tem sido conduzido fundamentalmente pelo preço do petróleo internacional. Uma vez que a conjuntura internacional para o mercado de petróleo é o que é, esta situação vai perdurar. Por esta razão não se imaginam taxas de crescimento como já tivemos no passado. E Angola vai passar por um bom bocado”.

DW África: No entanto o preço do petróleo começa a recuperar. Não se poderá dizer que o problema está prestes a ser resolvido?

PD: Tem havido algumas oscilações, é verdade. Mas, vejamos, qualquer preço, por mais que o petróleo atinja 80 ou 90 dólares, abaixo daquilo que era habitual, é sempre um prejuízo. E não é provável que o preço se venha a situar acima desse nível”.

DW África: A palavra-chave no relatório, e é uma que temos vindo a ouvir há muitos anos, é “diversificação”. Mas a diversificação parece que se tornou numa palavra para os discursos de domingo?

PD: É evidente que a palavra “diversificação” foi politizada. Nasceu em 2007/2008, na altura em que tivemos a crise conjuntural do petróleo. Mas não diversificámos nada na economia. O grande problema é que agora isto ocorre num contexto mais difícil. Naquela altura tínhamos condições para diversificarmos a estrutura da economia. Agora, com a situação económica que temos, pode ser que a diversificação ocorra, mas vai depender mais de empréstimos. Não é impossível, mas é muito mais complicado fazê-lo através de empréstimos, créditos ou investimento estrangeiro.

DW África: Justamente, passou agora pela imprensa que há acordos secretos entre Angola e a China para créditos avultados. Isso é uma solução?

PD: O crédito, dependendo do destino que lhe é dado, pode ser virtuoso. Mas há aqui uma série de receios. Na realidade, desde 2002 até mais ou menos 2014, os investimentos públicos foram avaliados em 93 mil milhões de dólares. Mas, infelizmente, o impacto sobre o crescimento económico – lembro que tivemos taxas de 16% ou 17% em termos de crescimento económico – mas o recorde que tivemos em termos de contributo dos investimentos públicos sobre o crescimento económico foi de dois por cento. Tudo bem, o dinheiro da China pode interessar, mas se calhar o mais importante era a priorifazermos uma reforma política. Até termos a certeza que cada dólar investido no país tenha um impacto maior.

DW África: Eu entendi corretamente quando diz que estes investimentos não tiveram o impacto desejado, isso se deve também, sobretudo, à falta de transparência destes investimentos, a não se saber, para onde exatamente vai o dinheiro?

PD: Absolutamente. Os investimentos públicos certamente foram um dos grandes para o enriquecimento de uma série de pessoas, que agora são as chamadas elites: Vamos fazer uma obra, que deveria custar cinco milhões de dólares. Mas pede-se à pessoa que supostamente defende o interesse público para escrever 15. E depois fazem a distribuição. Então, nesse ponto de vista havia o interesse de canalizar o máximo de investimentos públicos, para investir para ter acesso e para ser uma oportunidade de ter mais algum dinheiro.

Cristina Krippahl – Deutsche Welle

SOCIEDADE CÍVIL DENUNCIA INTIMIDAÇÃO DE JORNALISTAS EM ANGOLA




Diretor e funcionários do jornal "O Crime" estão a ser ouvidos pela Procuradoria angolana pela divulgação de uma reportagem sobre o envolvimento de oficiais da Polícia e das Forças Armadas no contrabando de droga.

Mariano Brás, diretor do jornal independente "O Crime", e Gabriel dos Anjos, editor-chefe da mesma publicação, estão a ser interrogados na Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal (DNIAP) sob a acusação de crimes de abuso da liberdade de imprensa, difamação e injúria a autoridades públicas.

A queixa foi apresentada pelo ministro do Interior de Angola, Ângelo de Veigas Tavares, o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, general Sachipengo Nunda, e o vice-procurador-geral militar das Forças Armadas de Angola (FAA), general Hélder Pitta Gróz.

Em causa está a publicação de uma reportagem que denunciava alegados crimes de tráfico e venda de drogas no país. Segundo a publicação, estão envolvidas altas patentes da Polícia Nacional e das FAA.

O artigo em causa não foi assinado. De acordo com o artigo 73 da Lei de Imprensa, em situações dessa natureza, a responsabilidade civil e criminal deve ser atribuída ao diretor da publicação.

No entanto, não é essa a interpretação da Procuradoria-Geral da República (PGR) angolana que, num caso inédito, acabou por notificar todos os funcionários do jornal "O Crime", desde repórteres, colaboradores, secretárias e até mesmo empregadas de limpeza, para serem ouvidos no processo.

Intimidação e perseguição

A postura do Ministério Público é, no mínimo, "estranha" para o Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA). A secretária-geral, Luísa Rogério, fala em clima de intimidação e insegurança no seio dos jornalistas.

O funcionamento do jornal pode estar em perigo: "Imaginemos que, por exemplo, todos os jornalistas que vão a tribunal são condenados. E não são só jornalistas, são todos os trabalhadores do jornal. Isso é muito preocupante".

Luísa Rogério mostra-se ainda preocupada pelo facto de o Ministério Público ter questionado se o jornal em causa teria alguma ligação com algum partido da oposição.
O SJA vai prestar apoio ao semanário "O Crime" e também vai pedir assistência jurídica à Associação Mãos Livres. "Neste momento está em perigo toda a continuidade e futuro de mais um jornal", sublinha a secretária-geral do sindicato.

Instrumentalização da justiça

O processo contra os jornalistas e demais funcionários da publicação mereceu igualmente a reação da delegação angolana do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA), uma organização de defesa da liberdade imprensa. Em declarações à DW África, o presidente do MISA-Angola, Alexandre Neto Solombe, disse que o que se passa com o jornal "O Crime" é um exemplo claro de como a Justiça em Angola é instrumentalizada.

"As autoridades deixaram cair este disfarce, esta maquilhagem que durante algum tempo sustentou a imagem do Estado angolano no exterior. E vemos um órgão, que devia usar as denúncias dos jornalistas, a ser instrumentalizado precisamente para a perseguição dos jornalistas", critica.

Para o presidente do MISA-Angola, 2015 afigura-se como um ano bastante preocupante e difícil para o exercício livre da atividade jornalística. "Começa a ser particularmente turbulento para o exercício de um elemento essencial da democracia, que neste caso é o exercício da liberdade de imprensa e de expressão".

Alexandre Solombe lembra também que maio foi um mês marcado pela detenção do jornalista da Rádio Despertar Marcelino Gimbi, em Malanje, e pelo julgamento de Rafael Marques. "Tentaram chantageá-lo e comprometê-lo, aterrorizando-o e desgastando-o para ver se ele desiste de publicar os seus trabalhos", afirma.

Nelson Sul D'Angola (Benguela) - Deutsche Welle

S. Tomé e Príncipe."A independência não era a meta final, era uma etapa" - Miguel Trovoada




Em entrevista à DW África, o ex-Presidente são-tomense assume que houve erros desastrosos após a independência - cometidos por inexperiência governativa e devido à fragilidade da estrutura económica.

Miguel Trovoada, 78 anos, foi o segundo Presidente da República de São Tomé e Príncipe (1991-2001), depois de Manuel Pinto da Costa.

O fundador da Ação Democrática Independente (ADI) inaugurou em 1991 o regime multipartidário, pondo fim aos primeiros 15 anos de partido único. Antes, Trovoada, um dos históricos do MLSTP (Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe), foi um dos nacionalistas que se envolveram, a partir do exterior, na luta que conduziu à proclamação da República Democrática de São Tomé e Príncipe, a 12 de julho de 1975.

O ex-chefe de Estado faz parte da lista dos antigos associados da Casa dos Estudantes do Império, recentemente homenageados em Lisboa. Mas, segundo Trovoada, a Casa não teve, de uma forma direta, um papel decisivo no processo para a independência do arquipélago. Ela contribuiu sim para a formação da consciência política de muitos dirigentes africanos.

DW África: Qual foi a importância da Casa dos Estudantes do Império na luta pela independência?

Miguel Trovoada (MT): A Casa dos Estudantes do Império teve um papel importante na formação e consciencialização política de muitos estudantes africanos que a frequentaram ao longo dos anos e que, depois, vieram a desempenhar um papel no quadro da luta pela independência dos seus países.

DW África: Qual era a ligação entre o MLSTP e outros movimentos nacionalistas africanos?

MT: Nós criámos em 1961 a CONCP [Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas]. Já mostra que havia esta ligação. Eu próprio estive um ano em Conacri, quando saí de Lisboa, e vivia com Mário Pinto de Andrade, Amílcar Cabral, Aristides Pereira, que eram também dirigentes dos outros partidos em luta pela independência nacional. Portanto, a ligação era estreita. Mais tarde, quando ascendemos à independência, o MLSTP, o MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola], a FRELIMO [Frente de Libertação de Moçambique], todos, mantiveram este espírito de unidade, colaboração e fraternidade.

DW África: Por que razão não houve luta armada de libertação em São Tomé e Príncipe?

MT: Um país isolado, a algumas centenas [de quilómetros] da costa africana, teria muita dificuldade em desenvolver uma luta armada. O espaço geográfico e territorial era muito pequeno e muito dificilmente podia sustentar uma guerrilha sem que se criassem problemas logísticos ou de segurança. O mesmo fenómeno deu-se em Cabo Verde. Foram circunstâncias ditadas pela própria geografia, mais do que pela História.

DW África: Quais os países que mais apoiaram a causa da independência de São Tomé e Príncipe?

MT: A Guiné-Conacri, incontestavelmente. Deu emprego a todos nós para que pudéssemos ter uma base de sustentação. Mas também Marrocos e a Argélia, que vinha de uma luta revolucionária e entendia muito mais a necessidade de reforçar o processo de libertação através de um apoio maciço aos movimentos independentistas, inclusive militar. Toda a África, uns mais, outros menos, contribuiu para a nossa libertação, o que não excluiu a continuação de ações bilaterais dos países em prol da nossa luta de libertação nacional.

DW África: Depois, como é que se explica o rápido declínio sociopolítico do país nos primeiros anos após a independência?

MT: Não, sabe, não foi um caso único. Foi um fenómeno que atingiu todos os nossos países. Os dirigentes da luta de libertação não tinham experiência de governação. Reproduzimos modelos na estruturação do Estado um pouco importados e influenciados por aqueles que considerávamos os nossos aliados naturais, no Leste, e que não estavam adaptados à situação nos nossos países. Não nos esqueçamos também que os países ocidentais, na altura da Guerra Fria, ao ver que tínhamos uma ligação muito grande com os países do Leste, não fizeram nada para nos ajudar, claro. Pelo contrário. Quando eles nos pudessem complicar a vida, não se privavam de o fazer. Sabíamos perfeitamente que a independência não era a meta final, era uma etapa. Mas os mecanismos do desenvolvimento foram mais difíceis. A estrutura económica baseada na agricultura tinha como organização as roças que foram nacionalizadas, logo de início, com aquele élan nacionalista, patriótico, e uns laivos de ideologia marxista. Tudo isso levou-nos a fazer opções que, ideologicamente, tinham algum sentido, mas, na prática, se revelaram desastrosas.

Miguel Trovoada diz que esta fase marcou uma etapa, com erros que certamente não serão repetidos. O antigo chefe de Estado afirma que hoje há que gerir o país com outros olhos, utilizando todos os recursos fundamentais para o desenvolvimento nacional. Trovoada sublinha que o poder deve ser um instrumento de realização das aspirações do povo são-tomense e não para a satisfação de pequenos interesses pessoais ou de grupos.

João Carlos (Lisboa) – Deutsche Welle

NOS HOSPITAIS DA GUINÉ-BISSAU CHEGA A FALTAR ÁGUA E ELETRICIDADE




Os países africanos de língua portuguesa continuam longe dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) na saúde. A Guiné-Bissau é considerada o caso mais grave.

No ano 2000, as Nações Unidas lançaram um desafio ao mundo: os 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milénio, que abordam várias áreas, como a educação, a saúde ou a luta contra a pobreza. No campo da saúde pretende-se reduzir a mortalidade infantil, melhorar a saúde materna e combater o VIH/SIDA, a malária e outras doenças.

As metas estabelecidas deveriam ser atingidas este ano, mas nos países africanos de língua portuguesa os indicadores continuam muito aquém do esperado.

A Guiné-Bissau é o país onde a situação é mais grave. A instabilidade política e social contribuíram para o aumento dos problemas de desenvolvimento e as graves falhas no sistema de saúde ainda persistem.

Kossi Ayigan, representante da Organização Mundial de Saúde (OMS) na Guiné-Bissau, considera que, em comparação com anos anteriores, a saúde está a melhorar, mas ainda há problemas bastante grandes que têm de ser resolvidos.

"O país passou por uma grande instabilidade política há muito pouco tempo, o que afetou o setor da saúde. A OMS está a trabalhar com o Governo guineense para melhorar a qualidade dos serviços médicos, e a situação está a melhorar aos poucos, apesar de os indicadores estarem muito longe dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio", afirma Kossi Ayigan.

O responsável lembra que "65% da população ainda não tem acesso a cuidados de saúde próximos do seu local de residência. Muitas pessoas têm de se deslocar à capital e acabamos por perder muitas vidas por causa disso. O Governo tem de investir mais e tornar a saúde numa prioridade."

O país ainda lida com problemas como falta de equipamentos nos hospitais, falta de recursos humanos qualificados e falta de acesso aos cuidados médicos por parte da maioria da população.

Rogério Roque Amaro, economista e professor no Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), considera que as medidas que têm sido tomadas para inverter esta conjuntura não são suficientes. "É uma situação muito problemática. A Guiné-Bissau é um país onde se continua a morrer muito cedo, onde continua a haver muitas mortes de crianças até aos cinco anos e onde continua a haver muitos riscos de morte de mães na altura do parto", afirma.

Segundo o economista, "as estruturas hospitalares têm grandes deficiências, a começar pela própria capital, até em termos de uma coisa que é básica: haver luz elétrica. Até no hospital central de Bissau essa situação falha imensas vezes. Já para não falar do acesso à água potável, que nem sempre é garantido."

Um dos países mais pobres do mundo

A Guiné-Bissau tem 1.7 milhões de habitantes e 70% da população vive em zonas rurais onde o acesso à saúde é ainda mais limitado. A esperança média de vida à nascença é de 48 anos. O VIH/SIDA continua a aumentar, e a malária e a tuberculose estão entre as grandes causas de morte no país. As taxas de mortalidade infantil e materna também atingiram números preocupantes.

"O VIH, a malária e a tuberculose são dos maiores problemas do país", declara Kossi Ayigan. "Também é preciso criar um sistema que se foque na saúde infantil e materna, pois morrem 55 crianças por cada mil nascimentos, e 900 mães por cada 100 mil, o que representa um aumento preocupante em relação a anos anteriores. É preciso diminuir estes números para que a Guiné-Bissau possa ficar mais perto de atingir os ODM".

Segundo a OMS, a solução passa por um maior investimento por parte do Governo. Menos de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) da Guiné-Bissau é destinado à saúde, o que é muito insuficiente dado os problemas que o país enfrenta.

Rogério Roque Amaro defende ainda que se deve apostar mais na prevenção."O país tem uma tradição interessante em algumas zonas de rádios comunitárias, que podem e devem ter um papel fundamental na educação para a saúde, e na difusão de informação de prevenção", diz o economista. "Além disso, a Guiné-Bissau precisa de um enorme investimento. Está quase tudo por fazer. Não digo que nada tenha sido feito, mas foi tudo muito insuficiente e muito aquém daquilo que é necessário. Isto ilustra as enormes lacunas e insuficiências do sistema de saúde."

A Guiné-Bissau ocupa o 177° lugar em 187 países em termos Índice de Desenvolvimento Humano, e 33% da sua população continua a viver em grave situação de pobreza, com menos de um dólar por dia.

Joana Rodrigues ~Deutsche Welle

Guiné e FAO assinam acordos para aumentar produção de cereais e animais




O Governo da Guiné-Bissau assinou com o Fundo das Nações Unidas para a Agricultura (FAO) acordos para aumentar a produção cerealífera e de pecuária no país, afirmou o primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira.

O dirigente guineense regressou quarta-feira à tarde a Bissau oriundo da Mauritânia, onde efetuou uma visita oficial de três dias, depois de ter participado em Roma numa conferência internacional da FAO.

O Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola das Nações Unidas (FIDA) anunciou na quarta-feira que vai emprestar 4,7 milhões de dólares à Guiné-Bissau e doar igual montante para financiar um projeto de desenvolvimento para o sul do país.

Em declarações aos jornalistas no aeroporto de Bissau, Domingos Simões Pereira revelou ter abordado com os responsáveis da FAO vários aspetos de cooperação, tendo assinado acordos nos domínios da produção de cereais e animais.

Os acordos terão efeito ainda na campanha agrícola deste ano, recentemente aberta pelo Governo, assinalou o primeiro-ministro guineense.

Na Mauritânia, Domingos Simões Pereira disse ter assinado acordos de cooperação também no domínio da agricultura e pescas, assim como no que respeita à abolição recíproca de vistos para os cidadãos dos dois países.

O primeiro-ministro anunciou ainda que o governo da Mauritânia vai abrir uma vaga de legalização de cidadãos guineenses.

Domingos Simões Pereira destacou que aquele país irá ajudar a Guiné-Bissau na investigação científica na área das pescas, nomeadamente para quantificação das reservas e nível de captura anual de espécies nos mares do país.

Bissau quer inspirar-se na experiência da Mauritânia para desenvolver o sector pesqueiro, assinalou Domingos Simões Pereira.

"A Mauritânia tem um protocolo de acordo com a União Europeia que é considerado dos mais evoluídos e quisemos nos inspirar também desse exemplo para no futuro podermos favorecer o surgimento de frotas pesqueiras" na Guiné-Bissau, disse Simões Pereira.

O primeiro-ministro guineense admitiu aos jornalistas ter ficado surpreendido com os avanços que viu na Mauritânia.

Lusa, em Notícias ao Minuto

Cabo Verde. POPULISMO PUNITIVO



Expresso das Ilhas (cv), editorial

A pena máxima em Cabo Verde vai aumentar de 25 para 30 anos de prisão. O governo já tem a autorização da Assembleia Nacional para fazer a revisão do Código Penal. A proposta de autorização legislativa foi aprovada pela unanimidade dos deputados presentes na sequência de uma discussão a que foi alocado um tempo que não ultrapassou as 2 horas. A principal alteração feita ao pedido de autorização legislativa foi baixar a pena máxima proposta de 35 para 30 anos.

Com essa decisão Cabo Verde rompeu com uma tradição quanto ao regime de penas que vem do século XIX e do tempo colonial. Em 1884, Portugal foi o primeiro país do mundo a acabar com a prisão perpétua e a adoptar a pena máxima de 25 anos. A Constituição de 1992 consagrou esse ganho civilizacional e proibiu explicitamente a prisão perpétua (artigo 33º). O Código Penal aprovado em 2003 confirmou a pena máxima em 25 anos de prisão. Uma alteração desse regime 12 anos depois deveria merecer justificação fundamentada e discussão aprofundada. Parece que não se conseguiu fazer nem uma, nem outra.

Apesar de na nota justificativa que acompanhou a proposta se reconhecer que “não é a severidade das penas que afasta as pessoas dos ínvios caminhos da criminalidade mas sim a certeza da condenação” aumenta-se, mesmo assim, a pena mais 10 anos.  Pergunta-se porquê? A resposta na nota referida é que “isso vai ao encontro das preocupações das pessoas”. Ou seja, em vez de focalizar os esforços em investigar e conseguir a condenação dos criminosos, fica-se pelo mais fácil mas menos eficaz e também custoso expediente de aumentar a pena. Posto de outra forma: muda-se um regime de penas centenário simplesmente por razões de política que alguns classificariam de populismo punitivo?

Há algum tempo que se vinha discutindo uma revisão do Código Penal mas ninguém pensava em mexer na pena máxima. O assunto só veio à tona em Janeiro deste ano, na sequência do atentado ao filho do Primeiro-ministro e meses após a tentativa de assassinato da mãe de uma inspectora da PJ. Foi a resposta mediática encontrada para o sentimento generalizado de insegurança da população. Todos desataram a discutir a questão e provavelmente outras discussões mais pertinentes para a prevenção e combate à criminalidade e às incivilidades múltiplas no país ficaram secundarizadas no processo.

Nos meses que se seguiram, a proposta de aumento da pena máxima não conseguiu muitos apoiantes fora do círculo governamental. O Presidente da República pronunciou-se contra em várias ocasiões. Numa das suas intervenções disse que «Os estudos indicam que não é com base na severidade das penas que se resolve o problema, mas sim com a criação da capacidade de investigação para descobrir os suspeitos, julgá-los em tempo adequado e aplicar uma pena justa. É assim que a sociedade funciona com tranquilidade».

Recentemente, em sede da Comissão Especializada dos Assuntos Jurídicos e Constitucionais, foram ouvidas várias entidades ligadas à Justiça sobre a matéria. O Provedor da Justiça e a Bastonária da Ordem dos Advogados declaram-se contra a proposta de revisão da pena máxima. O próprio Procurador-Geral da República a quem cabe dirigir a execução da política criminal diz que só aumentar a pena não chega e que a resposta à “percepção de que as pessoas saem demasiado depressa das prisões” poderá passar pelo cumprimento efectivo das penas.

É tentador aumentar penas para passar uma mensagem de combate firme contra a criminalidade. Na realidade não passa de um efeito mediático dirigido para aumentar a sensação de segurança dos cidadãos. Para muitos especialistas do Direito Penal o aumento não tem nenhuma eficácia nem nenhuma utilidade porque não servirá para reduzir o número de delitos. Países como os Estados Unidos foram por essa via punitiva: não conseguiram diminuir o crime mas criaram um problema terrível com o aumento da população prisional e da violência nas prisões. Estudos recentes citados neste jornal (nº 710) mostram que depois de uma certa idade a capacidade de violência diminui consideravelmente. Manter as pessoas presas por mais de vinte ou vinte e cinco anos anos não traz qualquer ganho para a pessoa, para o sistema prisional ou para a sociedade. A eficácia do sistema de justiça fica diminuído porque só consegue punir mas não proporciona a reeducação nem incarna a possibilidade de reinserção social.

É evidente que as duas horas no Parlamento foram insuficientes para se debater adequadamente a revisão do Código Penal tendo em conta as suas implicações e a necessidade que todos vêem em se ter leis funcionais que resolvam os problemas com que a sociedade se depara. Aprovar nessas condições é quase como passar um cheque em branco ao governo. Considerando as reservas manifestadas por várias entidades da área da justiça e alguma preocupação vinda da sociedade civil seria provavelmente proveitoso que o Parlamento chamasse a si a ratificação do decreto legislativo que o governo vai aprovar ao abrigo do artigo 183 da Constituição. Uma oportunidade para se aplicar um dos poderes do Parlamento na fiscalização do governo adquiridos na última revisão constitucional de 2010. A revisão do Código Penal pela sua importância devia voltar outra vez ao Parlamento. Fundamental manter o elevado nível grau de consenso na sua alteração de que beneficiou o primeiro Código Penal.

Mais lidas da semana