Para
Rui Verde, os resultados positivos apresentados, recentemente, pela Sonangol
são apenas um golpe de marketing. Os resultados líquidos da empresa estatal
angolana diminuíram 360% de 2015 para 2016, diz.
A
petrolífera estatal angolana Sonangol
apresentou, esta semana, os resultados referentes a 2016. Segundo a
presidente do Conselho de Administração da empresa, Isabel dos Santos, a
petrolífera cresceu 36% no ano passado, apesar da crise. Mas, em entrevista à
DW África, o jurista português Rui Verde, afirma que as conclusões apresentadas
são apenas um golpe de marketing.
DW
África: Porque é que diz que estas contas da Sonangol são contas mágicas?
Rui
Verde (RV): São mágicas na forma em que foram apresentadas: como um grande
sucesso quando, na realidade, os únicos números positivos estão nos resultados
operacionais. Os resultados líquidos que, ao fim do dia, é o que o Estado leva
para casa, são extremamente negativos em relação ao ano anterior. Há uma
espécie de marketing a querer transmitir que as contas são muito boas quando,
na realidade, não são.
DW
África: Num artigo no portal Maka Angola, fala em falta de transparência e em
algumas reservas dos auditores quanto às relações entre o Estado e a Sonangol.
O que é que está aqui em causa?
RV: Os
auditores são muito cautelosos e as contas têm algumas reservas importantes.
São aspectos que os auditores não confirmam. Um dos temas mais importantes é a
transferência de dinheiro entre o Estado e a Sonangol. Há muitos e muitos
milhões de dólares que andam do Estado para a Sonangol e vice-versa e ninguém
sabe explicar porque é que andam, não há documentos justificativos, não há
certezas dos montantes, não há nada.
DW
África: Por um lado, a Sonangol apresenta contas positivas, mas, ao mesmo
tempo, diz, por exemplo, que a construção da refinaria do Lobito, em
Benguela, vai continuar parada em 2017, devido à quebra do preço do petróleo no
mercado internacional. Em que é que ficamos?
RV: Pois,
esse é o grande problema. De facto, as contas são negativas e a Sonangol não
tem dinheiro para fazer investimentos. Basicamente é isto: há falta de
dinheiro. Apesar das habilidades contabilísticas e do marketing, no final, a
questão é esta. Não há dinheiro e a Sonangol não está a gerar os proventos que
deveria gerar. Os resultados líquidos – o dinheiro que a empresa tem no fim
para investir, para fazer o que quiser – diminuíram 360% de 2015 para 2016.
DW
África: Pode exemplificar estas "habilidades contabilísticas” que
menciona?
RV: O
que tivemos foi o aumento do perímetro de consolidação das contas. Basicamente,
puseram mais ativos para se considerar na contabilidade da Sonangol. Mas o
essencial nem é bem uma habilidade contabilística. O essencial é que os
resultados de uma empresa têm vários itens: os resultados operacionais, os
resultados financeiros e os resultados líquidos que, no fim, são aqueles que
interessam. Quando se fez a divulgação das contas da Sonangol foram apresentados
apenas os resultados operacionais - que estão melhores, devido à ligeira subida
do preço do petróleo no segundo semestre de 2016 – e esqueceram-se de falar dos
resultados líquidos, que estão muito piores. As coisas até estão lá nas contas,
é preciso é saber lê-las e ver que a situação está a deteriorar-se. As
eventuais melhorias resultam diretamente das oscilações do preço do petróleo.
DW
África: Diz também que as contas da Sonangol são uma encenação para efeitos de
propaganda eleitoral.
RV: Não
são bem as contas, é a forma como as contas são apresentadas.
DW
África: E depois das eleições? O que é que se espera?
RV: Temos
um problema. Temos um problema muito grande. Obviamente, a Sonangol é quem dá
ou não dinheiro ao Estado. Depois das eleições, o Estado vai continuar a não
ter dinheiro. Podem agora, como se sabe, aumentar os ordenados, estão a fazer
promessas, mas, na realidade, depois de agosto, não vai haver dinheiro. Em
setembro, os cofres de Angola vão estar vazios. Portanto, aí, acaba-se o
marketing.
Maria
João Pinto | Deutsche Welle
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