Ricardo
Marques, jornalista (só jornalista) do Expresso, traz-nos hoje a bateria de
loiça cafeeira com bom café e a acompanhar, segundo diz, uma obra de arte. É isso que diz
ser o comunicado da PGR relativamente ao Caso Sócrates, a que chamam Operação
Marquês – talvez um Pombal qualquer lá da panóplia do setor emaranhado da
justiça tenha assim batizado o dito. Pois devemos acrescentar que também
recebemos e lemos o tal comunicado. Todo, todinho. E concordamos que aquele
“bijou” é mesmo uma peça de arte que demonstra a veia artística da PGR, dos Carlos Alexandres, daqueles todos que têm abandalhado a justiça e desacreditado
o setor que por tabela nos demonstra que a democracia não vale nada quando não
existe em pleno. Que é o caso em Portugal. Obra de uns quantos salafrários e
também de uns quantos (demasiados) que andam a serrar presunto e a arrastar na
lama o que é imprescindível existir com boa saúde e funcionalidade em Portugal.
Sim, essa tal justiça a sério, aprimorada, com credibilidade, discreta, atuante,
sem mácula. Enfim, o contrário daquilo que existe em Portugal.
Obra
de arte, podemos confirmar que é. Com esta veia podiam aproveitar para se lançarem
às tintas, em vez de se estarem nas tintas para a democracia de facto, com
justiça em pódio e democracia. Lançando-se às tintas podiam borrar as caras de vergonha e
andarem por aí, em público, reconhecendo os maus desempenhos que em tantos anos
e em tantos casos vêm demonstrando serem exímios.
Basta.
Não é só no Caso Sócrates que a coisa é vergonhosa e quase inexplicável. Outros
há. Do exterior do edifício que devia ser a justiça – que afinal é uma tosca
barraca – vimos que para uns é assim e para outros é assado. É o que acontece,
se é de propósito ou não… Bem, essa seria outra conversa, noutro lugar. Não
aqui.
Agora
por isso, vamos terminar. Adeus, artistas da justiça, da PGR, dos meandros onde
até inventam super-juízes e máquinas de lamber os tintins que ninguém merece.
Depois, passados tempos dos endeusamentos acabamos por perceber que são gente
normal ou toscas fraudes. A vida é assim, quando certas e incertas elites fazem
de só seu o país e tratam a República e a democracia como algo que não pertence ao
povo (que é o povo) mas sim somente de uns quantos.
Ficamos
por aqui, pela justiça artística. Fraudulenta. Leia o Curto, é dos melhores.
CT
| PG
Bom
dia, este é o seu Expresso Curto
Ricardo
Marques | Expresso
Três
é a conta que …
Poucas
coisas na vida têm o encanto de um comunicado da Procuradoria-Geral da
República sobre a Operação Marquês. Mais ainda quando chega ao final da
tarde de uma quinta-feira morna, em que meio país está a recuperar da
ponte que passou e a outra metade está a ganhar forças para o feriado
que aí vem.
Os
menos atentos, ou os que pensam já ter lido os melhores comunicados e
escolhem não perder tempo com mais um, correm o risco de passar a correr
pelas quatro páginas de parágrafos impecavelmente arrumados,
geometricamente desenhados, com alíneas e mais alíneas repletas de
informação sobre a investigação que envolve José Sócrates. Má sorte,
pois perderão a oportunidade de mergulhar fundo na forma à procura do
conteúdo.
Estamos
perante um clássico reinventado. Uma peça narrativa que, mantendo a
solidez estrutural de sempre, introduz um elemento perturbador que transmite ao
conjunto uma dinâmica imparável. A fórmula de sucesso que fez dos
comunicados da PGR verdadeiros best-sellers está lá: um breve resumo da
matéria dada, meia dúzia de números para encher o olho, outras tantas frases e
palavras que ninguém usa e, a acabar, a indicação do prazo para o fim
da investigação.
Os
mais dedicados à obra da PGR encontrarão paralelos entre os tomos
anteriores e a mais recente edição. É difícil esquecer passagens tão marcantes
como:
-
“O diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal proferiu
despacho, em dezembro de 2015, no qual estabeleceu um prazo de três meses para
que o magistrado titular da designada “Operação Marquês” facultasse elementos
que permitissem fixar “o período necessário para concluir o inquérito”.
“, publicado a 30 de março de 2016
-
“Assim, concede-se o prazo de cento e oitenta (180) dias para a realização de
todas as diligências de investigação consideradas imprescindíveis para o
esclarecimento dos factos e definição das responsabilidades criminais, e para o
necessário encerramento do inquérito”, de 14 de setembro de 2016
“Os
magistrados titulares da designada Operação Marquês solicitaram à Procuradora-
Geral da República uma prorrogação do prazo para a conclusão do inquérito e
emissão de despacho final. Estimavam também o final de junho como prazo para
concluir os trabalhos.”, a 18 de março de 2017
Sobressai
em toda a obra o suspense sempre presente, o recuo imprevisto quando
a máquina está pronta para avançar, a diligência de investigação com
que ninguém contava. É tão viciante como uma boa série de televisão.
Pode ler aqui as novidades sobre o caso (spoiler
alert: há mais um arguido e é primo de José Sócrates) e a reação da defesa do ex-primeiro-ministro.
Eis
o ponto de situação descrito no comunicado:
-
Devem realizar-se mais seis inquirições nos próximos dias e
a recolha de prova deve estar concluída na primeira semana de maio.
- As
transcrições das escutas telefónicas, interrogatórios e
inquirições estão mesmo a acabar. No máximo, dentro de um mês e meio
estarão prontas. Ou seja, meados de junho.
-
Lembra-se das cartas rogatórias? Bom, há três situações. A primeira é
um pedido de cooperação dirigido às autoridades angolanas: já
cumprido e que deve ser devolvido “em breve” (sem data definida). O
segundo tem a ver com as autoridades suíças e as cartas rogatórias que
lhes foram dirigidas: “duas aguardam o decurso dos prazos de notificação e
deverão ser devolvidas de seguida” (idem). O terceiro pedido,
para obtenção de dados bancários na Suíça, foi objeto de oposição de
um dos arguidos e decorre o prazo de recurso. “Assim, neste momento, não é
possível prever a data sua devolução (sic)”
-
Logo a seguir, lê-se: “Uma vez recebidas, as cartas rogatórias serão juntas aos
autos, seguindo-se, depois, ainda um trabalho de análise integrada dos
factos a que respeitam”. Não é referida qualquer data.
Apesar de
todas as incógnitas, segundo o comunicado, “os magistrados que integram a
equipa de investigação e o diretor do DCIAP consideram que o encerramento
do inquérito deverá acontecer, no máximo, em finais de julho, sem prejuízo de
poder ser antecipado caso as cartas rogatórias sejam devolvidas em
prazo que permita essa mesma antecipação”.
Ou
seja, apesar de haver uma série de variáveis que não controlam, os responsáveis
pela investigação acreditam que vão acabar daqui a três meses. Até antes,
se tudo correr bem. Há mesmo um momento – quando se lê que foi decidido
prorrogar o prazo por três meses - em que tudo parece fazer sentido.
Puro
engano. Há três e três, há meses e meses. E os três da prorrogação não são
os três da previsão. Aliás, não são três meses quaisquer. Isso seria demasiado
óbvio. São, explica a Procuradoria, “três meses contados da data de
devolução e junção ao inquérito da última carta rogatória a ser devolvida”.
Temos,
pois, que a investigação deve acabar até três meses depois de acabar,
sendo que é previsível que acabe daqui a três meses. Pode ser em julho, pode
ser em outubro, pode ser antes ou pode ser depois. Uma espécie de infinito mais
um. A prova de que três pode não ser três e que três não é apenas a conta
que Deus fez. É acima de tudo o prazo do costume no Marquês. Irresistível.
OUTRAS
NOTÍCIAS
A
vida não é só literatura e há uma série de coisas que deve saber para
navegar com calma pelo mar informativo desta sexta-feira, véspera de
fim-de-semana prolongado.
Um
dos temas do dia será o primeiro interrogatório ao indivíduo suspeito de
conduzir a viatura que atropelou um cidadão italiano junto ao Estádio da Luz na
véspera do Sporting-Benfica da semana passada. O homem entregou-se
ontem à Polícia Judiciária e é suspeito de um crime de homicídio. O
seu advogado alega que se tratou de um acidente. O Pedro Candeias e o Hugo
Franco fazem o ponto de situação.
António
Domingues, o presidente da Caixa Geral de Depósitos que antes de
o ser já quase não era, está de volta ao Parlamento para ser ouvido na
comissão parlamentar de inquérito que se ocupa dos SMS que trocou com Mário
Centeno a propósito das declarações de rendimentos. É a hora
do tira-dúvidas, escreve a Raquel Albuquerque.
A
discussão sobre Almaraz deve atingir hoje o vermelho. Ontem, a Agência Portuguesa do Ambiente
considerou adequada e segura a construção de um armazém para armazenar
resíduos na central nuclear espanhola, a uma centena de quilómetros da
fronteira portuguesa. As associações ambientalistas já reagiram: “surreal”
e “inaceitável”.
Sobre
um dos assuntos dos últimos dias – os ataques de cães perigosos – o
Expresso revelou ontem que, em média, há três pessoas atacadas
por dia em Portugal. Foram 355 vitimas em pouco mais de um ano . E, ao inicio da noite, o Ministério da
Administração Interna admitiu que só falta a Direção Geral de Alimentação
e Veterinária aprovar o programa de formação e homologação das normas técnicas
para que a PSP e a GNR comecem a certificar treinadores de cães, como está
previsto na lei há dois anos. E isso é para quando? Ao melhor estilo da
operação Marquês, prevê-se que “tal suceda até ao final do segundo trimestre
deste ano.”
Prepare-se
para ouvir falar da reestruturação da dívida – a tal que é para ir
pagando. É apresentado hoje à tarde o relatório do Grupo de Trabalho sobre
a Sustentabilidade da Dívida Externa, elaborado por economistas e deputados do
PS e Bloco de Esquerda. O documento defende uma negociação com as
instituições europeias para rever as condições dos empréstimos dos fundos de
resgate, explicam o Adriano Nobre e o João Silvestre.
Em Peniche,
que ontem recebeu o Conselho de Ministros, já não haverá um novo hotel,
mas um novo museu está a caminho.
Acredite-se
ou não, goste-se mais ou menos, parece indiscutível que o Papa Francisco é
mesmo uma das grandes personalidades da atualidade. Chega hoje ao Egito
para uma visita considerada de alto risco e participa numa conferência sobre a
paz na Universidade Al-Azhar.
Falta
pouco para Francisco chegar a Portugal, mas a sua visita a Fátima para o
centenário das aparições já está a produzir alguns efeitos, digamos,
milagrosos. O Governo anunciou ontem que haverá tolerância de
ponto (seria uma “grande insensibilidade” não o fazer, disse António
Costa). Um deputado do PS lamentou a decisão, mas o PCP e o Bloco de
Esquerda não se opõem. Como vão longe os dias de 2010, quando Bento
XVI aterrou em Portugal e Fernando Rosas, deputado do BE, dirigiu as seguintes perguntas ao Governo:
"1-
Pode o Governo avaliar o gasto público global com estas festividades e o que
pensa da adequação de tal despesa nos tempos de austeridade e grave crise
social o país sofre?
2
– Qual a razão porque persiste o Governo, em clara violação dos princípios da
laicidade do Estado e da sua separação das igrejas, em decidir a tolerância de
ponto alargada mesmo aqueles que não professam a religião católica ou
simplesmente não desejam festejar a visita do Papa Bento XVI?"
A
paz depois da guerra e agora a guerra depois da paz. Com a tensão a
crescer na Península da Coreia – a Coreia do Norte divulgou um vídeo que simula um ataque ao Capitólio e a um
porta-aviões norte-americano - os sul-coreanos parecem viver entre o medo e a indiferença. E os americanos deitam um
pouco de água fria na panela que há semanas têm ao lume.
Ficamos
nos Estados Unidos da América para mais dois assuntos de que
provavelmente se vai falar hoje. Ambos envolvem dinheiro, mas em nenhum se
sabe bem quanto. A United Airlines chegou a acordo com o passageiro que, há dias, foi
expulso de um avião por excesso de lotação; e o novo plano fiscal da
administração Trump já está a gerar polémica, principalmente porque um dos
maiores beneficiários pode ser… Trump. Mas também porque pode abrir uma divisão
entre os republicanos preocupados com o défice. Para baralhar mais um pouco, há ainda o problema
do muro , do NAFTA …
A
propósito: Parabéns, Donald. Cem dias na Casa Branca. O The New York Times
fez este vídeo para ti. E este é dos Simpsons, Nunca mudes.
Um
salto à América do Sul onde pode estar em curso um Venexit ou
Venoea... Nicolas Maduro anunciou que a Venezuela vai abandonar a Organização dos Estados Americanos,
depois de a Organização dos Estados Americanos ter reunido para analisar a
situação no país a que Maduro preside. Numa história lateral, Maduro foi fotografado com 'la estelada', a bandeira dos
independentistas da Catalunha.
Se
abriu o link anterior, fique no El Mundo e não perca este artigo sobre aliens, a palavra que tanto pode
significar extraterrestre como imigrante. A linha criada nos EUA para
denunciar imigrantes ilegais está a ser inundada com chamadas a dar conta de
extraterrestres.
Este
fim de semana há cimeira dos 27, em Bruxelas, para discutir o
Brexit.
MANCHETES
Correio
da Manhã: “Jovem vítima do jogo da morte”
Jornal
de Notícias: “INEM corta ambulâncias à noite em oito concelhos”
Diário
de Notícias: “PS e BE querem dívida a 60 anos e 1% de juros”
Público: “Dívida:
Grupo de trabalho pede mais 45 anos para pagar à EU”
I:
“Por que razão depois dos 70 as pessoas são excluídas do Estado”
O
QUE ANDO A LER
Acabo
de ler no implacável contador de caracteres que este Expresso Curto já
leva mais de 13 mil caracteres, uns bons milhares acima daquilo que a prudência
aconselha. Se ainda não desistiu, obrigado.
Em
vez de uma sugestão de leitura, deixo-lhe uma música inédita de Chuck
Berry, que fui buscar à The New Yorker. Berry morreu há cerca de um
mês e esta canção faz parte de um álbum que vai ser lançado em junho,
com músicas gravadas entre 1991 e 2014.
Chama-se
“Wonderful Woman”. Siga o link, aumente o volume e leia na íntegra o wonderful comunicado da PGR.
Amanhã
(além de nuvens, chuva e até neve na Serra, por um lado, e
jogos http://ligaportugal.pt/pt/homepage/ de Benfica
e Porto à noite, por outro) há Expresso nas bancas e, grátis, o
segundo volume de “Portugal Amordaçado”, de Mário Soares. Antes, pelas seis da
tarde, tem o Expresso Diário e durante todo o dia a edição online do
seu jornal, o mais vendido em Portugal.
Tenha
um bom fim de semana e um dia do trabalhador cheio de descanso.
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