domingo, 21 de janeiro de 2018

UM “PARADISE LOST” PARA ANGOLA?


Martinho Júnior | Luanda

1- No momento em que o executivo que em resultado das eleições de finais de 2017 se vai instalando no aparelho de estado, no momento em que é levado à Assembleia Nacional a discussão e a votação sobre o Orçamento Geral do Estado para 2018, no momento em que o Presidente João Lourenço multiplica as declarações de luta contra a corrupção e procura impedir a falência das depauperadas finanças nacionais, há notícias de fontes fidedignas que reportam que há “canais” que continuam a fazer sair do país para o exterior de avultadas quantias na escala de largos milhões de dólares, sem sinais de haver qualquer espécie de contenção, fiscalização, ou medidas preventivas para fazer face a essa “hemorragia”!

As notícias necessitam como é lógico de serem verificadas e confirmadas por outras fontes, mas sobretudo e necessariamente pelos organismos responsáveis que devem promover o enfrentamento decisivo em relação a esse tipo de situações que continuam a arrastar-se, particularmente desde os picos oportunistas e mercenários dos “deslumbramentos” após 2002.

A contaminação dos organismos financeiros por “correntes” que correspondem aos estímulos especulativos e gananciosos típicos dos impactos do capitalismo neoliberal e na esteira do controverso, falacioso e informal “projecto dos 100 novos-ricos”, indicia continuar resguardando-se em enredos montados de forma nada transparente e de lesa pátria que urge detectar fiavelmente e a saber neutralizar.

É evidente que de pouco vai valer a urgência em colocar dentro do país os milhares de milhões de dólares que dele saíram em condições ainda por avaliar, se continuarem a existir “canais” forjados nesse tipo de “experiências” e com “engodos” que fermentaram há mais duma década, ou seja, se no estado que se pretende de rigor enquanto fiel depositário dos interesses de todo o povo angolano, prevalecerem impunemente os tecidos cancerosos de máfias que o tentam subverter nos seus procedimentos justos e subvertê-lo na sua mais intrínseca legitimidade.

2- O “paraíso perdido” a que me refiro, não é logicamente um caso conhecido ou reconhecido como tal pelos interesses da“civilização judaico-cristã ocidental”, ou pelos seus meios de comunicação elitistas, uma parte deles filtrados até pelo “Bilderberg”.

Para os dessa “civilização” os assuntos africanos “in”, sintomaticamente não fazem parte das agendas voltadas para o combate aos“paraísos fiscais e financeiros” que escapam às atenções directas do âmbito dos Estados Unidos e da União Europeia, até por que em África, em conformidade com o enorme espaço de cobertura duma moeda com as características neocoloniais do Franco CFA, é um assunto tabu abordarem-se os “paraísos” que surgiram dentro do espaço continental.

Essa situação que se constata nos “media de referência ocidentais” no fundo dão consistência a tiradas depreciativas, ou mesmo racistas, como a do presidente Trump sobre África e o Haiti, aliás dando sequência a outra similar antes pronunciada pelo presidente Bush em relação aos “obscuros rincões do mundo”!

Também é tabu abordar que os procedimentos que estabelecem os nexos de algumas elites africanas recorrendo aos “paraísos fiscais e financeiros”, resultam de “ensinamentos” decorrentes dos impactos do capitalismo neoliberal à escala global nos termos de algumas das características da sua própria “terapêutica assimiladora”, que no caso angolano tão “eficientemente” foram fomentados pela social-democracia à portuguesa e copiados para além dela, seja por via dos bancos de conveniência, seja através de alguns dos canais da “inteligência económica” com peso nos relacionamentos bilaterais e para além deles.

Essa foi uma vocação para dentro de Angola, que alguns da “nova elite” angolana aproveitaram para instalar também noutras direcções suas mercenárias e antipatrióticas conveniências!


3- O “paraíso perdido” a que me refiro é a Guiné Equatorial, que em 2014 entrou na CPLP sob incentivo angolano que eu próprio também defendi e defendo.

De facto o argumento em abono da entrada da Guiné Equatorial na CPLP afigura-se-me sustentável, tendo em conta que a CPLP não pode nem deve ser encarada apenas como uma modesta organização internacional de países que se expressam na língua portuguesa comum, até por que as ilhas de Fernando Pó, (hoje baptizada de Bioko) e Ano Bom (que envolvem São Tomé e Príncipe com seus mares territoriais), assim como vastos territórios no Golfo da Guiné, já um dia foram colonizados por Portugal e serviram de entrepostos pelas piores razões.

Urge integrar agora pelas melhores razões!

O que abona o argumento para a entrada da Guiné Equatorial na CPLP prende-se além do mais às medidas potenciais de projecção à escala global duma CPLP que se deve também arrojar nos processos de globalização, não se reduzindo aos falantes actuais do português, mas abrindo-se a traços culturais que acompanharam (e acompanham) a expressão portuguesa ao longo de cinco séculos, que até servem para alguns efeitos e alguns retrógrados não querem para este.

Por outro lado, urge gerar uma organização muito mais forte, ampla e ao mesmo tempo intensa nos seus laços, vinculando as“culturas encadeadas” latino-ibéricas, africanas e americanas, correspondendo ainda aos fenómenos disponíveis da globalização, um pouco à imagem e semelhança das comunidades francofone e “Commonwealth”!...

Sob os pontos de vista de integração cultural, nos processos emergentes e progressistas potencialmente disponíveis para os abrangidos pelas falas decorrentes do português, do castelhano, do galego, do catalão, do andaluz… não faz sentido a tacanhez mental com aproveitamento sócio-político conservador ou mesmo retrógrado, por parte dos elementos decisórios que a seu tempo se têm vindo a manifestar dentro e fora duma CPLP própria “dos pequeninos” em tempo de internacional cavaquismo!

De facto para culturas singularmente tão próximas dentro e fora do espaço ibérico, se levarmos em conta a riqueza “em espiral” em que essas falas se inserem, assim como sua enorme potencialidade entre as expressões globais, é necessário através delas responder às amplas necessidades de integração que as catapultam para as grandes plataformas típicas do século XXI!

4- O que está subjacente contudo nos relacionamentos Angola – Guiné Equatorial tendo em conta as notícias colhidas a que me reporto, subjacência essa aproveitada por algumas das “correntes” instaladas pelos impactos neoliberais com reflexos perniciosos no sistema financeiro angolano como na formação de suas “novas elites”, é o facto desses “canais” se assemelharem a autênticas“válvulas de escape” de impunidade, desafiando as medidas que um estado de rigor se propõe executar num momento em que se torna necessário fazer face à calamidade da crise artificiosamente formatada pela aristocracia financeira mundial reitora da hegemonia unipolar que por tabela atinge Angola e também a Guiné Equatorial, potentados africanos do petróleo.

A fazer fé nas notícias, que uma vez mais julgo ser necessário e urgente verificar e confirmar, quem, como, quando, para onde e por quê continuam algumas “correntes” a esvair Angola financeiramente, utilizando o “paraíso perdido” da Guiné Equatorial?

Mercenários e piratas financeiros de lesa-pátria até onde e até quando?

Martinho Júnior - Luanda, 20 de Janeiro de 2017

Imagens:
Planisfério com os países componentes da CPLP;
Mapa antigo reflectindo a influência portuguesa no Golfo da Guiné;
Pormenor de Malabo, capital da Guiné Equatorial, vista do mar;
Edifício do Banco Nacional da Guiné Equatorial.

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