sábado, 5 de dezembro de 2015

A PRESSÃO NEOCOLONIAL AO NÍVEL DA GESTÃO EMPRESARIAL EM ÁFRICA



Rui Peralta, Luanda

Qualquer um que adquira 49% de uma empresa em algumas economias africanas mais periféricas e mais sujeitas aos processos culturais, políticos e económicos neocoloniais, sabe que para a reconstruir e gerir necessitará de uma série de quadros africanos experientes. Surgem muitos candidatos, quase todos, aparentemente, bem qualificados pela sua categoria e posição, mas depressa nos aperceberemos que apenas três ou quatro revelaram ter a experiencia e as aptidões necessárias.

As empresas de muitas economias africanas caracterizam-se por terem o dobro dos gestores e quadros das suas congéneres europeias, americanas ou asiáticas, mas existe, efectivamente, uma extrema escassez de qualificações e de experiencia de gestão. É certo que alguns gestores receberam uma excelente formação, mas em muitos casos passam a sua vida profissional como manuseadores de documentos, ou como escribas de relatórios sem fim. Outros, talvez por serem mais activos e não quererem passar o resto da vida a apanhar papéis, correm atrás de encomendas, a conseguirem matéria-prima e divisas para comprar equipamentos e máquinas no exterior.

Pessoas com experiencia e qualificações profissionais de gestão são em escasso número e esta escassez é um problema grave, embora superável com o tempo (Cronos é o melhor remédio para tudo na vida). Muito mais difícil será a revolução na cultura de gestão nas economias africanas neocolonizadas e ultraperiféricas. Isto porque esta revolução nos mercados africanos implicará o desfazer de muitas décadas de valores profissionais errados, de práticas profissionais erradas e de políticas erradas, para além da desfiguração a que o colonialismo sujeitou estas economias. São, também desde o início da colonização até hoje, centenas de anos sem dizer a verdade e sem ninguém ter a permissão para relatar a verdade. A verdade não serve para progredir numa carreira, isso é coisa da mentira nestas economias. Um mercado actuante é baseado em informação fiável e em relatórios de confiança, não em quadros dispostos a mentir e a tolerar mentiras. Nestas economias fica com o trabalho aquele que ao perguntarem-lhe quanto são dois mais dois responde: “Quanto precisa que sejam, camarada (ou irmão, ou mano, ou excelentíssimo senhor) director”?

Outro factor importante é o facto de nada mais assustar estes quadros do que tomarem uma decisão. Realizam-se reuniões intermináveis, pedem-se estudos, mas não se tomam decisões, acabando esta por ser delegada á posição mais elevada. Ora a decisão é um factor básico em qualquer mercado, implica autonomia. É ao vendedor que compete decidir acerca de uma acção a exercer sobre o cliente, a medir a receptividade dessa decisão junto ao cliente, ou ao supervisor que compete decidir sobre a paragem de uma linha de produção para corrigir uma anomalia. Mas isto torna-se inconcebível nestes mercados.

África necessita desesperadamente de empresas de pequena e média dimensão, pois as maiores oportunidades de negócio estão nos sectores tecnológicos, nos serviços e nos bens de consumo. É nestas áreas que florescem as empresas de pequena e média dimensão, localmente geridas e geradoras de trabalho. As gigantescas (e dantescas) empresas governamentais (empresas “públicas” geridas pelo Estado) encontram-se em situação de falência e apenas podem ser salvas através da sua divisão em unidades mais pequenas e com uma gestão mais autonomizada e com menos custos administrativos. Se estes “elefantes brancos” forem privatizados apenas tornam-se granes empresas privadas não produtivas, não havendo recuperação económica, apenas estagnação.

Mas existe, ainda, um problema de cultura de gestão maior do que qualquer outro que tenha sido descrito até agora: a falta de entendimento do que é a livre iniciativa e as relações no mercado. Aqui o mercado competitivo é definido com aquele em que os preços são altos para que cada concorrente obtenha lucro. Nada mais errado! No mercado a empresa tem de conquistar o lucro! Não existe apenas “lucro” mas “lucro e perdas”, não há apenas “recompensa”, mas sim “risco e recompensa”.

É que a liberdade não é apenas ausência de restrições. É, também, autodisciplina, responsabilidade e…autonomia de decisão.

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