Miguel
Guedes – Jornal de Notícias, opinião
"Eu
não temo o regresso dos fascistas como fascistas, o que temo é o regresso dos
fascistas vestidos como democratas" - Theodor Adorno
O
filósofo e sociólogo alemão viveu duas guerras mundiais e provavelmente falou
do que sabia. O extremismo voltou ontem a matar indiscriminadamente em
Bruxelas, depois de o ter feito em Paris há meses, em Istambul há poucos dias
(no quarto atentado na Turquia desde o início do ano) ou por todo o Mundo há
muito. Vivemos no tempo em que Donald Trump é pré-candidato a uma terra que não
se promete e em que a União Europeia paga ao presidente turco Erdogan para
escorraçar pessoas de uma Europa que promete nada fazer para evitar o
agravamento de uma crise humanitária sem precedentes. Apanhamos a boleia da
confusão e da falta de memória, confundimos refugiados com migrantes, rotulamos
terroristas pela nacionalidade do passaporte, consideramos como pitorescos os
demagogos. Somos daqui e do exacto momento em que Merkel tem os piores
resultados nas eleições regionais alemãs, caindo à medida que ascende o partido
de extrema-direita AfD. Somos desta Europa onde vemos como, apesar da
exemplaridade da maioria de um povo, a Grécia assiste ao crescimento da Aurora
Dourada. Contemplamos, serenos, como a Bélgica se preparou, nos últimos meses,
para que nada do que ontem aconteceu sucedesse, sem que se afirmasse um único
compromisso europeu na luta contra as fontes de financiamento dos terroristas.
Parar de vender armas e comprar petróleo ao Daesh era capaz de ajudar.
A
ameaça sobre a central nuclear belga de Tihange, ontem evacuada após os
atentados levanta a questão sobre a segurança de termos o nuclear como arma ou
como alvo. Enquanto Obama e os Castro fazem história em Cuba, chega o
pensamento cruzado que nos lembra a crise dos mísseis cubanos de 62 na Guerra
Fria, após a desastrada tentativa de invasão americana na Baía dos Porcos.
Local, aliás, potencialmente elegível por Trump que, quando questionado sobre o
reatamento das relações entre EUA e Cuba, respondeu que "chegaria o tempo
certo para lá fazer um hotel". Outra vez. Radioactividade pura, para quem
não se inibiu de afirmar que "a tríade nuclear, o poder, a devastação é
muito importante para mim", logo amparado pela partidária Katrina Pearson
que questionava qual "a razão de termos armas nucleares se temos receio de
as usar"? O extremista Walid Phares, assessor de Trump e seu conselheiro
para política externa, não diria melhor. Como diferente não pensará Frank
Gaffney, assessor do candidato republicano rival Ted Cruz, também ele um islamofóbico,
tão propagandista e conspirador que até o próprio "establishment"
republicano o considera radioactivo
.
Enquanto
há tempo, continua a contagem indecisa entre democratas e fascistas. Quando se
volta a falar na decisão nuclear, mais importante seria entender que nuclear é
a decisão.
*Músico
e advogado
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