Carlos
Burgo – Expresso das Ilhas, opinião
O
Instituto Nacional de Estatística (INE) passou a publicar estimativas das
Contas Nacionais Trimestrais (CNT), um instrumento importante para o seguimento
da dinâmica da economia. As últimas estimativas publicadas, referentes ao 3º
trimestre, permitem concluir que o crescimento da economia em 2015 terá sido
pouco superior a 1%.
Este
ritmo de crescimento é inferior ao da quase generalidade dos países da nossa
região. É, igualmente, inferior ao da quase generalidade das pequenas
economias, de rendimento médio, com as quais Cabo Verde é, normalmente,
comparado. Mas o que é ainda mais relevante é que é inferior à média de
crescimento dos países da área do Euro e ao crescimento nos países dessa área
com os quais temos relações económicas e financeiras mais estreitas.
Este
último facto retira muita razão à narrativa de que o fraco desempenho da nossa
economia se deve à crise económica internacional, em particular às dificuldades
enfrentadas pelos países da área do Euro. Na área do Euro, há economias com
assinalável dinâmica de crescimento. À economia caboverdiana faltam eficiência
e diversificação.
O
baixo crescimento em 2015 não é uma ocorrência isolada, sendo antes o
desempenho característico da economia caboverdiana nos últimos sete anos. Com
efeito, nesse período, a média de crescimento é de 1,3%. Em consequência, o
Rendimento Nacional Bruto per capita encontra-se praticamente
estagnado. Como se pode ver no gráfico junto, Cabo Verde não está a convergir
com a média dos países de rendimento médio alto, como seria desejável.
Como
resultado das profundas reformas empreendidas com vista à liberalização da
economia e à privatização de empresas públicas, o potencial de crescimento da
economia foi significativamente alargado. Esse efeito foi reforçado pelas
medidas de estabilização macroeconómica. Em consequência, a economia
caboverdiana conheceu até 2008 um período de acelerado crescimento.
Na
parte final desse período, contribuíram para esse ritmo acelerado de
crescimento, o afluxo do investimento directo estrangeiro, incluindo o
investimento de emigrantes, e a procura turística. O contexto internacional
contribuiu para a ilusão de que esse ritmo de crescimento seria sustentável. A
derrocada do modelo de negócios da imobiliária turística residencial em
consequência da crise internacional veio, porém, revelar a fragilidade desse
crescimento.
A
indústria turística continua a ser a actividade com maior dinâmica. A oferta
tem aumentado, embora timidamente, e novas marcas têm dado sinais de quererem
incluir Cabo Verde na sua área de interesse. Porém, as nossas políticas não são
arrojadas e faltam-nos conhecimento do negócio, para melhorar a nossa
capacidade de intervenção e de estímulo ao sector.
Para
mitigar o efeito da nova conjuntura internacional na actividade económica
doméstica, a resposta a nível das políticas públicas consistiu essencialmente
na adopção de um programa de estímulo à economia. Na medida em que esse
programa se baseou em investimentos públicos, foram antecipados efeitos tanto a
nível da sustentação da procura interna como a nível do aumento da eficiência
da economia. Nesse quadro, foram realizados importantes investimentos nos
sectores da energia, água e infra-estruturas de transportes. Por razões que se
prendem com a natureza dos investimentos públicos e as especificidades da nossa
economia, estes não se têm traduzido numa expansão significativa da actividade
económica.
Menos
célere e eficaz foi a resposta a nível das reformas estruturais com vista a
beneficiar o potencial de crescimento da economia. A reforma da legislação
laboral que consta na agenda desde final da década de 90 e que é essencial para
o aumento da eficiência da economia e a criação de empregos, apenas agora
conhece um tímido avanço. Persistem problemas de eficiência a nível de
importantes serviços prestados à economia por empresas públicas, não tendo sido
privatizadas actividades passíveis de o serem. Destacam-se, neste particular,
as operações portuárias e os transportes aéreos. Nos transportes marítimos, os
serviços são manifestamente deficitários.
Na
administração pública, registaram-se avanços visíveis no que tange à utilização
das modernas plataformas tecnológicas. Mais demoradas e menos significativas
foram as mudanças, igualmente necessárias, a nível das estruturas
organizacionais e do sistema de incentivos. Demorou a reforma dos instrumentos
de gestão dos recursos humanos. Os efeitos do novo Plano de Cargos, Carreiras e
Salários a nível da eficiência dos serviços ainda não se fizeram sentir.
Para
o rápido crescimento da economia na década passada contribuiu grandemente a
acelerada expansão do crédito. Porém, desde 2012 o crédito está praticamente
estagnado. O agravamento do risco na economia, a degradação da qualidade da
carteira de crédito, a fragilidade dos balanços das empresas e uma atitude mais
prudente dos bancos são factores condicionantes desta situação. É claramente um
equívoco pensar-se que esses obstáculos podem ser ultrapassados pela via da
política monetária. A retoma do financiamento ao sector privado depende,
grandemente, de uma intervenção estrutural do Estado no sistema financeiro.
Entretanto,
o avolumar da dívida pública provocou uma degradação do quadro macroeconómico.
Com o ritmo actual de crescimento da economia, poderá estar comprometida a
sustentabilidade da dívida pública. A prazo, a simples redução da dimensão do
programa de investimentos públicos poderá não ser suficiente para restabelecer
a solidez das finanças públicas. É importante que reformas a nível da
Administração Pública possibilitem a contenção do crescimento das despesas
correntes. Importantes factores de risco são ainda as responsabilidades do
Estado com as empresas públicas e com os sistemas de pensões. O aumento da
eficiência do Estado e a diminuição dos riscos das finanças públicas são
fundamentais para que se possa garantir a previsibilidade da política
orçamental e um nível de fiscalidade que possibilite uma adequada
competitividade da economia.
Deveria
haver na gestão orçamental uma preocupação maior para a redução da
desigualdade, extremamente acentuada na nossa sociedade. Este propósito deve
ser prosseguido pela via da tributação, dos serviços prestados aos cidadãos e
das prestações a cargo do Estado. Porém, uma redução significativa da
desigualdade social requer reformas estruturais que façam com que o mercado
produza uma distribuição mais equitativa da renda. O sistema educativo e a
legislação laboral devem concorrer para a criação de empregos. As políticas
públicas devem encorajar a formalização de empresas. Neste aspecto, sem a
vertente atinente à legislação laboral, ficou incompleto o Regime Especial das
Micro- e Pequenas Empresas.
Esta
realidade deve inquietar os cabo-verdianos. Impõe-se que sejam consideradas as
verdadeiras razões do fraco desempenho da economia caboverdiana no novo
contexto internacional e, sobretudo, sejam encontradas soluções que, traduzidas
em políticas, possam impulsionar o crescimento sustentável da economia enquanto
condição basilar da melhoria contínua do nível de bem-estar da sociedade. É de
todo desejável que essas soluções e políticas sejam apresentadas ao sufrágio
dos caboverdianos pelas forças políticas concorrentes às próximas eleições com vista
a obter mandato para a sua implementação.
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