Domingos
de Andrade – Jornal de Notícias, opinião
Esta
é a história de uma almofada. Criada com amor ao longo de um ano. Invocada com
zelo. Protegida com carinho. Era uma almofada emprestada. E a cobrar juros. Era
uma almofada, agora com vírgula. Porque não é mais. Mas já lá vamos.
Comecemos
pelo início da história. Embora já saibamos como tudo isto começa. E como
termina. A invocar necessidades orçamentais, para apertar o garrote de quem
paga impostos. Porque há esqueletos verdadeiros a saltar. No meio dos
inventados.
Neste
novo ciclo, o arremedo à herança começou cedo. Primeiro, a alegada não
inscrição do primeiro-ministro António Costa para discursar na Cimeira do
Clima, que decorre em Paris. Notícia veiculada por fontes do PS, desvalorizada
pelo Governo, desmentida pelo PSD.
Segundo,
o Orçamento do Estado, cujas bases básicas (a redundância é propositada, todas
as redundâncias deste texto o são), como as despesas de funcionamento dos
ministérios, não teriam sequer sido inscritas pelo anterior Executivo. Notícia
veiculada por fontes do PS, desvalorizada pelo Governo, desmentida pelo PSD.
Até
aqui, tudo bem. Serve o entretenimento mediático para tornar uns bons em maus e
uns maus em bons. Ganha-se graça assim, com outros a cair em desgraça.
Venham,
então, os esqueletos verdadeiros. Um já está cá fora. E é sério. Sobre a tal
almofada, vírgula. Porque não foi veiculado pelas fontes do PS, não pode ser
ignorado pelo Governo, nem desmentido pelo PSD.
As
contas são da independente Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Andaram
confortáveis as finanças do país até outubro. Mas fizeram-se mal as contas. De
repente, gastou-se mais em salários e poupou-se menos com rescisões amigáveis
no Estado. Soma-se a isso uma derrapagem na despesa com a aquisição de bens e
serviços. E lá se foi a tal almofada para ajudar o défice a ficar abaixo dos
3%. Aqui, não leva vírgula.
O
que não se percebe é como é que um Governo que faz dos números rigor (muito se
defendeu nestas linhas esse caminho) tenha previsto tão mal o desenrolar da
execução orçamental. Como não é crível que o mesmo Governo acreditasse com
segurança que uma percentagem considerável da sobretaxa fosse devolvida.
Ainda
há de haver mais esqueletos. Verdadeiros e inventados. Mas agora passaremos a
acreditar em todos. Porque este é pesado.
É
sempre assim. Governo, sim; Governo, sim senhor. E depois queixam-se do
descrédito da política. Do descrédito dos políticos. Da falta de participação
cívica. Da abstenção. E da conversa de café, vertida em letra de Imprensa.
Conversa,
vírgula.
*Diretor-Executivo